Quatro pessoas foram indiciadas pelo assassinato de Zilda Correa Bittencourt, 58 anos, que teria sido espancada e amarrada a uma cruz dentro de um cemitério, em um suposto ritual religioso, no último dia 10, em Formigueiro, na região central do Estado. A polícia entendeu que o caso se trata de homicídio qualificado — por motivo torpe, meio cruel e recurso que impediu ou dificultou a defesa da vítima. O inquérito foi remetido à Justiça na segunda-feira (26).
Os quatro envolvidos estão presos. Um deles é Francisco Guedes, 65 anos, apontado como líder de um centro religioso na localidade de Passo do Maia. Os demais são os irmãos Nayana Rodrigues Brum, 33, e Larry Chaves Brum, 23, e o pai deles, Jubal dos Santos Brum, 67 (confira abaixo o posicionamento das defesas).
O laudo de necropsia do Instituto-Geral de Perícias do Estado (IGP-RS) indica que Zilda morreu em razão de ferimentos por instrumento contundente, durante o que seria um ritual, segundo a polícia. De acordo com a investigação, Zilda acreditava estar sendo atormentada por uma entidade maligna e teria procurado o centro religioso para se submeter a um ritual para se libertar de um espírito.
Moradora de Restinga Seca, município a cerca de 30 quilômetros de Formigueiro, a vítima viajou até a cidade para fazer a sessão. O marido e o filho a acompanharam. Após as agressões, Zilda foi levada ao hospital já desacordada, onde foi constatada a morte no início da madrugada de um sábado, 10 de fevereiro. A equipe médica identificou marcas de violência física, segundo a polícia.
Apesar de o marido e o filho da vítima terem presenciado parte da sessão, a polícia entende que eles acreditavam, assim como Zilda, que o ritual possibilitaria a cura dela e não tinham intenção de que fosse morta.
Os dois relataram aos investigadores que o grupo alegou, naquele dia, que as agressões faziam parte do ritual para retirar a entidade maligna do corpo da mulher, e que as marcas desapareceriam assim que fosse finalizado o trabalho. Eles teriam acreditado, segundo o relato, que as agressões seriam contra o espírito e não contra a familiar.
Mulher já tinha buscado auxílio médico
Conforme a Polícia Civil, a vítima já havia buscado outras formas de "cura", passando por tratamentos médicos e benzedura. Ela teria histórico de depressão.
Zilda dizia estar com um "espírito ruim" no corpo, conforme depoimento de familiares à polícia. Segundo o marido e o filho, ela desmaiava na presença do pastor quando ia a igreja, o que reforçaria a crença da família de que o problema era espiritual.
Irmãos teriam cometido as agressões
Ao longo da investigação, dois dos envolvidos, os irmãos Nayana e Larry, teriam admitido que bateram na mulher, no intuito de expulsar o espírito, segundo a polícia. Afirmaram também que não lembram direito o que fizeram naquele dia, porque estariam com entidades incorporadas. A polícia não descarta que os outros dois indiciados também tenham contribuído para a violência física, apesar de eles negarem.
Em conversa com GZH no último dia 13, a defesa de Francisco Guedes afirmou que o homem admite ter realizado um ritual com a vítima, mas alega inocência. O advogado Ariel Cardoso declarou que o cliente é aposentado e realizava atendimentos sem cobrar pelo serviço.
Antes de residir em Formigueiro, Guedes teria trabalhado como palhaço em circos. No município, teria sido acolhido pela família de Jubal e passou a fazer os atendimentos. O advogado nega que a vítima tenha sido amarrada numa cruz durante o ato.
A Polícia Civil confirma que o grupo não teria recebido nenhum pagamento antecipado pelo trabalho no caso de Zilda.
Vítima foi levado a cemitério mais de uma vez
O atendimento a Zilda teria começado na sexta-feira pela manhã (9), quando o líder do centro religioso e Jubal teriam realizado um primeiro trabalho espiritual nela. Eles a orientaram a retornar no fim da tarde, e ela acatou o pedido.
Durante o suposto ritual, Zilda teria ido duas vezes ao Cemitério da Colônia Antão Faria naquela noite de sexta. Na primeira vez, segundo a polícia, ela teria sido agredida inicialmente e depois levada ao cemitério para dar seguimento ao ritual. Na sequência, todos teriam retornado ao centro religioso, onde a mulher teria sido espancada novamente.
Mais tarde, regressaram ao cemitério, onde, segundo a polícia, a mulher foi amarrada numa cruz. Ali, ela teria perdido a consciência, e foi levada então para o hospital, onde foi constatado que já estava sem vida.
Contrapontos
Francisco Guedes
O advogado Ariel Cardoso, que atende Francisco Guedes, reafirmou que o cliente não teve ligação com a morte:
— Nós continuamos confiando na defesa do Francisco. Um senhor de 65 anos, com CID (código para problemas de saúde) de desnutrição, fraco, com 30 quilos abaixo de seu peso ideal, não tem capacidade de machucar alguém. Fisicamente, é impossível que ele consiga causar tantas lesões para matar uma pessoa.
Cardoso disse ainda que aguarda as próximas etapas do procedimento, na Justiça, para que a defesa do indiciado possa se manifestar:
— Todos os elementos produzidos pela Polícia Civil precisam ser confirmados dentro do processo criminal. Tudo que foi produzido pela instituição é elemento informativo, prova unilateral e não tem ampla defesa nem contraditório. A gente aguarda que essas provas passem pelo crivo do contraditório, para aí então poder estabelecer a defesa do Francisco.
Nayana Rodrigues Brum, Larry Chaves Brum e Jubal dos Santos Brum
Os três são atendidos pelas advogadas Márcia Pereira da Silva, Liégy Pereira da Silva Meneghetti e Ediani da Silva Ritter. Nesta terça (27), a advogada Márcia afirmou que analisa o inquérito policial e os laudos, e que "neste momento" prefere não se manifestar.