Na manhã da quarta-feira, dia 7 de fevereiro, quatro criminosos armados deixaram a agência do Banrisul na área central de Amaral Ferrador, no sul do Estado. O bando escapou levando R$ 279,9 mil e dois reféns. Pouco antes, tinham obrigado moradores a formar um cordão humano, numa modalidade de assalto conhecida como “novo cangaço”. Havia quase dois anos que esse tipo de crime não era registrado no Estado. Às 12h54min da sexta-feira, 50 horas depois do início do cerco policial, o último suspeito de integrar o grupo criminoso foi preso a 135 quilômetros do local do roubo, em Santana da Boa Vista.
Logo após o ataque, a Brigada Militar e Polícia Civil começaram a reunir as primeiras informações sobre crime. Sabiam que o bando era formado por quatro assaltantes, dois deles estariam com armamentos longos, podendo ser um fuzil, e os outros com armas curtas. Dois funcionários da agência bancária tinham sido levados como reféns pelos bandidos, que escapavam numa EcoSport em direção a Encruzilhada do Sul. Duas armas também foram roubadas dos seguranças da agência, além de coletes.
A primeira estratégia para tentar evitar a fuga foi montar barreiras nas possíveis rotas dos bandidos e impedir que eles deixassem a região. Às 11h49min, os reféns foram abandonados pelos assaltantes. Logo depois, houve o primeiro confronto com os criminosos, que usavam uma arma de grosso calibre. Os bandidos saltaram da EcoSport, no caminho para Encruzilhada do Sul, e se embrenharam em matos.
— Como não podem fugir, eles abandonam a ideia e tentam se esconder em algum lugar. Começa o cerco, que é um jogo de paciência — explica o subcomandante-geral da Brigada Militar, coronel Douglas Soares.
A estratégia faz parte da Operação Angico, criada pela Brigada Militar para conter os ataques a bancos no Estado. Às 12h31min, o Batalhão de Operações Especiais e o Batalhão de Aviação da BM já estavam no local.
Grupos do Choque da BM e do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), da Polícia Civil, reforçaram os trabalhos. Nas primeiras horas, cerca de 80 policiais integravam o cerco. O número chegaria a quase 200 nas horas seguintes. Helicópteros e drone também passaram a ser usados no rastreio, além de uma antena instalada para estabelecer comunicação via rádio e internet.
Identificação
Em paralelo à caçada aos criminosos, os policiais trabalhavam na busca de vestígios que permitissem a identificação do bando. O Instituto-Geral de Perícias (IGP) também esteve no local para auxiliar na identificação dos autores do ataque. O veículo usado no assalto foi um dos pontos de partida da equipe da Delegacia de Roubos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic). A EcoSport havia sido roubada na semana anterior, em Pantano Grande.
— Já no primeiro momento, alguns vestígios nos deram o caminho para indicar a autoria. Tínhamos informalmente uma autoria identificada, que foi se confirmando no primeiro dia, a partir da coleta de provas e de confronto com outros vestígios encontrados no local do crime. A partir da identificação do veículo do roubo, fizemos o caminho inverso, que permitiu coletar outras imagens do grupo. Esse trabalho de identificação se deu num primeiro momento através de provas testemunhais, coletas de imagens, análise de passagens de veículos em câmeras de vigilância — detalha o diretor da Divisão de Investigação do Deic, delegado Eibert Moreira Neto.
Saber quem eram os criminosos por trás do roubo também era importante para quem estava nas buscas aos bandidos. Isso permitiria identificar e monitorar possíveis locais de esconderijo dos assaltantes. No fim da tarde de quinta-feira, na área do cerco, a polícia prendeu um dos suspeitos de ataque ao banco, Leandro Kroning Farias, 23 anos, com um fuzil de calibre 556, uma pistola e um colete.
Já durante a noite, às 21h50min, na casa de uma familiar de um dos investigados, em Encruzilhada do Sul, os policiais militares prenderam dois suspeitos. Com Diogo Rodrigues da Silveira, 22, e Airan Rodrigues Guterres Júnior, 24, foram encontrados os R$ 279,9 mil roubados, uma pistola 9 milímetros e um revólver.
— Eles roubaram um banco e fugiram para a casa da vó — diz o delegado.
Na mesma noite, os policiais trocaram tiros com outro criminoso, que seguia sendo procurado. No dia seguinte, as buscas avançaram para Santana da Boa Vista. Os policiais receberam informações de que o investigado poderia estar na casa de um familiar. Num helicóptero da Polícia Civil, a equipe do Bope pousou perto da moradia. Fabrício Beckenkamp da Silva, 20, foi preso dentro da residência, e, com isso, a operação de buscas foi encerrada.
Apesar do cerco ter sido marcado por mais de um confronto com os criminosos que estavam armados, inclusive com fuzil, nenhum policial ficou ferido na ação.
“Agiram por imitação”
Todos os presos por suspeita de envolvimento no assalto tinham antecedentes, por crimes como roubo a comércio, roubo de veículo e tráfico de drogas, mas nenhum deles por assalto a banco nesse tipo de modalidade.
— São criminosos contumazes, mas não no assalto a banco. Nisso, não tinham nenhuma expertise. Foi um roubo cometido por aventureiros. Poderia definir assim — diz o delegado.
Na visão da Brigada Militar, o fato de não serem criminosos que estavam no radar das forças de segurança por envolvimento nesse tipo de delito foi um dos motivos que dificultou a identificação prévia do bando.
— Talvez por isso, não tenhamos detectado via canal de inteligência. Foi uma coisa muito local. Quando é um de uma região e outro de outra, se comunicam. E nesse se comunicar a gente descobre e se antecipa. Aquela região já foi alvo de ocorrência de novo cangaço. E eles agiram por imitação. São imitadores e não uma quadrilha que faz crimes do tipo novo cangaço — diz o subcomandante da BM, coronel Douglas Soares.
Segundo a Polícia Civil, na sema passada foram encaminhados ao Judiciário os inquéritos com os indiciamentos dos quatro suspeitos. A polícia ainda está reunindo outras provas técnicas, numa investigação que permanece em aberto.
— Ainda estamos apurando se não existem outras pessoas envolvidas nos bastidores — explica o delegado.
A cronologia do ataque
- Quarta-feira, dia 7
Quatro assaltantes atacam a agência do Banrisul localizada na Rua Praça Quatro de Maio, no centro da cidade. Os criminosos fazem reféns e obrigam pelo menos 10 moradores da cidade, que tem cerca de 5,3 mil habitantes, a formar um cordão humano. Depois, fogem em uma EcoSport branca, levando dois reféns, que são liberados em seguida.
- Quinta-feira, dia 8
No fim da tarde, um suspeito é preso na área do cerco, com um fuzil e uma pistola. Durante a noite, dois assaltantes saem da área de mata onde estavam escondidos e abordam um carro que passava por uma estrada rural. Roubam o veículo e levam os ocupantes como reféns — que depois acabam libertados. Com este carro, eles seguem até a casa de um familiar. Por volta das 23h, os dois suspeitos são presos nesta moradia em Encruzilhada do Sul.
No local, a Brigada Militar consegue apreender R$ 279,9 mil que teriam sido roubados da agência bancária. Ainda na noite de quinta-feira, o quarto suspeito procurado pela polícia é visto em Encruzilhada do Sul, também em uma casa que seria da mãe dele. Ele troca tiros com os policiais e consegue novamente fugir para uma outra área de matagal.
- Sexta-feira, dia 9
É preso no início da tarde o quarto suspeito de envolvimento no ataque à agência do Banrisul. O homem é encontrado em Santana da Boa Vista, na casa de um familiar.
Contraponto
GZH busca contato com as defesas dos investigados. A reportagem entrou em contato com o Tribunal de Justiça para saber quem são os responsáveis pela defesa e aguarda retorno.