Um imbróglio levou ao fim, na manhã desta segunda-feira (27), o julgamento dos dois homens acusados pelo assassinato do policial militar Gustavo de Azevedo Barbosa Júnior, 26 anos, ocorrido em julho de 2019, na zona sul da Capital, após o roubo de um veículo. Durante o júri, logo após a formação do Conselho de Sentença, um dos advogados de defesa se aproximou dos jurados e questionou o nome de cada um. A Justiça decidiu encerrar a sessão e marcar nova data para 5 de fevereiro.
O júri estava previsto para iniciar às 9h30min, no salão da 2ª Vara do Júri, no Fórum Central. Seriam julgados Dejair Quadros de Almeida e Luis Vinícius Alves Azeredo — os dois estão presos pela morte do soldado Gustavo de Azevedo Barbosa Júnior, 26 anos. Chegou a ser realizado o sorteio dos nomes dos jurados, sendo que cinco mulheres e três homens formaram o Conselho de Sentença. Logo depois disso, enquanto eram fornecidos atestados às pessoas que não tiveram nomes sorteados para o júri, o advogado Leandro Soares, da defesa de Almeida, andou até a mesa dos jurados.
— Questionei somente "qual seu nome?" e anotei no papel. Fiz isso na frente do oficial de justiça — disse o advogado.
O promotor de Justiça Júlio Melo, responsável pela acusação, visualizou a cena e entendeu que isso causaria constrangimento aos jurados. A acusação alertou a juíza Ângela Roberta Paps Dumerque, do 1º Juizado da 2ª Vara do Júri, que presidia a sessão. A magistrada então se dirigiu aos jurados e questionou se algum deles tinha se sentido constrangido com a ação da defesa. Duas juradas responderam afirmativamente.
— O padrão é ser feito o sorteio, o nome de todos os jurados é registrado em ata, então as defesas, as partes têm acesso aos nomes. E os jurados ficam incomunicáveis, então esse ato de ir e se dirigir a eles representa uma quebra de incomunicabilidade — explicou a juíza.
Em razão disso, a magistrada decidiu dissolver o Conselho de Sentença, liberando aqueles jurados, e marcar uma nova data para o julgamento. Para esta nova sessão, serão sorteados outros possíveis jurados.
— Esse proceder (de contato com os jurados) então será evitado — disse a juíza sobre o novo júri.
Possível nulidade
No entendimento do promotor do Ministério Público, a ação do advogado poderia ser entendida futuramente como um motivo para pedir a nulidade do julgamento.
— Isso quebra a incomunicabilidade dos jurados, que não podem nem mesmo conversar entre eles sobre o processo. Essa conduta não é permitida. Portanto, levou ao adiamento da sessão. Foi marcada nova data e nós do MP mais uma vez estaremos prontos para promover a justiça na sessão agora agendada. O conjunto probatório é bastante consistente, no sentido de apontar responsabilidade de ambos réus, que seriam julgados hoje, e serão julgados no dia 5 de fevereiro, pela prática de todos os delitos descritos na denúncia — disse Melo.
Já a defesa do réu Dejair argumentou que a conduta não é vedada, e que o intuito com a ação era somente poder se dirigir aos jurados nominalmente durante a fase dos debates.
— A defesa em nenhum momento se insurgiu ou quis constranger as juradas. O MP é que insurgiu contra esse requerimento de nada mais que o nome. Inclusive, isso foi feito na frente do próprio oficial de justiça esse questionamento para cada jurado e cada jurada. Não há nenhuma insurgência, nenhuma manipulação da defesa ou de querer constranger algum jurado ou alguma jurada — alegou Soares.
— Não existe vedação legal. Essa prática é uma medida de prestígios aos jurados, que são os juízes naturais da causa. Não é a magistrada, ela apenas preside os trabalhos. Quem julga são os jurados. O conhecimento do nome é uma forma de prestígio para se referir no momento dos debates — complementou a advogada Eduarda Garcia, que também representa o réu.
Indignação
A Defensoria Pública, responsável por atuar em nome de Azeredo, se manifestou após o encerramento da sessão, indignada com o desfecho. A defesa pediu à Justiça que seja concedida liberdade provisória ao réu.
— Nós estávamos preparados, o réu está preso, tão somente por esse processo, não tem antecedentes, tem esquizofrenia, precisa de medicação, de tratamento. Nós estávamos prontos para fazer. Ele vai ser julgado só em fevereiro. Vai passar o Natal e o Ano-Novo recolhido, se não concederem a liberdade provisória. A Defensoria Pública não participou de chicana (argumento falacioso para dificultar andamento de processo) nenhuma para que o júri não saísse. Estamos indignados pelo fato de ter sido adiado — disse a defensora pública Tatiana Kosby Boeira.
Os crimes
Na madrugada de 10 de julho de 2019, o policial militar Gustavo de Azevedo Barbosa Júnior, 26 anos, circulava de viatura com um colega na zona sul de Porto Alegre. O PM, que havia ingressado na corporação três anos antes e era casado, estava na carona, ao lado do motorista. Os dois avistaram um veículo, que havia sido roubado pouco antes. Durante a tentativa de abordagem, os criminosos reagiram e atiraram contra os PMs. O soldado foi alvejado, chegou a ser socorrido, mas não resistiu.
Os crimnosos fugiram do local abandonando o veículo, armas e uma mulher, que teria sido sequestrada por eles, momentos antes. Eles pretendiam, com o sequestro, segundo a acusação, que ela fornecesse o paradeiro de seu ex-companheiro, pertencente a uma facção rival. Os dois réus são acusados do assassinato do policial, de tentativa de homicídio contra o outro PM, de roubo de veículo, cárcere privado e sequestro (contra a mulher), posse de arma de uso restrito e corrupção de menores.
Contrapontos
Antes do início do júri, as defesas dos dois réus se manifestaram afirmando que buscariam comprovar durante a sessão a inocência dos réus.
O que diz a defesa de Dejair Quadros de Almeida
Os advogados Eduarda Garcia e Leandro Soares alegam que o réu está preso há mais de três anos de forma preventiva e entendem que não há provas da participção dele.
— A defesa lamenta a morte de um policial, lamenta que um servidor público tenha morrido nesse tiroteio. A defesa quer mostrar que naquele momento o Dejair não estava no local dos fatos. Ele estava com a família — afirmou o advogado Leandro Soares.
O que diz a defesa de Luis Vinícius Alves Azeredo
A Defensoria Pública se manifestou informando que tem convicção da inocência do réu e que pretende demonstrar isso aos jurados.
— O fato é grave, não se discute isso. Se lamenta a morte de um policial militar, mas a participação dele nesse evento é que temos convicção de que não aconteceu. Ele não estava nem no carro, nem disparou contra o policial. Ele foi preso em flagrante, vendendo bergamotas no dia seguinte na esquina da Rua Silva Só com a Avenida Ipiranga. Isso não é postura de quem acabara de assassinar um policial militar — afirmou a defensora pública Tatiana Kosby Boeira.
Atuam também na defesa do réu os defensores Alessandra dos Santos Pereira e João Bosco.