A corretora de imóveis Eliana Beatriz Fetter Mayer, 47 anos, foi denunciada pelo crime de injúria racial após enviar uma mensagem em tom homofóbico a um cliente, em Porto Alegre. De acordo com a investigação, ela teria se referido ao homem como "veado abobado". A conversa entre os dois, que ocorreu em junho, foi salva pelo homem, que procurou a polícia e também busca reparação por danos morais. A denúncia, recebida em 4 de agosto, será analisada pela 5ª Vara Criminal da Capital.
Conforme o Ministério Público do Estado (MP-RS), a corretora teria cometido o crime de injúria racial. Segundo o relato do homem que se diz vítima, o empresário Fernando Fantinel, 55, a mulher se identificou como corretora da imobiliária Foxter. A denúncia do MP é contra a corretora: "O processo penal trata de conduta de homofobia praticada por uma pessoa física. Não interessa ao nosso processo se a denunciada trabalha de forma independente, como constou na denúncia e no inquérito policial, ou se trabalhava para alguma imobiliária".
Segundo o MP, crimes de injúria racial também enquadram atos de homofobia, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF). Em nota, a instituição destacou que "a injúria relativa à orientação sexual (homofobia) é reconhecida" pelo Supremo "como forma de preconceito".
A mensagem
De acordo com o empresário, o contato com a mulher começou quando ele buscava imóveis residenciais para compra. Fantinel afirma que ao menos quatro locais foram visitados por ele e a corretora.
Em 20 de junho, os dois trocavam mensagens por WhatsApp, combinando uma oferta que ele faria ao proprietário de um apartamento.
Na sequência, a corretora afirmou que os próximos passos da compra deveriam ser acertados com seu gerente e disse que ia encaminhar o contato de Fantinel ao colega. No entanto, ela teria se confundido e enviado o contato do empresário a ele mesmo, junto da frase "veado abobado".
— Eu li a mensagem assim que chegou. Tentei ligar, mas ela não atendeu. Então mandei mensagem questionando. Ela disse que era assim que chamava outra pessoa, que não era para mim, mas é óbvio que se enganou e mandou errado. Depois ela apagou as mensagens, mas consegui salvar a imagem — lembra.
Fantinel afirma que, logo após receber a mensagem, também entrou em contato por telefone com a imobiliária Foxter, mas não teria obtido "retratação". Ele diz que uma nova mensagem foi enviada pela mulher naquela noite:
— Ela pediu desculpas, disse que estava em um momento de estresse, que não é homofóbica, porque até me deu um abraço em uma das visitas. Depois, não tive mais contato com ela nem com a imobiliária.
O empresário conta que procurou a polícia para registrar boletim de ocorrência no mesmo dia.
— Sempre fui tranquilo em relação a minha orientação sexual, sempre tive apoio da minha família. Em 2023, passar por algo assim, para mim, é inadmissível — desabafa.
Investigação
Durante o inquérito policial, a corretora foi ouvida, segundo a polícia. A delegada Rosane de Oliveira afirma que o delito estaria comprovado. Ela diz que também foi ouvida uma terceira pessoa, funcionária da imobiliária.
— A corretora disse que estava muito estressada, que não tem perfil homofóbico e que enviou o comentário por engano. De qualquer forma, ela consumou o delito, então foi indiciada — explica a delegada do 3ª DP da Capital.
Danos morais
Além do processo criminal por injúria racial, o empresário ingressou com ação cível, buscando indenização por direitos morais, explica o advogado dele, Diego Candido:
— Ajuizei ação cível buscando reparação contra a corretora e a imobiliária, a qual estaria ciente do fato desde o início, por contato feito pela vítima com a gerente. É inadmissível que situações como essa venham ocorrendo e se repetindo nos dias de hoje, ainda mais se tratando de relação imobiliária, constituindo dever do corretor respeitar o cliente sob todas as formas, configurando, inclusive, infração ética passível de denúncia junto ao conselho de corretores do Estado.
Contraponto
A reportagem entrou em contato com Eliana Beatriz Fetter Mayer, que preferiu não se manifestar.
Procurada, a imobiliária, que pertence ao Grupo Loft, manifestou-se por nota. A empresa diz que a corretora e a gestora — com quem o empresário diz ter conversado naquele dia — não comunicaram a Foxter sobre o ocorrido. Assim, a imobiliária diz que tomou conhecimento do caso ao ser procurada pela reportagem, nesta semana.
Leia a íntegra da nota enviada pela imobiliária:
"O Grupo Loft esclarece que tomou conhecimento nesta segunda-feira, 14 de agosto de 2023, de uma denúncia segundo a qual uma corretora autônoma parceira da Foxter, imobiliária que pertence ao Grupo Loft, teria usado termos homofóbicos ao se comunicar com um cliente, por uma rede social própria.
O Grupo Loft reafirma que não tolera qualquer tipo de discriminação pessoal e informa que a referida corretora teve seu contrato de parceria suspenso, bem como foi bloqueada das plataformas do Grupo. Assim, ela não poderá mais atuar como parceira do Grupo, inclusive da Foxter, até que as autoridades competentes, e o time de Compliance da empresa, encerrem as investigações e esclareçam completamente a ocorrência.
O Grupo Loft informa também que está em contato com o cliente em questão, para prestar o auxílio cabível. Esclarece, ainda, que no momento da formalização da parceria com corretores autônomos, inclusive parceiros Foxter, oferece treinamentos sobre respeito a todo tipo de diversidade e inclusão. Estes treinamentos serão intensificados por meio de ações do time de compliance".