Desde o dia 13 de maio, véspera do Dia das Mães, Janaína Correa de Souza, 46 anos, não consegue trocar nem mesmo o lençol da cama do filho Leonardo de Souza Xavier, 19 anos. Deixou tudo intacto. Às 15h30min daquele sábado, o jovem saiu da casa, localizada no bairro Mathias Velho, em Canoas, na Região Metropolitana, e disse que retornaria em seguida. Subiu na carona da moto de um amigo e nunca mais voltou.
Por três semanas, a mãe percorreu um calvário batendo em portas de hospitais, delegacias e do Departamento Médico Legal (DML). Fez buscas em matagais e organizou manifestações, suplicando por respostas sobre o paradeiro do caçula. Na última sexta-feira (2), o corpo do rapaz foi encontrado enterrado numa área de mata de Nova Santa Rita. Taís de Lima Prestes, 24 anos, também foi localizada morta no mesmo local.
Leo, como era chamado o jovem, cresceu na casa onde a mãe e o padrasto vivem até hoje, na Rua Tapes. Bem próximo dali, no Colégio Estadual Tereza Francescutti, estudou até o oitavo ano. Hiperativo, costumava passear pelos corredores da escola. Afetuoso e de sorriso marcante, cativava as professoras e funcionárias, mesmo na hora de receber bronca. Mais tarde, passou a cursar, por meio da Educação de Jovens e Adultos (EJA), o nono ano na Escola de Ensino Médio Ministro Rubem Carlos Ludwig, no mesmo bairro.
Quando o jovem desapareceu, a mãe recebeu a visita dos educadores, preocupados com o sumiço de Leo. No quarto do rapaz, estão troféus e uma série de medalhas que ele conquistou ao longo dos anos em torneios de futebol. Ao lado, pende no guarda-roupas um banner com a foto do jovem e a frase "Descanse em Paz". A família mandou imprimir também outras fotografias de Leo. O intuito é usar as imagens durante a cerimônia de despedida, que eles ainda não sabem quando deve ocorrer.
Em razão do tempo transcorrido entre o sumiço e a localização do cadáver, não foi possível realizar a identificação por meio das digitais. A família tentou buscar exames da arcada dentária de Leo, mas não foram encontrados. Como última alternativa, foi realizado exame de DNA pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) para confirmar a identificação. Somente após o resultado, ainda sem data, o corpo será liberado.
— Sabemos que é ele, reconhecemos pelas tatuagens. Mas precisam da identificação. Não consigo nem mesmo enterrar meu filho. É muito sofrimento — desabafa a mãe.
Jovem deixa uma menina prestes a nascer
No quarto, Janaína mostra os livros da autoescola que Leo estava cursando. O jovem estava tirando habilitação para carro e moto, e planejava trabalhar como motorista. No mesmo cômodo, sobre a cama, duas roupinhas de bebê, e, junto à parede, um cercadinho infantil colorido. Leo deixa uma filha que deve nascer no fim deste mês. O rapaz mantinha um relacionamento desde a adolescência com a jovem que está grávida de oito meses e meio. Moravam juntos na mesma casa onde vive a família. Chegaram a romper há cerca de quatro meses, mas estavam retomando a relação.
Na quinta-feira, antes do sumiço, compraram as últimas peças do enxoval da filha. Janaína entrou no quarto e viu Leonardo na cama cercado pelas roupinhas da criança.
— Meu filho não poderá ver a filha dele nascer. Meu filho tinha planos, tinha sonhos. O que fizeram foi uma covardia — desespera-se a mãe.
Em todos os cantos da casa, ela revive lembranças dos momentos com o filho. Quando ele era pequeno, a mãe e o padrasto, com quem ele convivia desde os três anos, sentavam em frente à casa tomando chimarrão, enquanto ele brincava na rua. No mesmo pátio, corre a cachorrinha Jade, que Leo resgatou e levou para casa quando filhote. Desde que o jovem desapareceu, a cadela cheira a casa em busca dele e chora no portão. Na cozinha, um cartaz na geladeira tem a foto do jovem e palavra "Desaparecido". No mesmo local, a mãe lembra das tantas vezes em que repreendeu Leo por deixar o copo de achocolatado dentro da pia, logo após ela lavar a louça.
— Quando abro a porta, ainda tenho esperança de ver o copo outra vez na pia — chora.
Foi ali também, na cozinha, que, dias antes do sumiço, sentado junto à mesa, Leo brincou com a mãe que em breve iria sair de casa. Percebendo que ela não havia gostado, apressou-se em consertar a situação.
— Ele me abraçou e disse que era brincadeira. Que não iria embora. Mas meu filho realmente foi embora — lamenta.
Leo iria voltar a trabalhar num pet shop de Porto Alegre — onde já havia atuado anteriormente — na quinta-feira, dia 15 de maio. O jovem, que conseguiu o primeiro emprego ainda na adolescência, foi funcionário também de uma chapeação.
O sumiço
Leo saiu de casa na tarde do sábado, dia 13 de maio, na carona da motocicleta de um amigo de infância. A mãe repreendeu o filho, alertando para que não demorasse.
— Meu filho saiu de casa sorrindo. O sorriso era uma marca dele. Não sabia que estava indo para a morte. Me disse que já voltava e nunca mais. Nunca mais essa casa será a mesma — diz a mãe.
Meu filho saiu de casa sorrindo. O sorriso era uma marca dele. Não sabia que estava indo para a morte. Me disse que já voltava e nunca mais. Nunca mais essa casa será a mesma.
JANAÍNA CORREA DE SOUZA
Mãe de Leonardo
Conforme as horas foram passando, Janaína começou a se preocupar. O filho estava sem celular e não havia levado documento de identidade. No início da noite, ela entrou em contato com o amigo de Leo para saber onde estavam. O rapaz alegou que não estavam mais juntos e não sabia do paradeiro. Como ele não retornou, a mãe decidiu buscar a polícia naquela mesma noite. Ao longo dos dias de busca, Janaína ficava aflita pensando no que o filho poderia estar passando, e onde estaria.
— O Leo sempre foi guloso. Eu ficava pensando: "Será que ele não está passando fome?" — recorda a mãe, que em casa tentava agradar o filho fazendo as comidas de que ele gostava.
Na quinta-feira (1º), quando Janaína completou 46 anos, o pedido que fez foi para que se encerrase a procura pelo filho, e que ele voltasse para casa. O martírio teve desfecho no dia seguinte, a última sexta, quando o corpo do rapaz foi encontrado enterrado em Nova Santa Rita. Junto dele, estava o cadáver de Taís, também moradora de Canoas, e mãe de uma menina. A causa da morte dos dois será indicada pela perícia. A família de Leo afirma que o jovem nunca falou sobre ela e que não sabe se eles tinham alguma proximidade.
— Não descansei até que ele fosse encontrado. E não vou descansar até que todos que fizeram isso com ele estejam na cadeia — afirma a mãe.
Investigação
A Polícia Civil vem mantendo os desdobramentos da investigação sob sigilo. Uma das hipóteses investigadas é de o crime ter sido cometido por ciúme. Segundo o delegado Arthur Reguse, da Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de Canoas, um dos investigados é suspeito de ter planejado a execução dos dois por ter se sentido traído pela jovem, que estaria se relacionando também com Leo. Os nomes dos investigados são mantidos em sigilo.
— Estamos apurando todos os fatos, mas os indícios levam a nossa investigação à questão do ciúme — disse o delegado.
GZH tentou contato com familiares da jovem, mas não obteve retorno até o momento.