Um jovem com poucos amigos, introspectivo e fechado até mesmo com a família. Fabiano Kipper Mai, 18 anos, cursa o 3º ano do Ensino Médio da Escola Estadual Rodrigues Alves, em Saudades, Santa Catarina. Desde março do ano passado, assistia aulas de forma remota devido à pandemia. No começo do ano letivo de 2021, teve a opção de retornar para a escola. Preferiu seguir em casa.
O autor da chacina que matou três bebês e duas professoras na Escola Pró-Infância Aquarela na manhã de terça-feira (4) tinha uma rotina que envolvia trabalho, estudos e longas horas trancado dentro do quarto navegando pela internet.
Morava em uma residência de alvenaria com o pai, jardineiro, a mãe, dona de casa, a irmã e a avó materna, que se recupera de um câncer, além de um cachorro, gato e um coelho que corria pela casa. No terreno ao lado, a família planta flores e frutas para consumo próprio. Todos deixaram o endereço, no bairro Morada do Sol, conhecido por ser castigado por cheias frequentes do Rio Saudades, e estão abrigados na casa de parentes. Procurados por GZH, o pai e a mãe não retornaram as ligações.
— Os pais não têm condições de falar, são pessoas simples, humildes e analfabetos. E consideram que, de alguma forma, perderam o filho, ou porque vai ficar preso o resto da vida ou pela questão clínica (Fabiano segue internado em hospital da região) — afirma o advogado Kleber dos Passos Jardim, convocado pela Justiça para assumir o caso.
Fabiano trabalhava bordando roupa em uma fábrica de confecções da cidade. Cumpria turno das 5h às 15h, com intervalo de uma hora. Pelos colegas de trabalho é descrito como um homem quieto e que jamais deu sinais de que estava planejando atacar uma escola.
Na data da chacina, trabalhou como outro dia qualquer até 9h15min. Até o momento do crime, Fabiano não era um rosto conhecido na cidade, diferentemente do pai, que costumava a ir campings jogar bocha, mas nunca acompanhado do filho.
Um familiar que conversou com GZH, sob a condição de anonimato, disse que, nas oportunidades em que almoçou na casa dos Kipper Mai, Fabiano não pronunciou uma palavra durante as refeições:
— O que eu percebia dele, e achava estranho, é que ele não conversava com ninguém. Quando as pessoas estavam lá, ele ficava no quarto, não se misturava. Só dizia um bom dia se você falava com ele antes.
Era dentro do quarto que Fabiano passava a maior parte do tempo com jogos online. A Justiça autorizou acesso ao computador e pen drive. A polícia adianta, sem dar detalhes, que encontrou vasto material a ser analisado nos equipamentos.
— Ele trabalhava de dia e era estudante à noite. Não sei o que ele fazia no quarto. A gente mal ouvia ele falar algo, nas vezes que íamos lá, final de semana, Páscoa, ele vivia trancado no quarto, de porta fechada. Eu achava estranho ser tão quieto, mas pensava que era uma fase de adolescente meio esquisito. Uma única vez que eu estava lá vi ele saindo de bicicleta com os amigos, mas em geral estava sempre sozinho — conta outro familiar, que também não quer se identificar.
"Quero saber a motivação", diz advogado
A faca usada na chacina foi comprada na internet. Quando a encomenda chegou, na sexta-feira (30), Fabiano teria brincado com a irmã dizendo que a usaria para matar seu coelho.
— O relato da família é que ele sofria bullying na escola. Mas não conversei com ele ainda. Quero saber a motivação. Como foi feita a compra dessa faca, de onde tem esse dinheiro, se planejou isso sozinho ou tem outras pessoas envolvidas. Dizem que ele guardava o dinheiro que recebia no trabalho — afirma o advogado.
Segundo a polícia, Fabiano não tinha nenhuma relação com a Escola Aquarela ou com crianças e professores que a frequentavam. O coordenador regional de Educação Erno Pedro Schwerz afirma que, durante este ano, Fabiano seguiu entregando os trabalhos de aula.
— Era um aluno normal, quieto, nunca teve problemas de disciplina. Ele tinha alguns registros de deficiência de aprendizagem, tinha certa dificuldade nisso. Mas nunca se percebeu nada. Nenhum sinal. Foi uma grande surpresa e algo inacreditável — diz Schwerz.