O corpo de Douglas Gonçalves Romano dos Santos, 23 anos, foi sepultado no fim da tarde desta terça-feira (25), em Porto Alegre. Delator de uma das maiores facções do Rio Grande do Sul, foi morto a tiros na noite de domingo em Balneário Camboriú, no litoral de Santa Catarina. A principal suspeita da Polícia Civil do Estado vizinho é que tenha sido executado por membros do grupo criminoso gaúcho.
Na segunda-feira (24), familiares de Douglas viajaram a Santa Catarina para fazer o reconhecimento do cadáver, que era mantido no Instituto Médico Legal de Balneário Camboriú. Nesta terça-feira, o sepultamento aconteceu no Cemitério Jardim da Paz.
Ex-gerente do tráfico do bairro Mario Quintana, na zona norte da Capital, em 2017, o porto-alegrense se tornou autor da delação que resultou em mais de 60 processos contra a organização criminosa. Por isso, vivia no Estado vizinho, sob resguardo de programa de proteção a testemunhas. Em janeiro, desligou-se voluntariamente do programa.
Menos de um mês depois, sofreu tentativa de homicídio em 2 de fevereiro, quando residia em Camboriú. Douglas foi baleado na saída de um clube e chegou a ficar hospitalizado, mas sobreviveu. Depois, mudou-se para Balneário Camboriú, e passou a viver em bairro residencial de classe média. Sem proteção do Estado, vivia em uma casa na Rua Justiniano Neves, no bairro Pioneiros. Às 21h30min de domingo, foi morto com tiros de pistola calibre 9 milímetros, logo após descer de um carro no qual havia pego em corrida por aplicativo.
Responsável pela investigação do assassinato, o delegado Divisão de Investigação Criminal (DIC) de Balneário Camboriú, Ícaro Freitas Malveira, confirma que a principal suspeita é de que Douglas tenha sido executado pela facção gaúcha. O ataque à casa de festas onde foi baleado no início de fevereiro também foi orquestrado pelo mesmo grupo criminoso, segundo a polícia.
— Tudo indica que membros dessa facção do RS, os Bala na Cara, vieram até a aqui com objetivo de executar o Douglas — afirma.
Para compreender a dinâmica do crime, de onde vieram os executores e para onde escaparam, os investigadores mapearam os locais com câmeras de segurança no entorno de onde aconteceu o crime e pretendem ouvir novamente o motorista de app que realizou a corrida para o delator.
— Devido à questão do Carnaval, estamos com dificuldade para conseguir acesso às imagens. Alguns estabelecimentos nos arredores estão fechados. Mapeamos a região para obter imagens do momento do crime — diz o delegado.
Ainda conforme o policial, a execução nesses moldes — foram disparados pelos menos 17 tiros de pistola contra Douglas — é incomum na região onde aconteceu. No ano passado, Balneário Camboriú registrou 16 homicídios, a maior parte deles em um único bairro, que é considerado o mais violento. Neste ano, já são sete assassinatos, sendo que os últimos cinco em áreas de classe média ou alta. Os crimes estariam vinculados ao tráfico de drogas e disputas entre facções.
A delação
Um depósito de drogas usado pela facção em Canoas foi o primeiro local descoberto pela polícia, em fevereiro de 2017, com base na confissão do delator. O relato dele à Polícia Civil e ao Ministério Público detalhou série de crimes da organização criminosa, envolvendo execuções brutais, nos quais vítimas foram esquartejadas com vida.
Com base nos depoimentos, foram solicitadas mais de 150 prisões preventivas envolvendo tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e homicídios. Também foi realizada série de operações para apreensão de bens e um cemitério clandestino usado para esconder cadáveres de desafetos foi localizado na Zona Leste. A Promotoria estima que mais de cem corpos tenham sido enterrados no local.
Ainda com a ajuda da delação, pelo menos três líderes da facção foram isolados. Em março de 2017, José Dalvani Nunes Rodrigues, o Minhoca, considerado um dos principais chefes do grupo, foi transferido para a penitenciária federal de Campo Grande (MS). Em julho do mesmo ano, outros 27 chefes do crime organizado foram encaminhados para unidades de segurança máxima fora do Estado, entre eles Fábio Fogassa, o Alemão Lico, e Marcio Oliveira Chultz, o Alemão Márcio.
Assim como as pessoas que delatou, Douglas também respondia pelos crimes dos quais confessou. O criminoso era réu em pelo menos 18 processos por homicídio. No entanto, como foi realizado acordo de delação premiada ele era mantido em liberdade, dentro do programa de proteção a testemunhas. Ao longo dos últimos três anos, participou de audiências pessoalmente ou por videoconferência onde depôs judicialmente sobre os crimes dos quais delatou.