O autor da delação que abalou uma das maiores facções criminosas do Rio Grande do Sul foi executado a tiros na noite de domingo (23) em Santa Catarina. Douglas Gonçalves Romano dos Santos, 23 anos, foi morto a tiros em Balneário Camboriú, onde estaria residindo. Ele chegou a integrar programa de proteção a testemunhas, do qual se desligou em janeiro deste ano.
Segundo a Polícia Militar da cidade do litoral catarinense, Douglas estava em uma corrida de aplicativo e desembarcou na Rua Justiniano Neves, no bairro Pioneiros. O motorista relatou à polícia que deixou o passageiro no local e que logo depois ouviu os disparos.
Quatro homens estariam no veículo de onde partiram os disparos. O homem foi atingido por diversos tiros de pistola calibre 9 milímetros. No local foram recolhidos 17 cartuchos de munição deflagrada. Pelo menos quatro a cinco disparos teriam acertado a cabeça da vítima.
No dia 2 de fevereiro, Douglas já havia sido baleado durante festa em Camboriú. Ele chegou a ficar hospitalizado e estava, atualmente, com uma das pernas engessada.
A delação
Em 2017, Douglas procurou a Polícia Civil e delatou a facção Bala na Cara, da qual foi integrante em Porto Alegre. Ex-gerente do tráfico no bairro Mario Quintana, relatou aos policiais e ao Ministério Público uma sequência de crimes cometidos a mando do grupo criminoso, com berço no bairro Bom Jesus, na zona leste da Capital.
Na delação, Douglas revelou detalhes sobre o funcionamento da facção e sobre sequestros e esquartejamentos. A confissão gerou, nos últimos dois anos, pelo menos 60 processos por homicídios envolvendo a facção.
Medo, medo de morrer, não. Na real, eu já tô fazendo hora extra na Terra. Fico espiado. Mas medo, medo de morrer, não tenho, não. Já tive bastante no comecinho. Não sei se já me conformei. Uma hora vão me pegar, isso é certo.
DOUGLAS GONÇALVES ROMANO DOS SANTOS
Delator de facção em entrevista a GaúchaZH em março de 2019
Em acordo de colaboração premiada com a Justiça, Douglas foi inserido no programa de proteção a testemunhas e deixou para trás não apenas o bairro ou a Capital. Passou a morar fora do Rio Grande do Sul, sob proteção federal, aguardando o julgamento dos processos no qual era réu. Jurado de morte, mudava-se com frequência de cidade e Estado.
Em março de 2019, a história da delação foi contada em reportagem de GaúchaZH. Em entrevista, ele chegou a afirmar que sabia que seria morto em algum momento, como forma de represália pela delação.
— Uma hora vão me pegar, isso é certo — afirmou.
A reportagem teve acesso a 24 processos, sendo que em 18 o delator é réu e em seis a colaboração serviu de embasamento para apurar o caso. Há detalhes de crimes bárbaros, como um esquartejamento em 2016, enquanto a pessoa estava viva. Em decisão judicial do primeiro trimestre de 2018, o homem é citado como antigo gerente do tráfico, sob comando de José Dalvani Nunes Rodrigues, o Minhoca — que se tornou réu e continua sendo investigado, suspeito de ter ordenado outros homicídios.
Com ajuda da delação, pelo menos três líderes da facção foram isolados. Em março de 2017, Minhoca foi transferido para a penitenciária federal de Campo Grande (MS). Em julho do mesmo ano, outros 27 chefes do crime organizado foram encaminhados para unidades de segurança máxima fora do Estado, entre eles Fábio Fogassa, o Alemão Lico, e Marcio Oliveira Chultz, o Alemão Márcio.