Em 2010, a partir de alianças, uma facção com berço no bairro Bom Jesus, na zona leste de Porto Alegre, transformou a Vila dos Sargentos, no bairro Serraria, em seu primeiro reduto às margens do Guaíba na Zona Sul. Com elevação estratégica, que permite vantagem numa eventual invasão de rivais ou ação da polícia, o morro era atrativo para a quadrilha.
A vila virou ponto de armazenamento de armas e drogas, além de permitir a cooptação de novos "soldados". O local passou a ser ponto de tiroteios. No meio disso, inocentes viraram vítimas, como uma idosa, alvejada na cabeça em julho de 2016, no portão de casa.
— Por um tempo, ficou insuportável viver aqui. A gente saía pra ir na padaria e via crianças, de 12 ou 13 anos, armadas — recorda uma moradora.
Com esta mesma idade, a dona de casa brincava nas ruelas tortas e íngremes, que décadas depois viu serem tomadas pelo crime. Em julho de 2017, o posto de saúde que funcionava na comunidade foi fechado, um mês após funcionários terem saídos da unidade escoltados, após tiroteio.
No fim daquele mês, a maior parte das lideranças da facção foi enviada para prisões federais. Os homicídios caíram na Capital e na comunidade. Mas o grupo criminoso continua atuando em outras frentes: explora a venda de gás, taxa comércio de bebidas e aluga imóveis.
— Está diferente. Não tem mais tiroteios, graças a Deus — diz uma moradora, que reconhece que não se arrisca a comprar o gás de cozinha em outro local.
Relembre alguns casos:
Casa de tortura - Maio de 2015
A investigação do desaparecimento de um taxista levou a polícia à descoberta de uma casa de tortura mantida por traficantes ligados à facção. O local serviu como cativeiro para outro taxista, sequestrado durante um assalto. O grupo que mantém o controle da vila criou fama por eliminar os rivais e devedores, esquartejar corpos e jogar no Guaíba.
Morador executado - Julho de 2016
Um homem foi executado e teve o corpo exposto, nu e enforcado com uma corda em meio à Rua Leodoro Pereira da Silva. Pouco antes das 6h, Vilmar Adão Goulart Fraga, 54 anos, morador da vila, teria sido arrancado de casa por criminosos. Era uma mostra do terror empregado pelo grupo, que executava pessoas no meio da rua.
Posto de saúde fechado - Julho de 2017
A unidade de saúde Morro dos Sargentos, que funcionava na Rua Nelson Dalmás, e atendia 5 mil pacientes, fechou definitivamente em julho de 2017. Os funcionários se diziam acuados, em função da guerra entre facções. Moradores passaram a ser atendidos em outras unidades de saúde, nos bairros Guarujá e Ipanema.
Táxi atacado - Janeiro de 2019
Um táxi foi atacado com mais de 20 tiros na madrugada de 19 de janeiro. O passageiro, que acabou baleado em uma das pernas, em um braço e nas costas, recebeu alta horas depois. Segundo a Polícia Civil, o grupo tinha como objetivo executar um integrante de facção criminosa rival.
Ônibus incendiado - Janeiro de 2019
Um coletivo da linha 283 (Ipanema-Cavalhada) foi incendiado em 28 de janeiro, na Rua Geralda dos Santos Moreira. Quatro criminosos atiraram para o alto e, logo depois, atearam fogo ao ônibus, que estava na parada, sem passageiros. O crime teria sido cometido por uma facção rival. A linha foi alterada e não ingressa mais na vila.
Construção de novo posto - Fevereiro de 2019
A obra iniciou há seis meses, em terreno na Rua Argemiro Ogando Corrêa, esquina com a Rua Geralda dos Santos Moreira. A área pertencia ao Exército. Para ter o espaço, em contrapartida, a prefeitura ergueu um muro de 110 metros junto ao terreno. A construção tem custo de R$ 1,4 milhão. A previsão é de que a inauguração ocorra até dezembro.