Proposta pelos motoristas no começo deste ano, a abertura de uma delegacia especializada para aplicativos não deve sair do papel. Segundo a diretora do Departamento de Polícia Metropolitana (DPM), Adriana Regina da Costa, não se viu necessidade específica para a criação da DP. Por isso, os casos devem seguir sendo investigados em força-tarefa entre as delegacias distritais e pela divisão de inteligência da corporação.
— É uma situação que preocupa. Mas a gente acredita que esse é um tipo de crime que acabou migrando dos taxistas para os motoristas de aplicativos — observa a delegada.
Um dos motivos para não abrir uma DP específica é a falta de servidores, segundo explica a chefe da Polícia Civil, delegada Nadine Anflor, que salienta que intenção é valorizar o trabalho realizado nas distritais.
— Nada melhor do que o próprio policial da área investigar esses casos — observa.
Passados mais de três anos do início da operação dos aplicativos de transporte, 2.274 assaltos foram cometidos contra os condutores em 26 cidades gaúchas entre 2016 a 2018 - uma média de dois roubos por dia. Os dados foram obtidos por GaúchaZH pela Lei de Acesso à Informação (LAI) e, para a análise, foram utilizadas técnicas de programação, devido ao grande volume de material.
Responsável por apurar roubos de veículos cometidos por organizações criminosas, o titular da Delegacia de Roubo de Veículos, delegado Rafael Lidke, salienta que os assaltos contra motoristas de apps ocorrem de maneira individual ou em pequenos grupos.
— O que a gente tem visto em Porto Alegre é que qualquer ladrão de carro está roubando Uber. Não tem uma organização criminosa especializada em roubar motoristas de aplicativos. O que a gente acredita é um chamariz, de realizar um chamado. Pensando na mente do criminoso: "Eu preciso assaltar à mão armada em um lugar que seja fácil para mim, que não tenha a Brigada Militar, que não tenha a Polícia Civil. Então, vou para um lugar mais fácil para mim, aí eu chamo o Uber". Quando o motorista entra na rua, já sabe que ele vem sozinho, que não está armado, que não é policial. O risco para o assaltante é mínimo — observa o delegado.
Falta de comunicação
O coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal e de Segurança Pública do Ministério Público, promotor Luciano Vaccaro, acredita que o número de ocorrência seja ainda maior, devido à existência de uma cifra oculta de condutores que não procuram a polícia para comunicar o crime.
— Nas reuniões com motoristas, eles mesmo afirmaram que muitos não registram. Em muitos casos, eles mesmo se mobilizam e localizam o carro. Fazem isso para o veículo não ficar retido em um depósito e perderem dias da semana de trabalho — observa o promotor.
Além disso, na hora de alugar um carro, muitos deixam de informar que são motoristas de aplicativos, já que o seguro cobrado é maior. Segundo Vaccaro, a Promotoria tem acompanhado a situação dos condutores de apps, entretanto, algumas exigências esbarram na falta de legislação específica. Em Porto Alegre, ficou de fora da lei o fornecimento de mais informações do passageiros e maior rigor no cadastro deles.
— Do ponto de vista legal, não temos legislação nacional. Aqui em Porto Alegre, a legislação não avançou em determinados pontos — salienta o promotor.
Já na Brigada Militar, os policiais têm trabalhado de forma integrada e mais próxima dos motoristas, a partir de grupos de WhatsApp, nos quais são compartilhadas informações de vítimas ou de suspeitos. Segundo o comandante do Comando de Policiamento da Capital (CPC), coronel Rodrigo Mohr Picon, ao se diminuir roubos é possível baixar os indicadores de latrocínio (roubo com morte).
— Ao todo, 38% dos latrocínios estão ligados ao roubo de veículos, então, baixando esse indicador, cai também o número de roubos com morte — salienta Picon.
Contrapontos
O que diz a Cabify
A empresa reforça continuamente a sua preocupação com a segurança dos motoristas parceiros e passageiros e acredita que todos têm o direito de ir e vir em um ambiente seguro. A empresa investe e desenvolve constantemente em tecnologias para a ampliação da segurança dos seus usuários, como a remoção de possíveis áreas de risco do mapa de atuação e também registra e monitora as informações sobre todas as etapas da viagem (solicitação, aceitação do motorista parceiro, finalização da corrida e pagamento), inclusive por GPS. Com esses e outros dados, e respeitando o Marco Civil da Internet, é possível oferecer suporte e informações, inclusive para as autoridades.
Em relação à liberação do meio de pagamento em dinheiro, foram estabelecidos processos rigorosos de segurança para esse novo recurso. A nova funcionalidade oferece uma configuração de segurança, na qual o condutor tem a opção de habilitar ou desabilitar o recurso, escolhendo sua preferência em relação ao método a ser pago, garantindo a comodidade e segurança ao motorista parceiro. Além disso a empresa mapeou, junto com as prefeituras, horários e locais de risco nos quais a funcionalidade não estará habilitada. A Cabify é o único aplicativo no Brasil a ter esse cuidado (opção de dinheiro somente em locais e horários de menos risco.
Nos casos de situações de risco, a empresa orienta o contato imediato com a Central de Atendimento, que está disponível 24 horas nos 7 dias de semana, para análise do caso considerando o direito de defesa das duas partes mediante prova. Se houver comprovação de um ato de violência e/ou recorrência do motorista parceiro em determinada atitude, ele é automaticamente cortado da base da Cabify.
A Cabify também possui um botão de segurança, recurso que permite que os usuários possam entrar em contato direto com as autoridades policiais locais ao clicar no botão de SOS - localizado no canto superior da tela do aplicativo - disponível em toda corrida. A empresa promove, ainda, palestras informativas com dicas de atendimento de qualidade e de segurança.
A Uber também se manifestou por nota:
A Uber entende que o levantamento apresentado pela Zero Hora contém lacunas importantes e falhas metodológicas que não permitem a verificação dos dados e induzem a conclusões equivocadas. Destacamos os seguintes pontos: A reportagem compartilhou hoje (sexta, 19/7) com a empresa os números citados. Todavia, foram não foram fornecidos quaisquer dados sobre as ocorrências (como nomes, placas, data, local e horário) que permitam identificar veículos ou indivíduos e verificar se as ocorrências mencionadas têm de fato alguma relação com o aplicativo da Uber em si. Ainda que houvesse dados que permitissem a verificação, não foi concedido pelo veículo um tempo minimamente razoável para que a empresa pudesse checar. Os números gerais foram fornecidos na sexta às 12h14, pedindo-se um posicionamento para o mesmo dia. A reportagem foi publicada às 15h15. O pedido da reportagem não detalhou a metodologia utilizada no levantamento. Questionada, explicou que o trabalho teria sido feito com base em declarações das próprias vítimas, que teriam dito à polícia serem motoristas utilizando o aplicativo e que estariam em viagem no momento dos crimes. Informou também que estaria com os boletins de ocorrência, que não foram compartilhados com a empresa para verificar se os supostos motoristas estavam cadastrados no sistema. Ainda que tivessem sido fornecidos os documentos, simplesmente reunir todos os boletins que tenham a palavra "Uber" em algum dos campos não significa que o incidente tenha ocorrido com o aplicativo ou envolvendo motorista e/ou usuário, por inúmeras razões, por exemplo: Como afirma a própria nota enviada pela Secretaria de Segurança Pública: "Dessa forma, os dados no arquivo que você consultou não possuem a robustez necessária para realizar qualquer tipo de inferência ou conclusão definitiva, ou mesmo indicativa, acerca do tema. A demanda 22.389 apresenta 2.683 ocorrências que atenderam aos requisitos de extração delimitados, e a leitura apenas do histórico da ocorrência pode gerar interpretações diversas, conforme critério subjetivo de cada leitor, sem necessariamente ir ao encontro das conclusões obtidas ao final da investigação policial — trata-se apenas da interpretação do solicitante. Cabe destacar ainda que boa parte das ocorrências listadas possuem as palavras chave que você indicou sem que elas tenham relação direta com o ocorrido ou seu desfecho. Exemplo hipotético: um cidadão que tenha sido vítima de roubo a pedestre, mas que, no relato da ocorrência, informe ter utilizado um transporte por aplicativos para chegar até um destino, tendo sido vítima do roubo apenas depois disso. Mesmo que o crime não tenha qualquer relação com o transporte por aplicativos, por constar no relato uma das palavras-chave listada por você, essa ocorrência estará na planilha." O termo "Uber" passou a ser utilizado muitas vezes como sinônimo de toda a categoria de aplicativo de mobilidade - e também frequentemente para designar outros aplicativos. Graças à popularização do aplicativo e das oportunidades de geração de renda que ele oferece, "motorista de Uber" passou a ser comumente designado como profissão, ainda que a pessoa dirija também para outros aplicativos ou possua outra ocupação como principal - lembrando que grande parte dos motoristas parceiros dirigem menos de 10 horas por semana. Quando eles sofrem com a violência urbana que assola nossa sociedade, mesmo que nem estejam ao volante, o nome do aplicativo aparece como se fosse a profissão ou estivesse ligado de alguma forma à ocorrência. Boletins de Ocorrência são apenas o documento que dá início à investigação. Portanto, alguém afirmar no BO que atua como motorista de aplicativo não é suficiente para assumir que isso é um fato, nem que estava atuando utilizando um aplicativo qualquer no momento da ocorrência. Ou seja, não há qualquer base metodológica para vincular os dados levantados ao número de ocorrências no aplicativo. Sabemos que infelizmente, a violência permeia a vida das cidades e afeta cidadãos que querem apenas se deslocar e trabalhar. Desde que chegou ao Brasil, o número total de viagens realizadas com a Uber no País já ultrapassa 2,6 bilhões. Porto Alegre aparece regularmente entre as cinco cidades com mais viagens no País. A despeito desse volume, segurança é uma prioridade para a Uber e toda ocorrência que impacte motoristas parceiros ou usuários é levada muito a sério. Por isso, a Uber sempre busca aprimorar sua tecnologia para fazer da plataforma a mais segura possível. Todas as viagens via aplicativo da Uber são registradas por GPS. Os aplicativos de usuários e motoristas parceiros contam com recurso para compartilhar a localização, o trajeto e o tempo de chegada em tempo real com quem desejar. Além disso, é possível ligar para a polícia em situações de risco ou emergência diretamente do app. A empresa também adota no Brasil o machine learning, que usa a tecnologia para bloquear viagens consideradas mais arriscadas. Desde maio, a pedido dos motoristas da região Sul, é possível ver o destino final da próxima rota, bem como se o usuário fez poucas viagens no aplicativo. O aplicativo exige do usuário que quiser pagar somente em dinheiro que insira o CPF e data de nascimento para confirmar sua identificação. Como anunciado recentemente, os dados dos usuários passaram a ser checados com o Serasa. No caso do motorista, os dados são validados junto à base de dados do Denatran. Em novembro passado, a Uber anunciou um compromisso público para enfrentamento à violência contra a mulher no Brasil, materializado no investimento de R$ 1,55 milhão até 2020 em projetos elaborados ao longo dos últimos 18 meses em parceria com dez entidades que são referência no assunto. Desde então foram desenvolvidos recursos para identificar mensagens impróprias e eliminar do histórico os pontos exatos de embarque e desembarque, além de campanhas contra assédio e podcast sobre violência contra a mulher, entre outras ações.
A 99 também enviou nota:
A maior prioridade da 99 é promover viagens seguras tanto para motoristas quanto passageiros. A 99 atua na prevenção, proteção e atendimento de passageiros e motoristas e dispõe de inteligência artificial que monitora padrões de comportamento de usuários na plataforma e alerta quanto a existência de áreas de risco. Além disso, a 99 realiza cadastramento rigoroso de usuários, treina e orienta os motoristas em procedimentos para situações com ameaça potencial e mantem à disposição de todos os usuários uma central de atendimento exclusivo de segurança, que funciona 24 horas, 7 dias por semana para responder e orientar prontamente sobre emergências. Adicionalmente, temos um botão de emergência que aciona automaticamente a polícia e equipe especializada em nossa central; permitimos aos usuários adicionar e telefonar para contatos de confiança, além de compartilhar sua rota em tempo real; e uma ferramenta que mapeia e trata comentários impróprios que caracterizam assédio sexual e prioriza atendimento às vítimas e bloqueio de usuários que cometam tal prática. Os motoristas reclamam que as áreas de risco apontadas no app diminuíram. Além disso, reclamam do limitado número de câmeras instalados nos carros, que favoreceu motoristas premium. O que a empresa está fazendo para atender essas exigências e qual a possibilidade de alguma delas sair do papel? A 99 investe continuamente para prevenir ocorrências e entende que o mapeamento das áreas de risco é um recurso eficiente para que motoristas tomem decisões diariamente. Tais áreas são mapeadas de forma dinâmica, por meio de estatísticas do app, além de dados das Secretarias de Segurança Públicas. O número de áreas de risco mapeadas não diminuiu em Porto Alegre. Atualmente, são cerca de 40 áreas identificadas e reportadas com potencial risco e esse número se mantém estável desde o ano passado, mesmo com a mudança dinâmica de localidades. Ainda para proteger motoristas, bloqueamos chamadas de passageiros que não correspondam aos critérios de usuário seguro e informamos o destino da viagem ao condutor antes que seja aceita. Quanto às câmeras de segurança, iniciamos a sua implantação no fim de 2018 e seguimos em fase de testes e expansão. Essa tecnologia beneficia igualmente a segurança de motoristas e passageiros, e estamos trabalhando para que alcance o maior número de motoristas possível.