Quatro dias antes de completarem-se cinco meses do desaparecimento de Sandra Mara Trentin, 49 anos, o vereador Paulo Ivan Baptista Landfeldt, acusado de planejar o rapto e morte da esposa foi solto pela Justiça, após a segunda audiência ocorrida em Palmeira das Missões. Landfeldt saiu do Complexo Penitenciário de Canoas às 19h30min de terça-feira (26) e retornou para Boa Vista das Missões, no norte do Estado.
Quatro meses após a prisão dos réus e duas audiências depois, o juiz João Garcez de Moraes Neto ordenou a soltura de Landfeldt por considerar que seria uma "antecipação da condenação". O promotor de Justiça Marcos Eduardo Rauber estuda formas para recorrer da soltura do acusado.
As versões contraditórias nos depoimentos de testemunhas e do réu Ismael Bonetto contribuíram para a decisão do juiz. O magistrado cita, no despacho, o fato de que Bonetto incriminou o marido da contadora, Paulo Landfeldt, no primeiro depoimento, mas, em uma segunda versão, ele afirmou que somente havia extorquido o vereador e que ambos não tinham participação no desaparecimento de Sandra.
Contradições em depoimentos
Outras duas pessoas, que participaram das audiências como informante e testemunha, deram depoimentos que sugerem interpretações diferentes do caso. A informante disse que Ismael Bonetto procurou Landfeldt com um nome falso, apresentando-se como membro de facção criminosa e afirmando que estava envolvido no sequestro de Sandra. Ela também disse que encontrou o vereador chorando, abalado com o desaparecimento da esposa. De acordo com a informante, Landfeldt afirmou que o casal estava em um bom momento do relacionamento e que uma viagem recente à praia havia sido "a melhor da família".
Um homem chamado Cristiano, testemunha do caso, se contradisse durante o depoimento. Ao Ministério Público, ele afirmou que viu um homem branco, de cabelo crespo - semelhante a Landfeldt - com Ismael. Pouco depois, afirmou que o homem era loiro, descrição que não bate com o perfil do marido da contadora.
Execução antecipada da pena
De acordo com o juiz, a manutenção da prisão do vereador, que não possui antecedentes criminais e tem emprego e residência fixos, seria como uma antecipação da condenação. O "clamor do caso" não seria suficiente para a interrupção da liberdade de Landfeldt, já que as provas são obscuras e o caso ainda não foi encerrado, nas palavras dele.
Dessa forma, o entendimento do magistrado foi pela aplicação de medidas cautelares, entre as quais estão: impossibilidade de contato com testemunhas e parentes da vítima, incluindo os filhos, necessidade de informar endereço e o comparecimento do réu em outras audiências.
"Ele está bastante abalado", diz advogado de Landfeldt
Assim como a Justiça de Palmeira das Missões, a defesa entende que as provas não são suficientes para incriminar o marido de Sandra. Segundo o advogado Breno Ferigollo, o casal mantinha um bom relacionamento, apesar dos boatos de que o vereador mantinha um caso extraconjugal.
— Em uma cidade de mais ou menos 2,5 mil pessoas, não encontraram até agora quem seria a amante dele (Landfeldt). Ele agora está se resguardando, bastante abalado com a situação de culpa que colocaram nele — explica.
O advogado também acredita que a contadora esteja viva. Ele ressalta que, não havendo corpo, não se pode confirmar a morte.
— Não posso desacreditar que há um crime, cometido por outra pessoa, mas ela ainda pode estar viva, o que seria muito positivo para a família — afirma.
Outro argumento usado pela defesa é que a polícia teria operado de forma "comprometedora" nas investigações para comprovar a conduta de Ismael e Paulo no crime. De acordo com Ferigollo, durante as investigações foram aceitas versões múltiplas dos fatos, sendo destacadas apenas aquelas que comprometessem Landfeldt.
O que diz o Ministério Público
O Ministério Público tem a convicção de que as provas anteriores à soltura do marido de Sandra, assim como os depoimentos atuais, permanecem válidos para que o acusado continue preso. Sobre a falta de materialidade do crime — a ausência do corpo da contadora para a comprovação do homicídio —, o MP não considera que isso invalide a denúncia.
De acordo com a Promotoria, o fato de ela não ter demonstrado em nenhum momento o desejo de se ausentar, assim como o comprometimento dela com os filhos e a atividade profissional e o depoimento de amigos e familiares, seria indício de que ela estaria morta. Além disso, para dificultar as responsabilizações pelo crime, o seu cadáver estaria escondido.
A acusação revela duas mensagens apagadas do celular do vereador e posteriormente recuperadas, nas quais ele conversa com Ismael, responsabilizado pela execução do crime. Em uma das conversas, Landfeldt faz uma referência sobre a chegada da polícia. De acordo com os textos, eles teriam "apertado" as crianças em uma conversa. "Tinha vindo gente estranha falar comigo e elas se entregaram…, tudo minha casa cara, muito triste, me chamaram na Delegacia de tarde, me vi louco, mas não me entreguei", teria dito o vereador nas mensagens.
Em outra mensagem, o marido de Sandra diz a Ismael: "Vou acreditar em você, mas sinceramente acho que vou perder tudo que te dei, vou ter que trabalhar um ano para pagar mais, vou acreditar".
Conforme o Ministério Público, as mensagens foram trocadas antes de um depósito bancário feito ao suposto executor, comprovado no processo. O fato de ele apagar outras mensagens antes de procurar a polícia provaria a ligação entre ambos. Não foi possível recuperar esses textos com o réu.
Para a Promotoria, a reclusão dos réus é necessária — não somente pela repercussão na mídia e pelo fato ter ocorrido em um uma cidade pequena, mas pela gravidade dos delitos cometidos. Para o promotor, os réus são considerados "homens de alta periculosidade, desprovidos de quaisquer freios morais e de qualquer sentimento humanitário, que se preocupam com a impunidade e com as vantagens que possam obter".