Considerado uma fase de transição entre o período em que a mulher tem capacidade reprodutiva para quando já não produz mais estrogênio, o climatério representa uma parte inevitável da vida para toda a população feminina. Trata-se de uma longa etapa, sem início e fim bem definidos, que é vivenciada de forma diferente por cada pessoa. Há quem apresente sintomas intensos e precise de tratamento, por exemplo, enquanto uma minoria não é muito afetada.
De acordo com Maria Celeste Osorio Wender, coordenadora do Ambulatório de Climatério do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e vice-presidente da Associação Brasileira do Climatério (Sobrac), essa fase de transição tem início quando os níveis do hormônio da hipófise (FSH), que regula e sinaliza a produção hormonal ovariana, começam a se modificar — a partir dos 35 anos — e costuma terminar perto dos 65. Entretanto, existem casos de mulheres que permanecem por ainda mais tempo com sintomas do climatério.
A especialista também ressalta que climatério não é sinônimo de menopausa, definida como a última menstruação e habitualmente confirmada depois de 12 meses consecutivos sem a ocorrência de um período menstrual. A menopausa ocorre quando há uma redução muito significativa da capacidade dos ovários de produzir o estrogênio, em geral, depois dos 40 anos.
— A fertilidade da mulher vai reduzindo a partir dos 35 anos, devagarinho. Então, ocorrem dois fenômenos, o climatério e a perimenopausa, até o momento em que ela para totalmente de produzir o hormônio e de menstruar. A perimenopausa começa quando aparecem os primeiros sintomas, a menstruação atrasa, falha, depois vêm os calorões, e dura até um ano depois que ela para de menstruar — explica.
Dessa forma, pode-se dizer que a menopausa e a perimenopausa são eventos que ocorrem dentro do climatério, acrescenta Lucia Costa Paiva, vice-presidente da Comissão Nacional Especializada em Climatério da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo):
— A menopausa abaixo dos 40 anos não é normal, é precoce, e acima dos 55 é tardia. Não precisa fazer exames, podemos dizer que a mulher está na menopausa se ela estiver dentro dessa faixa etária e ficar 12 meses seguidos sem menstruar. Normalmente, já tem todos os sintomas clínicos também e isso é mais do que suficiente para o diagnóstico.
Não há uma idade estabelecida para o início do climatério, já que varia de acordo com cada mulher. Mas, normalmente, os sintomas podem começar a se manifestar dois ou três anos antes da menopausa.
— Essa transição é muito variável. Não dá para prever quando será a última menstruação. É imprevisível, porque há uma variação muito grande de idade. A chegada da menopausa ocorre quando se esgota a reserva de folículos que a mulher tem nos ovários e isso é estabelecido antes da criança nascer — destaca Lucia, que também é professora titular de Ginecologia e coordenadora do Ambulatório de Menopausa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Sintomas
Uma pequena parcela das mulheres climatéricas apresenta poucos sintomas. Na maioria dos casos, elas enfrentam manifestações clínicas que prejudicam sua qualidade de vida.
Os sintomas vasomotores são considerados o carro-chefe entre as reclamações, conforme Maria Celeste. Calorões e suores noturnos estão inclusos nesse grupo, muitas vezes associados à insônia, à perturbação no sono e às alterações no humor.
Não dá para prever quando será a última menstruação. É imprevisível, porque há uma variação muito grande de idade. A chegada da menopausa ocorre quando se esgota a reserva de folículos que a mulher tem nos ovários.
LUCIA COSTA PAIVA
Vice-presidente da Comissão Nacional Especializada em Climatério da Febrasgo
— Modificações no humor, mais ansiedade, irritabilidade, tristeza e labilidade emocional. Passa de um estado para outro muito rápido, sem um motivo específico para modificar o humor. Os fogachos (calorões), a perturbação do sono e as alterações de humor muitas vezes vêm juntas — afirma a médica do HCPA.
Com muita frequência, essas manifestações começam no período da perimenopausa e avançam gradualmente – são, portanto, os sinais mais precoces. Maria Celeste explica que, progressivamente, a falta do hormônio vai trazendo outros sintomas, como menos lubrificação e consequente secura vaginal, denominada síndrome geniturinária da menopausa:
— Isso é o que chamamos de secura vagina que, às vezes, também causa sintomas urinários. Os tecidos da vagina e da uretra têm a mesma origem embrionária, então, quando o estrogênio reduz, os tecidos reclamam. Pode dar ardência para urinar e infecções urinárias mais frequentes, mas a principal consequência é dor para ter relação sexual, então traz bastante prejuízo para a qualidade de vida da mulher.
Além disso, um terço das mulheres desenvolve osteoporose após a menopausa. De acordo com a especialista, isso ocorre porque os ossos também precisam do estrogênio e, com a redução do hormônio, eles podem começar a sofrer reabsorção. Caso essa tendência não seja detectada e tratada, pode evoluir para o problema de saúde, que gera um risco aumentado de fraturas.
O sexo e o impacto nos relacionamentos
A coordenadora do Ambulatório de Climatério do HCPA comenta que uma das queixas que ouve com frequência em seus atendimentos está relacionada aos impactos desse período nos relacionamentos conjugais. Contudo, ressalta que é difícil determinar se essa questão tem ligação direta com a menopausa ou apenas com o momento de vida da mulher e a qualidade de seu relacionamento.
— Há uma série de fatores que influenciam nisso. É sempre multifatorial — enfatiza Maria Celeste.
Lucia reforça que os problemas sexuais ou a disfunção sexual podem ocorrer em qualquer fase da vida da mulher e concorda que são causados por vários fatores, como questões físicas, psicológicas e relacionadas à convivência do casal.
— Na menopausa, isso tudo é agravado pelos problemas hormonais. A falta do estrogênio pode diminuir a libido e leva a esses problemas de ressecamento vaginal. Consequentemente, a mulher pode ter dor para ter relação sexual, o que impacta negativamente na vontade de ter relacionamento — aponta a vice-presidente da Comissão Nacional Especializada em Climatério.
Além disso, Lucia ressalta o fato de que, no geral, são relacionamentos longos e que os homens também podem ter disfunção erétil e diminuição do desejo sexual com o avanço da idade.
A professora cita ainda um trabalho feito na Unicamp, em que casais com idades entre 50 e 60 anos foram entrevistados com perguntas sobre a vida a dois. O resultado apontou proporções bem diferentes, com 45% das mulheres afirmando ter diminuição do desejo, contra 15% dos homens.
— Isso não quer dizer que está ruim para todo mundo — pondera. — Pode ser que a mulher fique bem com isso, mas, se tem alguma discordância entre o casal, aí tentamos ajudar com o tratamento.
Reposição hormonal não é para todas
Maria Celeste afirma que o tratamento mais clássico e que apresenta melhor resposta é a reposição hormonal. No entanto, ressalta que é preciso avaliar o histórico familiar, os hábitos de vida e as doenças prévias de cada paciente, para verificar se pode usar hormônio e qual tipo.
— O que determina a necessidade de repor hormônios ou não é a quantidade de sintomas da mulher. Daí ela tem que ser avaliada, para se chegar ao que tem de mais seguro e benéfico para ela. É algo bastante individualizado — diz a médica.
Quando bem indicado, o tratamento permite que a mulher fique praticamente assintomática, sem alterações de humor, problemas no sono e calorões. Mas a interrupção do uso dos medicamentos pode fazer com que os sintomas retornem – o tempo de tratamento também é definido de acordo com cada paciente.
— Como os sintomas vêm pela deficiência de estrogênio, a reposição melhora quase todos os sintomas. A terapia hormonal é feita através de um ou dos medicamentos. É o tratamento mais eficaz e efetivo para melhorar os sintomas e prevenir doenças — complementa Lucia.
Algumas mulheres, contudo, não podem usar hormônio. É o caso daquelas que fizeram tratamento contra o câncer de mama, por exemplo. Nessas situações, é necessário recorrer a outras alternativas.
— A terapia não hormonal vai verificar qual sintoma incomoda mais. Se é o humor, talvez se indique um antidepressivo, que também ajuda com as ondas de calor. Tem que usar diferentes medicações, porque não tem nenhum outro remédio que tenha essa abrangência da reposição hormonal — afirma a professora da Unicamp.
As especialistas apontam que existe uma medicação via oral aprovada em maio deste ano nos Estados Unidos específica para o alívio dos calorões. Chamada fezolinetant, a droga é destinada às mulheres que não podem ou não querem fazer a reposição hormonal e apresenta resultados efetivos e rápidos, mas, no Brasil, ainda não foi regulamentada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Maria Celeste e Lucia também concordam que hábitos saudáveis são muito importantes para que a mulher tenha melhor qualidade de vida durante o climatério. Isso inclui uma dieta balanceada e uma rotina de atividades físicas, evitando sedentarismo, sobrepeso e obesidade.
— Ter conhecimento a respeito da menopausa também é fundamental. Saber que nem todas as mulheres terão sintomas e que pode procurar ajuda com um ginecologista. Também tem que ter uma dieta apropriada para essa faixa etária, rica em cálcio, com pouca gordura animal e maior aporte de proteínas — recomenda Lucia, representante da Febrasgo.
A médica Maria Celeste, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, acrescenta:
— A mulher obesa em geral tem mais calorões e riscos cardíacos aumentados. E a preocupação com o coração na menopausa é bem grande. Sempre chamamos a atenção para a prevenção, para que a mulher aproveite o climatério para fazer um balanço da sua vida.