Enquanto os homens levam uma vida em “movimento retilíneo e uniforme, sem atrito e sem aceleração”, a vivência da mulher tem mais a ver com uma “montanha-russa de hormônios”. Essa é a trajetória que a atriz e comediante Angela Dippe, 61 anos, traz ao Porto Verão Alegre 2023, na palestra/espetáculo de humor Aos 60: Uma Aventura Hormonal da Puberdade à Menopausa. As sessões serão nos dias 10 e 11 de janeiro, às 20h, no Teatro Bruno Kiefer da Casa de Cultura Mario Quintana.
Antes, Angela conversa com Donna sobre as vivências que serão relatadas nesse espetáculo quase autobiográfico, revelando como foi quebrando seus próprios tabus com relação à menstruação, à menopausa, ao sexo e ao prazer após os 60 anos. O texto da gaúcha de São Borja fermentou ao longo de uma vida toda até culminar na estreia, em setembro de 2022, no Teatro Eva Herz (SP) – a primeira única apresentação até agora.
Por esse motivo, a atriz considera a passagem pela Capital uma nova estreia. E foi justamente aqui que sua carreira começou, aos 17, no grupo Choreo de dança contemporânea. Só alguns anos depois, já em São Paulo, que ela acabou pendendo para o teatro.
O que podemos esperar do espetáculo Aos 60?
Uma mistura de palestra, monólogo e stand-up em que falo da minha aventura hormonal da puberdade à menopausa, das questões femininas, das modificações que a mulher sofre, de tudo que a gente passa e do tratamento que é dado às mulheres na nossa sociedade patriarcal. Eu sou uma pessoa muito engraçada, vejo as coisas com humor e conto elas assim.
E qual foi a tua experiência com a menopausa?
Foi uma baciada de sintomas e eu me senti muito sozinha. Quando fui à ginecologista e ouvi a palavra “climatério”, para mim soou como “cemitério” porque parecia que eu ia morrer. Criei até um grupo de Facebook para trocar informações e ver o que minhas amigas tinham para me ensinar sobre a menopausa.
Foi aí que eu vi que faltava informação mesmo. Sofri com falta de informação, solidão e um certo desalento. Sem contar que esse tal grupo era secreto, mas a maioria ficava “não conta para ninguém”. Parecia que a gente era criminosa. Hoje em dia, não. Agora menopausa dá likes, dá seguidores.
Que contrastes tu percebeste a respeito de ser mulher em diferentes tempos?
Quando estou no set de filmagem com meninas de 18 anos, por exemplo, não é raro escutá-las falando para o cara que está colocando o microfone: “Hoje eu tô jorrando, tô com uma cólica fodid*” (risos). E eu sou de uma época em que menstruação era um grande tabu!
Quando eu fiquei menstruada, cheguei a pedir para a minha mãe não contar ao meu pai de jeito nenhum. Era muito diferente. Então acho que o mais interessante desse trabalho são as jovens mulheres que vão poder ver e sacar “que loucura, não podia falar disso” a respeito de coisas que hoje são tão naturais.
Um de teus vídeos no Instagram diz “Estou fazendo 61, mas preferia estar fazendo 69”. O humor ajuda a naturalizar o fato de que a mulher de 60 está interessada em sexo?
Ajuda a quebrar o preconceito. Meus trabalhos refletem muito sobre virar a tia do rolê, ficar invisível e ninguém mais te paquerar. Eu lembro da primeira vez que me chamaram de senhora. Estava na academia, vi um cara me olhando e achei que estava arrasando. Até que ele chegou e falou: “Posso revezar com a senhora?”.
Aquilo ficou na minha cabeça. Assim como ficou a lembrança do que meu pai disse quando me separei, aos 50: “esse era o último vagão, hein?”, do tipo, “acabou para você”. E, aí, aos 60, encontrei um grande amor que veio justamente quebrando aquela ideia de que “não acontece mais nada”.
Descobri que se você conseguir assumir “eu sou uma mulher assim, estou na menopausa e tenho mais questões para lidar mesmo”, você vai ter uma vida sexual ótima.