Disseminar bons hábitos alimentares é uma operação a ser planejada em grande escala, envolvendo muita gente. Uma campanha institucional pode mobilizar profissionais da saúde e da educação, personagens fundamentais. Esses, por sua vez, orientam as famílias quanto ao que deve estar no prato. As próprias crianças, quando aprendem, tornam-se multiplicadoras de conhecimento, sendo capazes, inclusive, de ajudar os adultos a entrar na linha.
A endocrinologista Zuleika Halpern, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), orienta que o cardápio deve ser o mais correto possível, pelo menos até os seis anos de idade. É fundamental evitar itens industrializados.
— A comida deve ser tipo a dos nossos avós. Sem fritura, milanesa, empanados. Nada de doces ou biscoitos, isso não é necessário. Quando uma criança come um pacote de bolacha, ela deixa de fazer uma refeição saudável — diz a médica.
A comida deve ser saborosa, atraente ao paladar, bem temperada com ingredientes naturais, como alho e cebola. Mais típica das combinações da culinária nacional, o arroz com feijão, define Zuleika, é uma dupla maravilhosa. Não há problema algum em usar um pouco de óleo no preparo. Cabe aos pais oferecer legumes e saladas e uma opção de proteína (gado, peixe, frango ou ovo). E o mais importante: é dos adultos que parte o melhor dos exemplos.
— Não adianta querer forçar a criança a comer uma coisa que os pais não comem – comenta a endocrinologista.
Durante as refeições, TV desligada, celular desligado. É sentar para comer e conversar. Comer na frente da TV é crime. A criança come o dobro do que deveria e não presta atenção no que está comendo.
ZULEIKA HALPERN
Endocrinologista
Presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), o endocrinologista Mário Kehdi Carra reforça esse discurso: se os pais têm uma boa alimentação, é muito provável que os filhos sigam no mesmo caminho. Sempre que possível, o horário das refeições deve ser respeitado como um momento a ser desfrutado em família, com concentração – nada de desviar a atenção do pequeno com um joguinho no celular para aproveitar e lhe enfiar uma colherada de purê sem que ele se dê conta do que está ingerindo.
— Durante as refeições, TV desligada, celular desligado. É sentar para comer e conversar — ensina Zuleika. — Comer na frente da TV é crime. A criança come o dobro do que deveria e não presta atenção no que está comendo. Se ela quiser ver desenho, tudo bem, mas que seja antes ou depois de se alimentar — acrescenta.
Quanto ao uso de celulares, tablets, computadores e videogames, Carra recomenda que se restrinja a menos de duas horas diárias. A criança tem de ser estimulada a brincar na rua, correr, jogar bola, gastar energia. Dormir cedo também é um hábito aliado da manutenção de uma rotina benéfica: a produção de hormônios ligados ao controle de peso aumenta durante o sono.
O mito dos bebês "fofinhos"
Comer direito não significa vetar escapadas. As crianças podem, sim, comer doces em um aniversário, por exemplo, mas sempre com moderação.
— Cuidado com as avós, que são as maiores boicotadoras — diverte-se Zuleika. — Nada é proibido. O importante é melhorar a qualidade da alimentação e eliminar o que é ruim no dia a dia, para se criar consciência.
Uma ideia ainda muito presente é a de exaltar bebês “fofinhos”. Criança magra continua sendo associada a doença. Mas manter o peso adequado desde os primeiros meses é uma medida efetiva para a prevenção de enfermidades típicas de adultos ainda na infância. Crianças obesas estão mais expostas ao risco de diabetes, hipertensão, problemas ósseos e articulares.
A puberdade pode ser antecipada e, mais adiante, a fertilidade pode diminuir. Na vida adulta, o risco de câncer e doenças cardíacas também aumenta.
— Ao emagrecer ou não engordar, você estará se protegendo de vários problemas de saúde — garante o médico Carra.
11 dicas para uma alimentação saudável
- Aleitamento materno exclusivo durante os seis primeiros meses e complementar até os dois anos ou mais.
- Introduzir alimentos in natura ou minimamente processados na alimentação do bebê a partir dos seis meses.
- Preferir sempre água em vez de bebidas adoçadas.
- Crianças de até dois anos não devem ingerir açúcar.
- Evitar alimentos ultraprocessados.
- A mesma comida devem ser servida a pais e filhos. Crianças não precisam ter um cardápio à parte.
- Respeitar o horário das refeições. São momentos para a reunião e a interação da família.
- Prestar atenção aos sinais de fome e saciedade, evitando-se a ingestão extra e desnecessária de calorias. Conversar com a criança durante a refeição.
- Cuidar da higiene em todas as etapas do preparo. Alimentos não corretamente limpos ou armazenados, utensílios sujos, insetos e as próprias pessoas podem ser fontes de contaminação.
- A boa alimentação precisa ser mantida também fora de casa.
- Na medida do possível, proteger a criança da publicidade de alimentos.