Eduardo Rigon Zimmer, 39 anos, será um dos seis pesquisadores homenageados com prêmios científicos na edição deste ano da Conferência Internacional da Alzheimer’s Association – maior organização mundial dedicada ao tratamento, suporte e pesquisa da doença de Alzheimer e outras demências. A entrega dos prêmios acontecerá nesta segunda-feira (29) na Filadélfia, nos Estados Unidos, que é o maior encontro mundial de especialistas da área.
As premiações reconhecem pesquisadores por sua variada experiência, realizações notáveis e contribuições inovadoras para o campo. O gaúcho receberá o Blas Frangione Early Career Achievement Award de 2024. O prêmio é concedido a pesquisadores em início de carreira cuja pesquisa de ponta em Alzheimer e demência tenha o potencial de impactar o campo ao impulsioná-lo em novas direções.
Zimmer é graduado em Farmácia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e tem mestrado e doutorado em Bioquímica pela UFRGS. É professor adjunto na UFRGS, professor adjunto no McGill Centre for Studies in Aging, no Canadá, e pesquisador associado no Instituto do Cérebro. É membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências. Tem experiência em pesquisa experimental e clínica nas áreas de neuroquímica e neuroimagem. Já recebeu diversos prêmios, incluindo o de Melhor Tese de Doutorado Brasileira (2016) e o Prêmio Alzheimer’s Association International Conference (AAIC) Neuroscience Next ‘One-to-Watch’ (2021).
Em entrevista a Zero Hora, Zimmer recordou que, quando retornou ao Brasil após um período de estudos no Canadá, pesquisadores do Norte global afirmavam que não havia como produzir pesquisas de qualidade no Brasil. Movido pelo sentimento de que era preciso permanecer em sua terra natal, o gaúcho voltou para concluir o doutorado, iniciar o pós-doutorado e dar continuidade ao treinamento de alunos – mesmo sem financiamento.
O professor da UFRGS fundou, em 2018, o Zimmer Lab, um laboratório de pesquisas do qual é coordenador. O grupo estuda a neurodegeneração, característica mais clássica de doenças como o Alzheimer, buscando entender, por meio de estudos experimentais e clínicos, por que o cérebro se degenera de diversas maneiras. Com a criatividade dos alunos e a orientação do professor, o laboratório prosperou. Atualmente, há 38 membros no grupo, sendo quase 30 alunos de mestrado, doutorado e pós-doutorado, financiados por agências internacionais, com trabalhos publicados em jornais de alto impacto e premiados.
— Quando eu paro para fazer uma reflexão, é isso que me vem à cabeça: estamos conseguindo mudar o status quo na área, mostrando que fazer pesquisa no Brasil pode ter grande impacto internacional — ressalta.
Do mesmo modo, o fato de um brasileiro receber o prêmio – considerado o mais importante no campo do Alzheimer para jovens pesquisadores – é um feito excepcional e difícil de digerir, dada a grande concorrência, conforme o professor.
— Estou muito honrado de estar representando o Brasil, de estar representando Porto Alegre. Muitas vezes, a gente fala de Brasil, e as pessoas pensam em São Paulo e Rio de Janeiro. Eu sempre falo: eu sou da capital do Estado mais ao sul do Brasil, Porto Alegre — orgulha-se.
A descoberta
As pesquisas de Zimmer concentram-se em entender as origens celulares do Alzheimer, com interesse particular em neuroimagem, metabolismo energético cerebral e astrócitos (células menos conhecidas que acompanham os neurônios). A principal descoberta é a demonstração de que a ativação ou desativação de astrócitos em roedores pode alterar o sinal exame de PET-Scan cerebral – um exame de imagem usado há décadas como um biomarcador de neurodegeneração em rotina clínica.
Desta maneira, o resultado do exame pode não mostrar apenas neurônios, e sim a contribuição de outras células – levantando dúvidas sobre a interpretação do problema mostrado e levando a uma reconceitualização do exame.
— O exame de um indivíduo que tem uma doença tem uma assinatura visual, um formato diferente. A gente consegue ver o cérebro mais apagado. Todo mundo achava que isso era porque os neurônios estavam morrendo. A gente conseguiu mostrar que não. Se a gente alterar a atividade desses astrócitos, o resultado do exame também muda. Então, pode ser que o que a gente esteja vendo não seja o neurônio morrendo. Pode ser só que o astrócito esteja com a atividade alterada — explica.
Os astrócitos são células altamente prevalentes no cérebro, segundo o professor – há mais astrócitos do que neurônios na região cortical, a região mais especializada do cérebro humano.
Novas pesquisas pela frente
O laboratório tem diversos projetos aprovados a serem desenvolvidos. Após os 40 anos, o cérebro humano começa a reduzir de tamanho, com perda de massa e atrofia – perde-se 5% a cada 10 anos. Acreditava-se que isso acontecia porque os neurônios morriam com o envelhecimento. Os estudos atuais, porém, mostram que os neurônios não morrem ao longo do envelhecimento (em casos de envelhecimento saudável).
— O que está acontecendo no cérebro? A gente acha que os astrócitos estão reduzindo de tamanho. E não tem célula morrendo — afirma. — A gente tem um idoso que está perdendo memória, está com dificuldade de lembrar das coisas. Mas não morreu nenhuma célula. Quer dizer que a memória está lá ainda. A gente só precisa descobrir uma maneira de reativar essa memória. Se a gente reativar, a pessoa volta a ter a cognição que ela tinha aos 40 anos.
O projeto foi selecionado pelo Instituto Serrapilheira para receber um financiamento de R$ 700 mil para investigar a hipótese de que, ao reduzir o tamanho dos astrócitos, o volume do cérebro também reduz – e tentar entender se há como reverter.
Além dessa pesquisa, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) doou à UFRGS um equipamento de R$ 1,5 milhão, capaz de realizar exames de sangue para avaliar o funcionamento do cérebro. Ele será utilizado em um projeto em parceria com o Ministério da Saúde para tentar desenvolver um exame de sangue que seja capaz de identificar se um indivíduo tem risco de desenvolver a doença de Alzheimer. Esse tipo de exame já está disponível em alguns locais, inclusive no Brasil, mas não foi validado para a população brasileira. O estudo busca, justamente, realizar essa validação. A pesquisa deve ser iniciada até o fim do ano.
Pesquisadores homenageados
Os outros pesquisadores que serão premiados na Conferência Internacional da Alzheimer’s Association são: Ralph A. Nixon, o brasileiro Ricardo Nitrini e Goldie S. Byrd, que receberão os AAIC Lifetime Achievement Awards; Steven T. DeKosky, no Bill Thies Award for Distinguished Service to the International Society to Advance Alzheimer’s Research and Treatment; e Tara Spires-Jones, no Inge Grundke-Iqbal Award for Alzheimer's Research.