O janeiro vegano, que propõe que as pessoas passem um mês sem consumir alimentos de origem animal, despertou a dúvida sobre qual a dieta ideal para a saúde. Afinal, existe uma mais indicada? A discussão é ainda mais forte neste momento em que um ano se inicia, quando muitas pessoas planejam uma guinada na alimentação. Quando se busca um profissional que auxilie nessa reeducação, a dúvida sobre o caminho mais saudável costuma chegar aos consultórios.
A dieta mais praticada pela população mundial é a onívora, que permite o consumo de alimentos de origem vegetal e animal, sem restrições. No entanto, as pessoas passaram a ingerir mais alimentos ricos em calorias, gorduras, açúcares livres — adicionados aos alimentos ou bebidas pelos fabricantes ou cozinheiros — e sal, diminuindo o consumo de frutas e fibras.
Com o passar do tempo, foram criadas alternativas para compor uma alimentação com menor riscos de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), entre elas diabetes, doenças cardiovasculares, AVC e câncer. Uma delas é o vegetarianismo, que exclui o consumo de carne, peixe e aves, mas inclui no cardápio outros produtos de origem animal, como laticínios ou ovos. Na avaliação da nutricionista Crisitiane Parizotti, a dieta vegetariana pode oferecer equilíbrio.
— Segundo o último parecer técnico do Conselho Federal de Nutrição, individualmente, todas as dietas vegetarianas podem suprir os nutrientes que precisamos em qualquer momento do ciclo de vida. Para isso, é necessário que a dieta seja bem planejada — afirma a profissional especializada em nutrição esportiva e vegetariana.
Segundo Cristiane, o cuidado especial é em relação à vitamina B12, que precisa ser suplementada. Cápsulas, comprimidos ou gotas podem ser utilizados, já que a B12 é encontrada em produtos como carne, ovos e leite.
— Importante frisar isso porque muitas pessoas associam vitamina B12 com origem animal. A origem da suplementação é de micro-organismos, não de origem animal. Na verdade, até mesmo os animais adquirem B12 desses micro-organismos — esclarece.
Para ela, a dieta mais saudável é uma desenvolvida por 37 cientistas de diferentes países e áreas de estudos, ligados à alimentação e produção de alimentos.
— É uma proposta chamada Eat-Lancet, baseada em plantas e alimentos in natura de origem vegetal que orienta a menor quantidade possível de alimentos de origem animal, caso haja o consumo. Eles são bem específicos em orientar: redução de 50% do consumo de açúcar e carnes vermelhas, principalmente, e dobrar o consumo de frutas, vegetais, legumes e oleaginosas (nozes, sementes, castanhas como do Pará, caju, avelã, pistache, amêndoas).
O veganismo
Uma dieta mais restrita que a vegetariana, o veganismo vai além da alimentação. Seus adeptos têm a preocupação de não consumir outras formas de exploração animal, como o uso do couro, lã, produtos de higiene, marcas que testam em animais e entretenimento com animais, por exemplo.
— O vegano tem um posicionamento ético e político em relação aos animais humanos e não humanos — salienta Cristiane.
Recentemente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) destacou os benefícios do veganismo pela associação à melhora na saúde cardiovascular, diminuição do risco de desenvolvimento de condições de saúde como câncer colorretal, obesidade e diabetes.
Outro benefício da dieta vegana foi publicada em uma pesquisa de julho de 2023 pela revista inglesa Nature Food. Um estudo apontou que este tipo de prática gera 75% menos emissões de gases de efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento do planeta. No entanto, a dieta vegana pode não ser saudável, caso seja rica em carboidratos e alimentos ultraprocessados, como explica a presidente de Associação Gaúcha de Nutrição (Agan), Lisete Griebeler Souza.
— A indústria de alimentos viu neste padrão alimentar uma boa oportunidade para promover muitos produtos que contêm corantes, saborizantes, aromatizantes. Tem que ter cuidado para não basear toda uma alimentação em busca da proteína à base de soja e nos ultraprocessados.
Lisete pontua que uma dieta pode ser ou não saudável, independente de ser onívora, vegetariana ou vegana.
— Se for mal planejada, pode ser prejudicial à saúde e levar deficiências nutricionais. Se for baseada em alimentos in natura minimamente processados, que inclua frutas e verduras, como é recomendado no Guia Alimentar para a População Brasileira, será uma dieta saudável, incluindo carne ou não — explica a nutricionista da Agan.
Dieta patrimônio
Para o presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), o nutrólogo e endocrinologista Durval Ribas Filho, não existe a dieta ideal para todos. Isso porque algumas pessoas podem ter alergias ou intolerâncias em relação a determinados nutrientes.
— A que mais contribui com o não desenvolvimento de doenças é a chamada dieta do Mediterrâneo, uma das mais pesquisadas no mundo — afirma.
Ao perceberem a alta expectativa de vida e baixo índice de distúrbios crônicos na região banhada pelo Mar Mediterrâneo, que inclui o sul da Espanha e da França, além de Itália e Grécia, cientistas começaram a pesquisar as práticas locais.
— A dieta é formada por 300 a 400 gramas de vegetais, frutas e verduras por dia, azeite de oliva, eventualmente vinho tinto. Não se exagera no sal e no açúcar, além de sobremesa à base de frutas e um bom uso de oleaginosas.
A carne vermelha pode aparecer, ainda que raramente, e leites e queijos são permitidos com moderação. Desde 2010, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) reconhece a na dieta mediterrânea como patrimônio cultural imaterial da humanidade.
Para a OMS, uma dieta saudável para adultos inclui:
- Frutas, verduras, legumes (como lentilha e feijão), nozes e cereais integrais (como milho, aveia, trigo e arroz integral)
- Pelo menos 400 gramas (o equivalente a cinco porções) de frutas e vegetais por dia, exceto batata, batata-doce, mandioca e outros tubérculos
- Menos de 10% da ingestão calórica total de açúcares livres (adicionados aos alimentos ou bebidas pelos fabricantes, cozinheiros ou consumidores, bem como os açúcares naturalmente presentes no mel, xaropes, sucos de frutas e concentrados de sucos de fruta). Equivale a 50 gramas (ou cerca de 12 colheres de chá) para uma pessoa com peso corporal saudável e que consome cerca de 2 mil calorias por dia. Idealmente, o consumo deve ser inferior a 5% da ingestão calórica total para benefícios adicionais à saúde
- Menos de 30% da ingestão calórica diária procedente de gorduras. As não saturadas (presentes em peixes, abacate e nozes, bem como nos azeites de girassol, soja, canola e azeite) são preferíveis às gorduras saturadas (carnes, manteiga, óleo de palma e coco, creme, queijo e banha) e às gorduras trans de todos os tipos, principalmente as produzidas industrialmente (alimentos assados e fritos, lanches e alimentos pré-embalados, como pizzas congeladas, tortas, biscoitos, bolachas, óleos e cremes)
- Do mesmo modo, as gorduras não saturadas são mais indicadas do que as encontradas em carnes e laticínios de animais ruminantes, como vacas, ovelhas, cabras e camelos. Sugere-se que a ingestão de gorduras saturadas seja reduzida a menos de 10% da ingestão calórica total e das gorduras trans, a menos de 1%
- Menos de 5 gramas de sal por dia, o equivalente a cerca de uma colher de chá. O sal deve ser iodado
Para bebês e crianças pequenas, uma dieta saudável, segundo a OMS, inclui:
- Nos primeiros dois anos de vida de uma criança, a nutrição ideal promove o crescimento saudável e melhora o desenvolvimento cognitivo. Também reduz o risco de obesidade e sobrepeso, bem como evita o desenvolvimento de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) mais tarde na vida.
- Bebês devem se alimentar exclusivamente de leite materno durante os seis primeiros meses de vida. Devem ser amamentados continuamente até os dois anos de idade ou mais.
- A partir dos seis meses, o aleitamento materno deve ser complementado com diferentes alimentos seguros e nutritivos. Não é recomendado adicionar sal ou açúcar a esses alimentos.