A colombiana Laura Zúñiga deu à luz duas crianças que hoje crescem no exterior com outros pais, que pagaram para "alugar" seu útero – uma prática cada vez mais frequente na Colômbia e que os congressistas tentam regulamentar.
"Olá, gostaria de alugar minha barriga, recebo metade do pagamento quando o teste (de gravidez) der positivo, a outra metade quando nascer", dizem os anúncios em grupos do Facebook, como o publicado em 2019 por Zúñiga.
— Sou doadora de órgãos, doadora de sangue. E, bem, eu disse: Não quero ter mais filhos para mim, mas seria bom colaborar com outra pessoa para fazer o processo — explicou esta auxiliar de enfermagem à AFP.
Um americano solteiro viu o anúncio, pagou U$ 15.000 (R$ 72,7 mil) e, nove meses depois, tornou-se pai por meio de uma chamada gravidez de aluguel. Zúñiga, 40 anos, repetiu a experiência em 2022 para um cliente suíço e recebeu o mesmo valor, em um país onde o salário mínimo gira em torno de US$ 250 (R$ 1.212,80).
Longe das proibições na Europa e das altas taxas em alguns Estados americanos onde o procedimento é legal, a Colômbia é um paraíso para a barriga de aluguel, devido aos baixos custos e a uma lacuna na legislação.
O procedimento está regulamentado em dois Estados do México, assim como em Cuba, Uruguai e Brasil. No entanto, nenhuma lei regula o procedimento na Colômbia, que atrai solteiros, casais com problemas de fertilidade, homossexuais e quem, por motivos estéticos ou de trabalho, não quer se submeter aos rigores de uma gravidez. No Congresso, parlamentares da bancada governista desaprovam a chegada de estrangeiros ao país para depois levarem os bebês embora.
— Muitas pessoas temem que a Colômbia possa se tornar uma fábrica de crianças — explicou o congressista de esquerda Alejandro Ocampo, que elaborou um projeto de lei para regulamentar os pagamentos e exigir que pelo menos um dos pais, que irão alugar o útero, seja de origem colombiana.
Enquanto é previsto que o projeto de Ocampo seja discutido na legislatura, iniciada em 20 de julho, o Ministério da Saúde trabalha em paralelo em outra proposta legislativa. Na Colômbia, não há números oficiais de crianças nascidas por meio de barriga de aluguel.
Mercado
Na Colômbia, existem profissionais mais experientes neste tipo de procedimento em relação ao restante da América Latina, afirma a ginecologista Karin Franco, dona de uma clínica especializada em Bogotá, capital do país. Ela observa um aumento na demanda após a invasão russa da Ucrânia, em fevereiro do ano passado, já que o país era o destino favorito dos europeus em busca de mães de aluguel.
Além disso, ela conta que o mercado colombiano oferece taxas melhores do que as dos Estados Unidos, onde o preço pode ultrapassar os US$ 100 mil (R$ 485,1 mil). As colombianas costumam decidir colocar o útero para aluguel pela falta de dinheiro.
— Normalmente são mulheres de baixa renda e então vão receber cerca de 40 ou 50 milhões de pesos (em torno de U$ 10.000, ou R$ 48.5 mil) — destaca a especialista.
Aproximadamente 12 clínicas na capital colombiana oferecem serviços de reprodução assistida, da fertilização até o parto. Na maioria dos casos, a mulher que põe o útero para alugar não é a mãe biológica dos filhos, ou seja, não fornece os óvulos.
— Muitos clientes usam embriões obtidos por fertilização in vitro, e outros recorrem a "doadoras (de óvulos) que passam por um processo de seleção e por testes físicos, infecciosos, genéticos e psicológicos. Para as mães de aluguel, o processo é parecido — disse Franco.
Deste modo, a taxa de sucesso na gravidez é alta, entre 60% e 70%.
Direito
Andreas Abele-Rassuly e seu marido – um casal gay residente na Alemanha e cansado da "discriminação" nos centros de adoção locais – tentaram começar uma gravidez de aluguel na Albânia, mas os obstáculos na legislação daquele país europeu assustaram os dois.
Por isso, eles foram parar na capital colombiana, graças à mediação de uma empresa israelense. Agora, são pais de dois filhos e consideram as mães biológicas das crianças "parte da família".
O deputado Alejandro Ocampo propõe a mudança para um modelo "altruísta", em que a "mãe de aluguel" seja reembolsada apenas pelas despesas da gravidez. Nadia Afanador, advogada especialista em contratos desse tipo, criticou o projeto por considerá-lo "um prejuízo para os estrangeiros".
— O direito à reprodução é um direito humano — disse Afanador, que, no entanto, defende uma lei que impeça "abusos" e "riscos comerciais".
* AFP