É uma noite de segunda-feira e o auditório do Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre começa a ser ocupado por casais, formados por gestantes em diferentes fases da gravidez - entre elas, esta repórter, grávida de 31 semanas da Aurora - e de pais de primeira viagem. Unidos pela expectativa e pela ansiedade que envolvem a chegada de um bebê, os participantes se preparavam para realizar um curso oferecido pela instituição, que inclui desde cuidados essenciais, como trocar a fralda e dar banho, até práticas que ainda despertam muitas dúvidas, como a amamentação e o parto.
"Como saber se estou sentindo uma contração e devo ir para o hospital? Ainda se usa travesseiro e kit berço? Que tipo de sabonete devo comprar? Como fazer a manobra para desengasgar depois de mamar?" Essas eram algumas das perguntas disparadas aos palestrantes pelos pais, ainda sem experiência.
A adaptação à nova realidade trazida pelo bebê vem acompanhada de um turbilhão de decisões que precisam ser tomadas em poucos meses - sem falar nas mudanças físicas e emocionais da gestante. O maior acesso à informação, favorecido pelas redes sociais, ampliou as possibilidades, mas esta avalanche de dicas, vídeos e de produtos inovadores oferecidos pelo mercado também pode gerar confusões e até aumentar a insegurança. Será que tudo isso funciona e é seguro?
Para completar, junte todas as novidades com as formas de cuidados, que estão em frequente atualização até para quem trabalha no hospital. Práticas que para nossos pais e avós pareciam comuns mudaram. O banho imediato, logo após o parto, já não é mais indicado. O talco, que era tradicional na troca de fraldas, caiu em desuso. Até o álcool utilizado para limpeza do coto umbilical saiu do ritual.
— Todo mundo vai dar uma dica, mas os pais querem o conhecimento científico e querem se sentir seguros. As novidades estão aí, mas têm coisas que não têm respaldo nenhum, são moda, estão ali nas mídias e não têm evidências — diz a coordenadora assistencial da área materno-infantil do Hospital Moinhos de Vento, Andréia Amorim.
O interesse dos homens nos cuidados desde a gravidez também é algo crescente nos últimos anos. Esse comportamento é apontado pela enfermeira Ana Paula Budel, coordenadora do Centro Obstétrico do Hospital Divina Providência, que também oferece um curso preparatório para futuros pais:
— O cenário mudou muito de 10 anos para cá. Os pais se inseriam muito devagar e superficialmente, e hoje a gente vê que eles buscam pelo conhecimento para se fazerem presentes. Eu digo que eles só não amamentam porque não podem.
O acompanhamento dos pais no momento do parto é outro ponto que faz diferença para a mãe. Segundo Ana Paula, tem sido comum os homens aprenderem técnicas de massagem e métodos que tragam maior tranquilidade para as gestantes, principalmente nos momentos das contrações.
O preparo para o parto
Principal escolha das mães, a cesariana está dando espaço para um número cada vez maior de mulheres dispostas à possibilidade de tentar o parto vaginal.
— O Brasil é um país cesarista. A Organização Mundial da Saúde (OMS) preconiza que 85% dos partos sejam vaginais. Aqui, nós temos uma média de 30%. Cinco anos atrás, o hospital atingia 15%, então nós já dobramos — observa a enfermeira Ana Paula, do Divina Providência.
A dor do parto e as contrações são as principais dúvidas das gestantes nos cursos, de acordo com a enfermeira obstétrica do Hospital Moinhos de Vento Lígia Maria Scherer, que dá uma dica para amenizar o medo e garantir um bom preparo através de exercícios específicos para as mamães:
— Uma avaliação com fisioterapia pélvica é algo que está bem no momento e acho que é importante para a preparação.
As novas práticas e o chamado plano de parto, no qual a gestante descreve suas preferências, também exigem uma renovação da equipe hospitalar. Lígia explica que é possível testar posições que deixem a grávida mais confortável:
— A gente tem chuveiro, bola, banqueta e opção de cama de parto. A paciente tem essa possibilidade e são coisas que a gente vem evoluindo. O parto é fisiológico, mas a maneira como a gente trabalha faz a diferença.
O cenário mudou muito de 10 anos para cá. Os pais se inseriam muito devagar e superficialmente, e hoje a gente vê que eles buscam pelo conhecimento para se fazerem presentes
ANA PAULA BUDEL
Enfermeira
O pós-parto (ou puerpério) é mais um momento que vem ganhando maior atenção, principalmente no aspecto emocional da mãe. Durante a formação do Hospital Moinhos de Vento, a psicóloga Waleska Jerusa de Souza Mendonça chamou a atenção dos pais para o período de quatro a cinco semanas após o nascimento do bebê, que pode vir acompanhado de cansaço, sensibilidade, tristeza sem motivo, irritabilidade e até dificuldade de assumir os cuidados:
— A diferença aqui é que o chamado "postpartumblues" precisa ter uma melhora espontânea depois.
Se o cenário não mudar, surge um ponto de alerta, porque o caso pode ser de depressão pós-parto. Segundo Waleska, a condição atinge aproximadamente 10% das mulheres, com sintomas que persistem por mais de 15 dias e se apresentam até o sexto mês depois do nascimento. A patologia causa ansiedade, choro intenso, sentimento de culpa e dificuldades acentuadas com o bebê, como cuidado excessivo ou abandono. Nessa situação, é preciso buscar ajuda especializada.
A criança nasceu, e agora?
Se esperar pelo parto já gera ansiedade, imagine se preparar para os primeiros dias cuidando de um bebê — a tensão fica aparente até na forma como seguramos as bonecas durante o curso: "Cuido a cabeça? Será que estou fazendo certo?", eu pensava, toda desajeitada, e não era a única.
— Nós, pais de primeira viagem, ficamos um pouco inseguros do que fazer depois que o bebê nasce, então é bom termos essa parte que fala do pós-parto — comentava a nutricionista Rossana Guerses, 36 anos, grávida de 31 semanas da Olívia.
No segundo dia de formação, nossos olhos se arregalaram, mas logo deram lugar a uma explosão de risos quando a enfermeira Riciane Silveira Osório, da área materno infantil do Hospital Moinhos de Vento, segurou calmamente um bebê de brinquedo com a barriga para baixo e movimentou as perninhas como se fossem uma "sanfoninha".
— Pode fazer esse movimento, não tem problema. O importante é dar sustentação no tronco — garante ela, indicando como uma medida de conforto.
Em seguida, a profissional explica algumas mudanças de protocolo que chamam a atenção. O banho imediato após o parto, que rendia várias fotos em épocas anteriores, agora leva mais tempo para acontecer. A orientação do hospital é esperar 24 horas, para uma melhor adaptação da pele do bebê ao mundo aqui fora.
Outro item que caiu em desuso é o álcool 70% para limpeza do coto umbilical, algo apontado pela enfermeira Ana Paula, do Hospital Divina Providência:
— Já temos uma orientação de uns três anos da Sociedade Brasileira de Pediatria. Ele pode ser limpo apenas com o cotonete seco, até que caia normalmente no sétimo dia, mas tem pediatras que ainda orientam.
Nós, pais de primeira viagem, ficamos um pouco inseguros do que fazer depois que o bebê nasce
ROSSANA GUERSES
Gestante
E mais uma informação que pode surpreender: os famosos "kit berços", que ainda hoje fazem sucesso nos enxovais, não são recomendados para a hora de dormir, pelo risco de sufocamento. O travesseiro também não é indicado pela enfermeira Riciane, que sustenta: a melhor posição para um sono mais seguro é com o bebê de barriga para cima.
As chupetas e mamadeiras são outro assunto que desperta bastante dúvida a respeito da confusão de bicos durante a amamentação. Para a odontopediatra do Hospital de Clínicas e Moinhos de Vento Priscila Stona, se a família optar pelo uso, o melhor é utilizar após o aleitamento materno estar completamente estabelecido, evitando os primeiros dois a três meses.
— Isso porque há uma grande diferença no padrão muscular de respiração e deglutição durante a sucção de mamadeira e chupetas — esclarece a profissional.
Ela ainda aproveita para falar sobre o açúcar nos primeiros dois anos de vida, que não é recomendado. Dados do Ministério da Saúde mostram que 32,3% das crianças consomem refrigerante antes desta idade e 60,8% comem biscoitos e bolos.
— A criança não vai sentir falta do que não conhece. Reduzir ou atrasar a exposição ao açúcar previne cáries, doenças cardiovasculares, diabetes e obesidade infantil — alerta Priscila.
Preparativos oferecidos pelos hospitais da Capital
Hospital Moinhos de Vento
Dentro da instituição, a Faculdade Moinhos de Vento realiza um curso mensal para casais receberem orientações sobre a chegada do bebê, com abordagem de temas como saúde emocional, gestação e parto, cuidados com o recém-nascido, aleitamento materno e saúde bucal infantil. O investimento é de R$ 600 e as inscrições podem ser feitas no site.
Próximas datas
28, 29 e 30 de agosto, 25, 26 e 27 de setembro, 30 e 31 de outubro e 1º de novembro, 27, 28 e 29 de novembro, 19, 20 e 21 de dezembro.
Hospital Divina Providência
O local oferece curso de gestantes com profissionais do Centro Obstétrico, que orientam sobre a gestação, parto, amamentação e cuidados com os recém-nascidos. O investimento é de R$ 230 e as inscrições podem ser realizadas no site.
Próximas datas
28, 29 e 30 de agosto
25, 26 e 27 de setembro
30 e 31 de outubro e 1º de novembro
27, 28 e 29 de novembro
19, 20 e 21 de dezembro
Hospital de Clínicas
O serviço de cursos foi interrompido durante a pandemia e está em reestruturação.
Hospital Mãe de Deus
Não realiza cursos atualmente. Segundo a instituição, as mães costumam agendar visita ao hospital para conhecer e tirar dúvidas.
Hospital Conceição
A maternidade oferece visitas guiadas ao Centro Obstétrico para gestantes e acompanhantes. Nesse momento, são dadas orientações de preparação para o parto, pós-parto e cuidados com recém-nascido. As visitas informam sobre métodos não-farmacológicos para alívio da dor, cromoterapia, aromaterapia, musicoterapia e posições para trabalho de parto. Durante a internação, há um grupo de puérperas para orientar sobre cuidados, aleitamento materno e higienização do bebê.
Hospital Fêmina
As pacientes podem realizar visitas na maternidade, sem necessidade de agendamento prévio, bastando apresentar a carteira de gestante. O hospital também participa do programa do Grupo Hospitalar Conceição que oferece apoio ao aleitamento materno durante a internação, com possibilidade de tirar dúvidas após a alta.
Santa Casa
A Santa Casa não tem realizado cursos nos hospitais da matriz, em Porto Alegre. Atualmente, a instituição conta com o curso somente no Hospital Dom João Becker, em Gravataí. A capacitação gratuita é voltada aos “pais de primeira viagem” ou aqueles que já têm filhos, mas querem aprimorar conhecimentos na nova gestação sobre os cuidados e as primeiras semanas do bebê.
Unidades de Saúde e Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas
A prefeitura de Porto Alegre explica que as grávidas são orientadas a estar sempre com a carteira de gestante, que contém todas as informações importantes. A partir da primeira consulta, a mãe já é informada de qual será a sua maternidade de referência para seguir o pré-natal lá.