Como todo serviço que presta consultas e cirurgias eletivas, o Programa Transdisciplinar de Identidade de Gênero (Protig) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) também sofreu com a sobrecarga sofrida pelo sistema de saúde durante os piores momentos da pandemia. O HCPA é a única instituição no Estado e uma das poucas no país a realizar a cirurgia de afirmação de gênero pelo Sistema Único de Saúde (SUS) – na modalidade em que o pênis da mulher transexual é transformado em uma neovagina. Também são efetuados, atualmente, implantes de silicone nos seios e mastectomias (retirada das mamas).
Operações foram retomadas no final do ano passado, mas já com um tempo de espera bem maior (um ano e meio a mais) em comparação com o que era verificado no início de 2020 (três anos). Os atendimentos voltaram a ser presenciais, com exceção dos encontros em grupos. O acesso precário à internet compromete o acompanhamento de diversos pacientes, que precisam ter vinculação de pelo menos dois anos ao programa, com participação nas atividades, antes de ficarem habilitados ao procedimento cirúrgico.
Em meio às dificuldades, o Protig conseguiu fazer um levantamento junto aos pacientes após um ano do início da crise do coronavírus. As respostas a um formulário online deram uma ideia do que se passava, conforme Maria Inês Lobato, psiquiatra do Serviço de Psiquiatria do HCPA e coordenadora do Protig. Os resultados surpreenderam os profissionais positivamente em alguns aspectos.
– Eles melhoraram em relação ao relacionamento intrafamiliar, como nas questões de preconceito e rejeição. Eles sempre têm uma relação muito ambivalente conosco, mas sentiram falta da nossa equipe. Outra coisa interessante é que estavam com mais dinheiro do que antes. Para os desempregados, o auxílio emergencial foi útil. Achamos que estariam piores, e isso confirmou a ideia de que viviam muito mal em termos de suporte financeiro – relata Maria Inês.
Interessados em acessar o Protig devem procurar sua unidade básica de saúde de referência. Não é possível marcar consultas diretamente no HCPA. A partir do momento da chegada ao serviço, são realizadas avaliações e entrevistas. Há acompanhamento da terapia hormonal por endocrinologista e apoio da assistência social.
– Estamos restringindo o atendimento a quem tem interesse em realizar a cirurgia. Quem está só tomando hormônios, encaminhamos para outro serviço – alerta a psiquiatra.