No primeiro dia do ano, um acumulado de 195 mil mortos por coronavírus assombrava o Brasil. O país mal havia conseguido dimensionar o tamanho da tragédia sanitária dos meses anteriores quando a cifra de vítimas passou a subir de forma ainda mais vertiginosa com o avanço da variante Gama: 300 mil no final de março, 400 mil no final do mês seguinte, meio milhão em meados de junho.
Na avaliação de especialistas, nunca se viu uma tragédia sanitária com essas proporções em solo brasileiro, o que garantirá a 2021 um lugar indesejado nos livros de história. O ritmo de vidas perdidas para o vírus foi freado pelo avanço da vacinação, mas, ainda assim, no começo de dezembro, já somava mais de 616 mil familiares, amigos, vizinhos levados pela pandemia.
O epidemiologista da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Pedro Hallal garante que a grande maioria dessas pessoas poderia ter sido salva se o país tivesse adotado medidas recomendadas pelo consenso científico internacional o mais cedo possível como estímulo a uso de máscara, distanciamento social e vacinação — que começou mais tarde do que poderia e só ganhou tração nos últimos meses.
— O ano de 2021 foi uma tragédia, o pior na história da nossa saúde pública. Tivemos, em poucos meses, mais mortes do que em todo o ano anterior. Cerca de 80% dos brasileiros que morreram poderiam estar vivos se o governo tivesse adotado medidas adequadas de combate à pandemia e comprado vacinas mais cedo — avalia Hallal.
A conta do epidemiologista é simples: a média de vítimas por milhão de habitantes no país ficou, até o final do ano, mais de quatro vezes acima do patamar mundial. Se o Brasil tivesse apresentado um desempenho equivalente ao do resto do planeta, quase meio milhão de vítimas teriam sido poupadas e poderiam acompanhar a chegada de 2022 com suas famílias.
Apenas oito países, levando-se em conta aqueles mais de 1 milhão de habitantes, se saíram pior do que os brasileiros no combate à covid-19 em uma lista liderada pelo Peru. Se, ao contrário do que se viu, o Brasil tivesse ficado na lista das nações que obtiveram os melhores resultados na contenção de danos da pandemia, como Finlândia ou Vietnã, os registros de óbitos poderiam ter ficado abaixo de 60 mil.
2021 foi uma tragédia. Cerca de 80% dos brasileiros que morreram poderiam estar vivos.
PEDRO HALLAL
Epidemiologista da Universidade Federal de Pelotas (UFPel)
A boa notícia é que as previsões para o próximo ano, graças principalmente à adesão dos brasileiros à campanha de vacinação e à capilaridade do Sistema Único de Saúde (SUS), são bem mais promissoras.
— Para não dizer que 2021 foi completamente perdido, a campanha de vacinação finalmente decolou no meio do ano, como historicamente sempre aconteceu no Brasil, e podemos dizer que o ano termina com algum saldo positivo. Ainda que a chegada da variante Ômicron tenha mudado um pouco o cenário, minha previsão para 2022 é otimista. O Rio Grande do Sul é um dos Estados que mais vacinaram, e a vacina é o que vai nos tirar da pandemia — diz Hallal.
Os gaúchos contabilizaram 36 mil mortes até meados de dezembro. Contabilizadas somente as perdas ocorridas neste ano, o Rio Grande do Sul ficava até aquele momento na 12ª colocação entre todos os Estados pela proporção de vítimas em relação ao número de habitantes. Nessa tabela, o Rio de Janeiro aparecia em primeiro lugar, na pior situação, e o Maranhão em último, com a menor taxa de mortalidade provocada pelo insistente coronavírus.