Três categorias de medicamentos para pacientes em situação crítica em emergências ou unidades de terapia intensiva (UTIs) são imprescindíveis para iniciar e manter o processo de ventilação mecânica, que é a conexão do doente com falência respiratória grave a um respirador artificial. Analgésicos, sedativos e bloqueadores neuromusculares compõem o chamado kit entubação.
Utiliza-se uma medicação de cada categoria, administrada uma após a outra. Como a ação dessas drogas é de início quase imediato e de curta duração, recorre-se ao protocolo de entubação em sequência rápida, tão logo a necessidade é identificada ou o mais brevemente possível.
Daiandy da Silva, farmacêutica do Centro de Tratamento Intensivo (CTI) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), explica como funciona a etapa de medicar o paciente. Começa-se pela administração, injetada na veia com seringa, de um anestésico — lidocaína, por exemplo. Cerca de dois minutos depois, passa-se para um forte analgésico (fentanil ou cetamina), associado ou não a um sedativo (midazolam ou propofol), mais um bloqueador neuromuscular, que é um relaxante muscular potente (como succinilcolina ou rocurônio).
Após a introdução do tubo pela boca e até a traqueia do paciente, tem início a ventilação, com oxigênio sendo enviado aos pulmões pela máquina. O doente precisa seguir recebendo as medicações por infusão, via cateter — os mesmos analgésicos, sedativos e bloqueadores neuromusculares usados no princípio ou outros. O tratamento pode ser necessário durante dias ou semanas, sem pausas, conforme a gravidade de cada caso, para proporcionar conforto respiratório. Ou seja, é esse fluxo incessante, multiplicado por um elevado número de pacientes, que desafia gestores nas tarefas de monitorar e repor estoques.
Além dos medicamentos para entubação, destaca Daiandy, há um grande número de pessoas, internadas por covid-19 ou outras enfermidades, que necessitam de drogas para manter a pressão arterial dentro de parâmetros adequados. Se ocorrem alterações e/ou oscilações (instabilidade hemodinâmica), especialmente pressão muito baixa, deve-se dar vasopressores (noradrenalina, vasopressina e adrenalina) para a estabilização.
— Os pacientes mais graves precisam desses e de outros medicamentos em doses usuais, em sua maioria, por dias ou semanas. Mas é possível observar que as doses necessárias para o tratamento de suporte dos pacientes com covid-19, por vezes, são maiores do que as utilizadas em pacientes críticos não covid, e por períodos mais longos — observa a farmacêutica.
O alto consumo de medicamentos tem provocado mudanças de protocolos, uma vez que se impõe a necessidade de se recorrer a outras drogas. Isso vem ocorrendo desde 2020, ressalta Daiandy, embora o problema tenha gerado preocupação e comoção fora do universo hospitalar apenas mais recentemente. A subida vertiginosa de preços é um dos fatores que dificultam a aquisição, mas há outros.
— O que mais impacta é a demanda que se tem versus a capacidade da indústria de produzir para disponibilizar. Esta é a conta que não está fechando — comenta a farmacêutica do HCPA. — Imaginamos o pior cenário no ano passado, quando esses medicamentos começaram a faltar em outros lugares. Construímos possibilidades para, quando precisássemos, estarmos melhor organizados. Incluímos no protocolo outras opções de medicamentos que não usávamos no hospital anteriormente, padronizando a forma de usar, quais as doses, como se fazem as preparações. Imaginávamos que tínhamos uma carta na manga e, mesmo assim, estamos com muitas dificuldades — completa.
Kit entubação
Medicamentos para entubar e manter o conforto respiratório de pacientes entubados:
- Analgésicos: fentanil, morfina, cetamina, remifentanil; e alfentanil e sulfentanil (menos usados)
- Sedativos: midazolam, propofol, dexmedetomidina
- Bloqueadores neuromusculares: atracúrio, rocurônio, cisatracúrio; vecurônio e pancurônio (menos usados); e succinilcolina (usada para a entubação)