Cerca de 15 anos atrás, quando o nível do meu colesterol começou a subir inexplicavelmente, tentei uma série de remédios relacionados à alimentação que incluíam comer mais peixe, junto com um suplemento de óleo de peixe, que, segundo pesquisas da época, poderiam ajudar a prevenir ataques do coração e derrames.
Infelizmente, meu corpo desprezou meus esforços, e acabei tendo que tomar estatinas. No entanto, continuei a seguir uma dieta saudável para o coração, cheia de vegetais e peixes, e a tomar 1.200 miligramas de óleo de peixe todas as noites.
Hoje, suspeito que os milhares de cápsulas de gel que ingeri ao longo dos anos pode ter feito pouco mais do que enriquecer os bolsos dos produtores e vendedores de suplementos. Uma grande quantidade de análises extensas foi conduzida, algumas apoiando e outras refutando o valor dos óleos de peixe para o sistema cardiovascular, junto com estudos sobre outros supostos benefícios, que também tiveram resultados mistos.
Os suplementos contêm ácidos graxos ômega-3, os óleos poli-insaturados abundantes em peixes gordos de água fria como salmão, sardinha e cavala. Em vários estudos observacionais, pessoas que consumiam peixe regularmente, duas ou mais vezes por semana, eram menos propensas a sofrer de ataques do coração, derrames ou ter mortes cardiovasculares do que os que comiam peixe com pouca frequência ou nunca.
Na verdade, o entusiasmo pelo óleo de peixe surgiu por causa de relatos feitos décadas atrás sobre como os esquimós, que consomem muitos peixes de água fria, possuíam níveis surpreendentemente baixos de doenças cardíacas, apesar de sua dieta conter grandes quantidades de gordura animal.
—Desde então, essa ideia foi bastante desacreditada; nós realmente não sabemos se os esquimós sofrem de doenças cardíacas ou não — diz Malden C. Nesheim, professor emérito de Nutrição da Universidade de Cornell, que presidiu um comitê do Instituto de Medicina que avaliava os riscos e benefícios dos frutos do mar no início dos anos 2000.
—Eu me tornei um cético do ômega-3 desde que conduzi esse estudo.
Enquanto isso, estudos feitos com grandes populações, com dados sólidos sobre as dietas dos participantes e sobre as causas das doenças e das mortes reforçaram as crenças de que comer peixe com frequência era uma prática saudável para o coração e estava ligada à redução das taxas de doenças vasculares. Uma análise abrangente conduzida pelo doutor Dariush Mozaffarian e por Eric Rimm, da Escola de Saúde Pública T. H. Chan de Harvard, por exemplo, descobriu que comer duas porções de peixe gordo por semana – o equivalente a cerca de dois gramas de ácidos graxos ômega-3 – diminuía o risco de morte por doenças cardíacas em mais de um terço e o de mortes totais em 17%.
A presença de ômega-3 em peixes claramente possui efeitos capazes de responder por essas descobertas. Esses ácidos graxos protegem contra ritmos anormais do coração, reduzem a pressão sanguínea e a frequência cardíaca e melhoram a função dos vasos sanguíneos. Eles também podem diminuir as triglicérides, que prejudicam o coração, e combater inflamações, um risco cardíaco conhecido. A questão é se os benefícios cardiovasculares observados encontrados em geral entre aqueles que consomem peixe ocorrem apenas devido aos óleos presentes nesse alimento, a outras características dos frutos do mar ou ainda a fatores comuns àqueles que se alimentam mais de peixe, como comer menos carne ou seguir um estilo de vida mais saudável no geral. Qualquer que seja a resposta, não parece que esteja nos suplementos de óleo de peixe.
No relatório mais recente, publicado on-line em 31 de janeiro no periódico JAMA Cardiology, uma equipe internacional liderada pelo doutor Robert Clarke, da Universidade de Oxford, analisou os resultados combinados de 10 testes com suplementos de óleo de peixe envolvendo 77.917 adultos com alto risco de doenças cardiovasculares.
Em doses que variam de 226 miligramas a 1.800 miligramas por dia de ácidos graxos ômega-3, não foi encontrada nenhuma proteção significativa contra "eventos vasculares importantes" em geral entre os participantes, ou em qualquer subgrupo, como aqueles com doenças cardíacas anteriores ou diabetes.
Embora essa conclusão não signifique necessariamente que os suplementos são inúteis, ela sugere uma consideração mais complexa sobre quem, se alguém, pode se beneficiar ao tomar óleo de peixe e se todos poderíamos ficar melhor simplesmente comendo mais peixe, mesmo que isso também tenha algumas desvantagens, assim como benefícios (Eu, no momento, ainda estou fazendo as duas coisas.)
Por exemplo, grandes peixes predadores como tubarões, peixes-espada, cavalas, alguns tipos de atum e albacoras podem ter altos níveis de metilmercúrio, uma toxina capaz de anular qualquer benefício para a saúde, especialmente para o cérebro em desenvolvimento de fetos e de crianças pequenas, assim como para adultos, segundo afirmaram Nesheim e Marion Nestle, professora emérita de Nutrição, em estudos sobre alimentação e saúde pública da Universidade de Nova York, em um editorial publicado em 2014 no American Journal of Clinical Nutrition. (Os níveis de mercúrio e outros contaminantes nos peixes desde então diminuíram um pouco, mas ainda não são desprezíveis.)
Tanto em estudos observacionais quando em testes clínicos controlados, no entanto, comer peixe mostrou promover o desenvolvimento ideal do cérebro e do sistema nervoso de bebês, o que levou a conselhos de que mulheres grávidas e que estão amamentando devem se alimentar mais de peixes ricos em ômega-3 e evitar espécies que podem conter mercúrio e outros contaminantes como os PCBs (bifenilos policlorados) encontrados algumas vezes em peixes de água doce.
Outra preocupação é com os custos ambientais que podem ocorrer se as pessoas comerem mais peixes, dado que "várias regiões de pesca oceânica já foram totalmente exploradas ou estão em declínio", escreveram Nesheim e Nestle. "Em face da oferta limitada", segundo eles, o preço desses alimentos provavelmente estaria "fora do alcance de muitos consumidores".
O declínio na oferta e o aumento dos custos dos pescados selvagens geraram uma explosão mundial da piscicultura, que também tem desvantagens. A utilização de organismos marinhos para alimentar os peixes nas fazendas, por exemplo, pode diminuir o suprimento vital de comida para os animais selvagens, e os peixes que escapam dessas criações são capazes de mudar a constituição genética dos que vivem na natureza.
Entretanto, se o custo do peixe selvagem for uma preocupação, o salmão criado em fazendas normalmente possui a mesma quantidade de ômega-3 do que os selvagens, que podem custar três vezes mais.
Hoje, menos do que uma pessoa em cinco nos Estados Unidos come peixe pelo menos duas vezes por semana, como é recomendado pelas Diretrizes Alimentares para os Americanos e pela Associação Americana do Coração, entre outras. Os peixes, afinal, possuem muita proteína, pouca gordura saturada e contêm nutrientes benéficos, como vitamina D e selênio.
Outros supostos benefícios do ômega-3 e dos peixes ainda não estão estabelecidos e precisam de mais estudos. Entre eles, sugestões de redução do risco de cânceres de mama e coloretal e possivelmente de câncer de próstata avançado, todos relacionados com comer peixe em vez de tomar suplementos. Alguns estudos observacionais associaram o ômega-3 à diminuição do risco de declínio cognitivo, doença de Alzheimer e demência, assim como de degeneração macular relacionada à idade.
Também ainda não está firmemente estabelecido o valor de proteção das fontes de ômega-3 vindas das plantas: o ácido alfa-linolênico encontrado nas sementes de linhaça, nozes e alguns óleos vegetais, que podem ser uma opção para vegetarianos e para as pessoas que têm alergia a peixes.
Por Jane E. Brody