A três meses de completar 50 anos de existência, a editora L&PM Editores passa por um desafio e tanto. O depósito onde os livros ficam armazenados está localizado na Av. A.J. Renner, no bairro Farrapos, em Porto Alegre. A água invadiu o local e chegou à altura de 1m20cm. A região foi uma das mais inundadas pela cheia do Guaíba.
Cerca de 900 mil livros estão estocados em caixas de papelão e distribuídos por 12 grandes estantes de alumínio. A estimativa dos proprietários é de que menos de 10% desse volume tenha sido atingido pela água ou danificado pelo contato com a umidade. Os prejuízos ainda não foram calculados.
Nesta quarta-feira (22), as portas foram abertas para começar o trabalho de limpeza. No total, 12 pessoas participaram da faxina. Na calçada, algumas obras estavam sendo descartadas em função de danos. Era o caso de livros como Assassinato no Expresso Oriente, de Agatha Christie; Memórias do Subsolo, de Fiódor Dostoiévski; Teoria da Relatividade, de Albert Einstein; Você Fica Tão Sozinho Às Vezes Que Até Faz Sentido, de Charles Bukowski; e Livro De Astro-Ajuda, de Thedy Corrêa.
No depósito há água nas torneiras, mas ainda falta energia elétrica. O piso térreo tem bastante barro e sujeira. O pavimento superior, onde fica o escritório, não sofreu danos maiores.
— Estamos com essa megaoperação aqui para tentar deixar a editora operacional. O paradoxo disso tudo é que o Brasil segue normal. Recebemos pedidos de todo país — explica o diretor Ivan Pinheiro Machado, dizendo que o problema da editora é pequeno perto das perdas das pessoas no entorno da região.
O depósito tem 2 mil metros quadrados e 14 pessoas trabalham no local. Conforme Ivan Pinheiro Machado, a presença de exaustores no teto atenuou a ação da umidade durante os dias de inundação. Os funcionários conseguiram erguer os livros para as partes altas das estantes ainda na sexta-feira (3), quando a água começou a se espraiar para vários bairros. Na terça-feira (7), os sócios tentaram acessar o depósito de barco, mas não obtiveram sucesso.
— Nesses 50 anos, já passamos por várias situações difíceis, como ditadura militar, inflação, quebra de duas grandes redes (Saraiva e Cultura), pandemia, e agora veio a inundação. Só falta uma guerra mundial — enumera o outro diretor e sócio da editora, Paulo de Almeida Lima.
Arte, literatura, teatro, cinema e artes plásticas são de primeira necessidade. É onde a sociedade respira e se reflete. Nós sobrevivemos e somos casca grossa
IVAN PINHEIRO MACHADO
Diretor da L&PM Editores
Enquanto a reportagem de GZH circulou pelo espaço, foi possível ver muito material sendo colocado no lixo. O serviço se concentra na Rua Irmão Francisco, onde há um portão de acesso ao depósito de livros. Os estabelecimentos próximos também passam por limpeza semelhante.
Durante a enchente, uma porta foi arrombada, mas nada foi levado. Os sócios da L&PM Editores não pensam na possibilidade de sair do depósito, onde estão há oito anos. Autores, escritores e outras editoras entraram em contato para oferecer ajuda e solidariedade. As operações deverão levar pelo menos 40 dias até estarem 100% normalizadas.
A sede administrativa localizada na Rua Comendador Coruja, no bairro Floresta, onde ficam a direção, o departamento comercial e a produção editorial, também foi atingida pela enchente. Os estragos lá foram igualmente significativos.
— Arte, literatura, teatro, cinema e artes plásticas são de primeira necessidade. É onde a sociedade respira e se reflete. Nós sobrevivemos e somos casca grossa — conclui Ivan Pinheiro Machado.