Acontecimentos como o assassinato de duas pessoas na Orla, em junho — que culminou em um decreto que proíbe a venda e o consumo de bebidas alcoólicas durante a madrugada nos trechos 1, 2 e 3 e no Parque Marinha —, e a recente ação da Brigada Militar na qual policiais utilizam spray de pimenta e cavalaria para desobstruir a Travessa dos Venezianos, na Cidade Baixa, reacenderam o debate sobre a ocupação de espaços públicos em Porto Alegre.
No programa Timeline desta quarta-feira (19), na Rádio Gaúcha, especialistas e autoridades da área da segurança debateram sobre as medidas que estão sendo tomadas para evitar novas confusões em bairros com grande atividade noturna na Capital. Também foram abordados os fatos dos últimos meses que levaram à discussão de novas regulamentações.
"Na Cidade Baixa já não é mais uma boemia, é um local de muita confusão"
Subcomandante do 9º Batalhão de Polícia Militar (9º BPM), Demian da Rocha Riccardi Guimarães comentou o episódio ocorrido na Cidade Baixa, na madrugada do último domingo (16), entre as ruas Lopo Gonçalves e Joaquim Nabuco.
— Não é de hoje que a Brigada Militar emprega esforços para que as pessoas tenham segurança para se divertir. Normalmente, a população vinha entendendo, porém, chegava um ponto em que era necessária a demonstração de força. Na Cidade Baixa já não é mais uma boemia, é um local de muita confusão — relatou.
O bairro, um dos mais boêmios da cidade, já é regrado por um decreto que estabelece, entre outras medidas, que bares e restaurantes restrinjam as atividades a áreas internas depois das 2h. Segundo o major Riccardi, após o fechamento dos estabelecimentos, muitas pessoas continuam nas ruas perturbando o sossego dos moradores da região.
— O decreto municipal prevê o fechamento às 2h, o que não quer dizer que se pode fazer algazarra nas ruas. Fomos procurados pela comunidade de comerciantes e moradores da Cidade Baixa, que não aguentam mais. No últimos 30 dias, o 9º BPM atendeu 260 ocorrências de perturbação de sossego no bairro — completou.
"A ocupação das vias públicas traz segurança para o local, não o contrário"
Eber Pires Marzulo, professor da Faculdade de Arquitetura e do Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional da UFRGS, defendeu que sejam oferecidos espaços para que a população possa realizar atividades noturnas de lazer.
— Se os problemas são antigos e a solução é a mesma, as dificuldades seguem. Me parece que falta uma capacidade de aprendizagem. Temos que ter soluções para os espaços boêmios e públicos — destacou.
De acordo com o professor, o contingente deslocado para resolver questões como a ocorrida na Cidade Baixa, no último fim de semana, deveria ser empregado em outras questões.
— Fico espantado com a quantidade de contingente que as forças policias empregam para resolver bate-boca na rua, atuando em problemas derivados de uma recreação noturna. O poder público tem que oferecer espaços públicos para esse tipo de atividade. A ocupação das vias públicas traz segurança para o local, não o contrário — apontou.
Conforme o major Riccardi, o número de policiais deslocados para bairros boêmios da Capital tem uma explicação:
— O contingente vai em grande número para não precisar atuar. Se formos com dois brigadianos, a chance de eles serem agredidos é muito grande. Então, aí sim, precisaríamos tomar uma ação muito mais efetiva — disse.
"O fator de risco, e isso é no mundo inteiro, se chama álcool"
Diretor-executivo do Instituto Cidade Segura, Alberto Kopittke defendeu que o consumo exacerbado de bebidas alcoólicas é o principal responsável pelas confusões que ocorrem em locais de vida noturna de Porto Alegre e de outras cidades.
— Enquanto não conversamos sobre a causa do problema, estaremos sempre falando sobre as consequências. O fator de risco, e isso é no mundo inteiro, se chama álcool. Não podermos ser negacionistas. Se queremos seguir evidências, a cidade precisa debater o consumo de bebidas alcoólicas na rua. A causa é essa, por mais chato e careta que seja debater isso. Temos que ter fiscalização, mas se possível, sem uso da força — pontuou.
"A tendência é fazer uma regulamentação única para toda a Capital"
Ao Timeline, o secretário de Segurança Pública de Porto Alegre, Alexandre Aragon, afirmou que a prefeitura está focada em unificar a regulamentação da venda de bebidas alcoólicas no município.
— A cidade é bem dinâmica, ela vai aprendendo conforme o tempo. Se antes na Orla não tínhamos regramento, agora temos. Temos regras que vão desde o impedimento da venda de bebidas a partir da meia-noite, a partir da 1h, vai conforme a necessidade. A tendência para os próximos 10 anos é fazer uma regulamentação única para toda a Capital. O próximo ponto que trabalharemos será o bairro Rio Branco — explicitou.