Cinco sítios arqueológicos espalhados pelos bairros Bom Fim, Independência e Centro Histórico surgiram no caminho da prefeitura de Porto Alegre, que tem planos de substituir toda a rede de distribuição de água da região central. O projeto, que deve representar grande impacto na vida dos habitantes desses bairros, tem projeção de investimentos de quase R$ 10 milhões.
— Fizemos um projeto para substituir todas as redes de distribuição de água do Bom Fim e arredores. Serão trocados 13,2 mil metros de rede na região — revela o diretor-geral Alexandre Garcia, do Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae).
Após o projeto ter sido elaborado, foi lançada uma licitação. Então, no momento da implantação, houve uma surpresa inesperada:
— Fomos surpreendidos pela descoberta desses cinco grandes sítios arqueológicos no Bom Fim e arredores — confirma.
Os cinco sítios arqueológicos que afetam os planos do Dmae ficam nas áreas da Rua Irmão José Otão, da Casa Godoy (Avenida Independência), da Santa Casa de Misericórdia, do Observatório Astronômico da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Praça Rui Barbosa.
A primeira ideia da prefeitura foi evitar esses locais e tentar iniciar as obras sem abrir ruas ou escavar as áreas dos sítios. Porém, isso se tornou inviável pela questão da preservação envolvida, conforme normas do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que é responsável por determinar o tipo de pesquisa a ser desenvolvida em cada área.
— Suspendemos esse contrato e estamos preparando licitação para contratar um serviço de arqueologia para acompanhar o Dmae — explica Garcia, esclarecendo que será feito pregão e só depois de aprovado o projeto é que a obra sairá do papel.
Dessa maneira, a prefeitura agora precisa aguardar o resultado do futuro levantamento arqueológico para saber como agir no Bom Fim, que tem 11.630 habitantes, e no Independência, com 6.121 moradores, de acordo com o censo realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
— No primeiro semestre do ano que vem, acho que conseguiremos começar a substituição — acredita o diretor-geral, porém sem confirmar uma data.
Fomos surpreendidos pela descoberta desses cinco grandes sítios arqueológicos no Bom Fim e arredores
ALEXANDRE GARCIA
Diretor-geral do Dmae
A maior parte das tubulações do Bom Fim, por exemplo, possui mais de 50 anos, estando com sua vida útil bastante comprometida. O investimento é visto com otimismo pela prefeitura.
— Essa troca vai dar um resultado muito grande para nós, porque reduzirá a nossa perda e melhorará absurdamente a distribuição de água tratada para a população — diz Garcia.
Questionado sobre os problemas que as futuras ações devem ocasionar aos moradores e ao trânsito intenso dos bairros, Garcia antecipa medidas para minimizar os impactos da obra.
— Sempre que for possível, vamos passar pelas calçadas. Quando não for viável, as intervenções serão realizadas o mais perto do meio-fio.
Ocupação antiga
A arqueóloga Kelli Bisonhim, da empresa Sophia Cultural, costuma trabalhar em sítios arqueológicos descobertos em Porto Alegre. Foi ela que coordenou as pesquisas e escavações feitas na área do Pontal do Estaleiro, na zona sul. Na ocasião, foram encontrados mais de 12 mil fragmentos indígenas em escavações na região conhecida como Ponta do Melo.
— É um conjunto de coisas que define um sítio arqueológico. Precisamos fazer a análise do tamanho do sítio. Há todo um contexto histórico do lugar, artefatos arqueológicos que provam que o local foi habitado — explica.
Conforme Kelli, é difícil precisar o que pode ser encontrado durante as escavações no bairro.
— Acredito que sejam sítios históricos. A ocupação é muito antiga e temos ali prédios bem antigos — observa, salientando que não teve acesso ao material para determinar com precisão quais tipos de sítios estão espalhados pela região.
A arqueóloga também destaca algumas ações que devem ser feitas para se preservar as peças que forem resgatadas durante a troca das redes de água:
— É preciso ter um acompanhamento arqueológico para resgatar o que for possível e não ter impacto maior no sítio.
Indagada sobre como seria possível fazer uma obra tão grande com impactos mínimos para o que está enterrado no subsolo e possui importância histórica, ela compartilha o que atesta na prática.
— Neste caso, como há tubulação, a maioria opta por desviar a obra do sítio. Mas, às vezes, não tem como e se faz o resgate arqueológico dos artefatos, que depois serão depositados no acervo de algum museu — conclui.