A partir de experiências de outras cidades, de dados levantados em pesquisas e de opiniões de autoridades e especialistas, GaúchaZH traz 10 ideias para aprimorar o transporte público de Porto Alegre. Elas miram em gargalos da legislação, da logística e em formas de tornar o sistema mais atraentes para usuários.
1. Flexibilização da tarifa
Segundo a pesquisa QualiÔnibus, a grande maioria dos passageiros de ônibus se concentra nos horários de 7h às 9h (47,5%) e das 17h às 19h (40%). Nenhuma outra faixa de horários atrai mais do que 20,8% dos usuários. Ao optar por uma tarifa única, Porto Alegre perde a chance de oferecer descontos para tornar o ônibus mais atraente em determinados horários. Fortaleza, por exemplo, tem nove variações de preço, com descontos em faixas de horário e aos domingos. Uma lei de janeiro de 2019 abriu caminho para isso, mas, segundo a Associação dos Transportadores de Passageiros (ATP) da Capital, as empresas não o fazem alegando um problema contábil: podem oferecer desconto por sua conta e risco, mas nos balanços a prefeitura contabiliza cada passageiro como R$ 4,70 faturados.
2. Vale-transporte em lotações
É um desejo antigo dos permissionários que o usuário de vale-transporte possa utilizar os lotações. Isso nunca foi permitido para não gerar concorrência com o ônibus tradicional. Esse é um raciocínio que poderia fazer sentido em décadas passadas, mas não hoje em que os dois modais têm um concorrente em comum. Diante dos milhares de motoristas dirigindo por aplicativos, a concorrência com 429 lotações seria pouco expressiva e poderia ajudar o usuário a redescobrir essa alternativa e o transporte público como um todo.
3. Lotações com GPS e por demanda
Um dos motivos para as lotações não estarem rastreados via GPS no aplicativo CitaMobi é peculiar: um motorista saberia onde o outro está e poderia usar isso para surrupiar passageiros. Se o receio é legítimo, pouco importa aos principais interessados no sistema: os usuários. Hoje, é um desafio descobrir se um trajeto pode ser feito por uma linha de lotação e impossível saber a localização dos carros. Outra medida sugerida por especialistas é o lotação funcionar por demanda, como um serviço semelhante a uma corrida por aplicativo compartilhada, cobrindo regiões previamente delimitadas.
4. Precificação dos aplicativos
Em uma cidade de trajetos curtos, como Porto Alegre, será difícil que qualquer medida de resgate do transporte público prospere se os aplicativos operarem a cifras tão baixas. Por mais antipático que possa ser aos usuários, o preço precisaria subir para regular o mercado. O caminho escolhido pela prefeitura — um projeto de lei com taxação de R$ 0,28 por quilômetro rodado — ajuda na arrecadação, mas ainda é pouco significativo no preço final. Corridas mais caras também teriam um segundo efeito positivo: a cobrança dos usuários por um serviço de melhor qualidade, como ocorria no início da operação dos aplicativos.
5. Integração de trajetos na Região Metropolitana
Porto Alegre permite que ônibus vindos de municípios da Região Metropolitana atravessem a cidade de leste a oeste sem restrições, algo que nem mesmo os ônibus urbanos fazem sem integração entre linhas. O ideal apontado por engenheiros de trânsito é restringir os trajetos de veículos de municípios vizinhos no perímetro urbano da Capital, fazendo com que os passageiros de cidades-satélites se integrem às linhas porto-alegrenses o mais cedo possível. Para isso, o ideal seria um sistema de transporte completamente integrado à região, como ocorre em capitais como Curitiba e Goiânia.
6. Serviço de mensalidade do ônibus
Um dos projetos do pacote de mobilidade da prefeitura propõe que empregadores paguem, em vez de vale-transporte, uma taxa mensal para que os funcionários tenham passe-livre nos coletivos urbanos. Independentemente do projeto de lei prosperar, é interessante a ideia de passe-livre nos ônibus em troca de um valor mensal fixo. Como em todo serviço que funciona dessa forma — o BikePoa é um bom exemplo —, o cliente ganharia em comodidade e economia, enquanto o sistema ganha um contribuinte fixo. A modalidade seria interessante para profissionais autônomos, hoje tentados a sair do sistema por não receberem vale-transporte.
7. Campanhas de incentivo
Porto Alegre assistiu de mãos no bolso a quase 30% dos seus usuários abandonando o sistema de ônibus. Após oito anos consecutivos de queda no número de passageiros, um problema adicional é que os usuários eventuais se desacostumaram com o ônibus. Desconsideram essa alternativa, por falta de hábito ou preguiça, mesmo quando é vantajosa. Uma forma de resgatar esse passageiro é oferecer incentivos. Da mesma forma como o CPF na nota é utilizado para incentivos fiscais, o acúmulo de milhagem no ônibus poderia gerar descontos em tributos municipais, como o IPTU, ou em passagens futuras.
8. Passagem de ônibus por cartão
Embora o cartão TRI tenha evoluído em praticidade, oferecendo serviços como recargas por site e aplicativo, ainda cabem medidas que facilitem a vida de quem não é usuário frequente do sistema de ônibus e sem trocados no bolso. Algo elementar é aceitar pagamentos de passagem em cartões de crédito ou débito, uma facilidade oferecida desde sempre pelos aplicativos. Para simplificar o embarque, já há modelos de pagamento por aproximação do cartão e compras antecipadas por voucher no celular, como um ingresso de cinema, funcionalidade que poderia existir no aplicativo do TRI.
9. Atenção aos pontos de ônibus
O preço da passagem não é o fator pior avaliado pelos usuários segundo a QualiÔnibus 2019. Enquanto 58% dos passageiros se dizem insatisfeitos com a tarifa, o conforto nos pontos de ônibus é motivo de insatisfação para 60%. Para concorrer com a opção de ser buscado na porta de casa por um aplicativo, é preciso melhorar estrutura e segurança das estações. A boa nova é que há um edital em curso prevendo a renovação das paradas, que passariam a ter painéis informativos das próximas chegadas, assentos com acessibilidade, tomadas USB e prateleiras de livros. A renovação total, porém, demoraria seis anos.
10. Integração de pagamentos e aplicativos
Uma tendência da mobilidade em metrópoles é o que os especialistas chamam de seamless transport, ou "transporte sem emendas". O passageiro passaria de um meio de transporte para o outro sem ter de pensar nas particularidades de cada um, inclusive sua forma de pagamento. Uma maneira de facilitar esse sistema é unificar todos os serviços de transporte em um único aplicativo, com uma alternativa de pagamento pré-selecionado. Hoje, TRI, CitaMobi, BikePOA e aplicativo do Sintáxi funcionam separadamente. Um único aplicativo poderia integrá-los com pagamentos em um mesmo cartão de crédito.