Um dos pilares do projeto de criação de um polo carboquímico no Rio Grande do Sul, a produção de gás natural sintético tem pela frente desafios para se manter em pé com a concorrência com outras fontes de energia e possíveis oscilações de preço.
A importância da sustentação financeira do empreendimento da Mina Guaíba, que exigiria investimento de US$ 4,4 bilhões, é evitar que um eventual fracasso pelo meio do caminho deixe como herança para o RS um passivo ambiental.
A Copelmi e o Palácio Piratini, que trata o aproveitamento do carvão como política de Estado, têm confiança no sucesso do megaempreendimento construído sobre milhões de toneladas do mineral. O otimismo é justificado pela abundância das jazidas e pela possibilidade de atender à demanda local por gás natural atualmente importado. Mas há especialistas nesse mercado mais cautelosos.
CEO da Gas Energy, uma das principais consultorias do país na área, Rivaldo Moreira Neto sustenta que uma iniciativa ancorada na produção de GNS, hoje, representa um "desafio econômico".
– Para o projeto fazer sentido e não depender de subsídios ou outros incentivos, você tem de olhar para a existência de possíveis alternativas. E o Brasil está em uma escalada de oferta de gás natural da bacia do pré-sal, com perspectiva de crescimento de volume e competição. Em um horizonte de cinco, 10 anos, deve haver crescimento de produção e redução de preços – opina Moreira Neto.
Essa expectativa é sustentada por declarações do ministro da economia, Paulo Guedes. O economista prometeu um "choque de energia barata" para o país baseado em um estudo segundo o qual a diminuição dos custos poderia acrescentar um ponto percentual ao ano no crescimento nacional e criar até 12 milhões de empregos em uma década.
Diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getúlio Vargas, o economista Carlos Langoni avalia que seria possível cortar até pela metade o custo do gás natural mediante a quebra do monopólio da Petrobras e o estímulo à competição nos próximos anos. Isso significa que, se o preço do combustível realmente despencar, o GNS produzido em solo gaúcho perderia competitividade.
A Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) acredita que o investimento no carvão local se justifica porque o Estado não consegue importar uma grande quantidade de gás. O gasoduto que traz gás natural da Bolívia se torna mais estreito à medida que se aproxima do Rio Grande do Sul, o que limita o potencial de fornecimento a 2,9 milhões de metros cúbicos por dia. Assim, haveria oportunidade de atender a uma demanda reprimida interna.
– Há períodos em que já comercializamos volumes no limite. Se aumentar a produção do pré-sal, não conseguiremos receber isso via gasoduto. Outras opções podem ter custo mais alto – analisa o secretário Artur Lemos.
Moreira Neto pondera que, na maior parte do tempo, o Estado tem folga razoável no gasoduto. O consumo médio em 2019 ficou em cerca em 2,2 milhões de metros cúbicos até novembro, o equivalente a 76% da capacidade.
O especialista analisa ainda que alternativas como liquefazer o gás e transportá-lo por navio podem ser vantajosas, dependendo de contas de custo-benefício que ainda precisam ser feitas.
– O gás natural liquefeito tem apresentado um preço de importação cada vez mais competitivo. Seria possível desenvolver uma solução para levá-lo até a Região Metropolitana, como já houve um projeto de transporte pela Lagoa dos Patos. São iniciativas discutidas hoje no mercado – diz o integrante da Gas Energy.
A Copelmi sustenta que o gás do pré-sal não depende apenas de exploração para representar uma ameaça em termos de concorrência, mas de investimentos adicionais que precisariam ser feitos em processamento e distribuição via novos gasodutos no país.
A empresa acrescenta que a Mina Guaíba forneceria, além do carvão para abastecer a carboquímica, areia e brita capazes de aumentar a competitividade da construção civil na Região Metropolitana.