Chão forrado de papel pardo, quadros pendurados nas paredes, pincéis e telas ao alcance das mãos e tintas de várias cores à disposição, basta pedir. Crianças e adolescentes de diferentes idades expressam sua criatividade neste ambiente, montado uma vez por semana no Abrigo Residencial 7 (AR7), da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc), na Capital. As oficinas, que ocorrem desde junho e devem seguir até janeiro de 2020, fazem parte do projeto Artinclusão, coordenado pelo artista plástico Aloizio Pedersen.
A partir desta terça-feira (12), será realizada mais uma etapa do projeto: telas pintadas pelos pequenos artistas serão exibidas em uma exposição, no Paço Municipal. Às 17h, haverá uma solenidade de abertura oficial da mostra, e um grupo de crianças participantes do projeto fará a entrega de telas a autoridades presentes.
— É um jeito de valorizar os trabalhos deles, é muito importante: fazer algo, presentar alguém, ter sua obra exposta — diz Jeanne Luz, coordenadora do abrigo.
Sustentação
O AR7 é uma porta de entrada. Recebe crianças que foram retiradas das mais diversas situações de vulnerabilidade. Elas ficam no local, geralmente, até que seus futuros sejam decididos: voltar para suas famílias, encontrar um novo lar ou seguir para outro abrigo, em definitivo. Atualmente, são 45 assistidos, entre meninas (até 18 anos) e meninos (até os 14 anos). Neste contexto, a arte serve de sustentação, como explica Aloizio:
— Aqui, eles têm liberdade, visibilidade. Por meio da arte, eles vão lembrar que são aceitos. Poderão exibir suas obras. A arte tem o poder de ressignificar emoções e sentimentos.
No dia da visita da reportagem, a aula ficou cheia de pequenos artistas de várias idades. Alguns ficavam quietos, concentrados em finalizar suas obras. Um deles era L., 10 anos. No início do projeto, o pequeno não conseguia encontrar concentração suficiente para permanecer por muito tempo na sala da oficina. Agora, em poucos minutos, deitado no chão e alheio ao barulho constante, desenhou “um palhaço, uma cabeça cortada e um homem”.
— Minhas cores preferidas são vermelho e preto. Hoje, usei só vermelho — contou ele.
A., oito anos, fez questão de mostrar suas contribuições para obras coletivas expostas no local e de contar que desenha personagens do jogo de videogame Minecraft. Tudo isso sem soltar o pincel nem por um segundo. Na hora de demonstrar suas habilidades, de tão empolgado, pintou a frente e o verso da tela com a tinta preta.
Coordenadora do abrigo, Jeanne Luz também acredita no potencial transformador da arte.
– Muitas vezes, o que é oferecido nas oficinas não fazia parte do mundo deles antes de virem para o abrigo: arte, cultura, as cores. A arte faz com que eles tenham novos horizontes. Isso é de grande valia – afirma.
Trajetórias de artistas são inspiração
Conhecer a vida e a obra de artistas consagrados também faz parte das atividades. A ideia é que a trajetória deles, que, muitas vezes, transformam seus sofrimentos em arte, inspire os pequenos a fazer o mesmo.
Na aula acompanhada pelo DG, as crianças assistiram a um vídeo sobre o norte-americano Jackson Pollock (1912 – 1956), que ficou conhecido por usar técnicas como o gotejamento (pingos de tinta), na qual o pincel não toca na tela.
— Prestem bastante atenção. Depois, nós vamos nos transformar nele. O que vocês estão vendo nas imagens? — questiona Aloizio, diante do olhar curioso da sua plateia.
— Eu vejo ele botando no quadro os sentimentos. Ele consegue mostrar pra todo mundo — responde a menina M., 15 anos.
A atividade realizada em seguida, em grupo, foi reproduzir a técnica de Pollock. Diante da tela multicolorida e pronta, M. diz, ao ser questionada sobre como se sente ao se expressar por meio da arte:
— Eu me sinto viva!