A primeira audiência de conciliação entre a concessionária do aeroporto Salgado Filho (a empresa alemã Fraport) e o Ministério Público Federal (MPF) está marcada para esta quinta-feira (8), às 14h30min, na 3ª Vara da Justiça Federal de Porto Alegre. O encontro será conduzido pela juíza Thais Helena Della Giustina, responsável pelo caso, e terá o objetivo de buscar acordo entre as partes sobre custos da remoção de cerca de 1,5 mil famílias da Vila Nazaré, iniciativa necessária para viabilizar a obra de ampliação da pista do terminal em 920 metros.
As responsabilidades e os gastos envolvidos na desocupação da Vila Nazaré e realocação das famílias se converteram em motivo de divergência entre Fraport e MPF, que ingressou com ação judicial requerendo que a empresa assuma os encargos. A audiência, possivelmente, não será definitiva, dada a complexidade da situação. A Justiça Federal explica que, caso não haja acerto via consenso, o processo seguirá o trâmite tradicional, com produção de provas e julgamento por parte da juíza.
Instalada no local há décadas, na margem da Avenida Sertório, a Vila Nazaré está na rota da principal obra prevista para ocorrer nos 25 anos de concessão, a expansão da pista que permitirá ao terminal receber aeronaves de maior porte. O obra deve estar concluída e em uso até 29 de dezembro de 2021.
A Fraport entende que as famílias devem deixar a área, já desapropriada por declaração de interesse público e se deslocar para dois conjuntos habitacionais construídos pelo governo federal, os condomínios Senhor do Bom Fim, no Sarandi, e o Irmãos Maristas, no Rubem Berta. Dessa forma, a empresa alemã avalia que deve prestar apenas auxílio na desocupação, sem custos adicionais com reassentamento ou realocação.
O MPF ingressou, em julho, com ação civil pública alegando que o contrato de concessão prevê que a Fraport é a responsável pela remoção das famílias, devendo arcar com eventuais custos decorrentes disso, como realocações e reassentamentos. O MPF requer que a concessionária ofereça terceira solução habitacional ou auxilie as famílias na compra assistida de imóveis, como foi feito na obra da nova ponte do Guaíba. O MPF calcula que o custo para a Fraport é de R$ 146 milhões.
Assinado em julho de 2017 pela Fraport e pela União, o contrato de concessão do Salgado Filho está no centro da queda de braço entre a empresa e o MPF. A página 12 informa que eventuais desocupações das áreas do sítio aeroportuário, em posse ou detenção de terceiros, são de “integral responsabilidade da concessionária”.
Na página 24 do documento, está determinado à concessionária “promover a desapropriação dos imóveis necessários à realização de investimentos ao longo da concessão cuja fase executória não tenha ainda sido iniciada, e indenizar seus proprietários”.
O item cita que deverá ser observado o inciso oitavo do artigo 29 da Lei de Concessões, o qual diz que podem ser declarados de utilidade pública bens necessários para a execução de obra, com autorização para desapropriações, sendo da concessionária “a responsabilidade pelas indenizações cabíveis”.
A partir da página 36, são listados riscos assumidos pela concessionária, como “custos decorrentes das desocupações do sítio aeroportuário referidas no item 3.1.50, bem como de eventuais reassentamentos e realocações”.
Na página 8 do anexo 2 do contrato, no Plano de Exploração Aeroportuária, está registrado: “Caberá à concessionária tomar todas as medidas necessárias à imissão de posse nas áreas ocupadas por terceiros (...), arcando integralmente com o ônus decorrente de tais providências”.
A Fraport rebate afirmando que a Constituição atribui ao poder público responsabilidade pelas políticas habitacionais. A empresa entende que “há obrigação de desocupar, mas que isso não se confunde com reassentamento”. Dessa forma, a avaliação da concessionária é de que os custos se limitariam às ações necessárias para a reintegração de posse.
Em fevereiro de 2019, antes de o caso ser judicializado, a Fraport apresentou às autoridades plano de remoção da Vila Nazaré ao custo máximo de R$ 29,2 milhões. A proposta atendia 930 famílias do sítio aeroportuário. O MPF não aceitou por considerar os valores insuficientes. Além disso, seria necessário discutir o destino de outras cerca de 500 famílias que não estão na área aeroportuária, mas que possivelmente terão de ser removidas.
A Justiça Federal informou que, “em razão do tamanho da sala”, a audiência será restrita às partes envolvidas. Procuradas, Fraport e o MPF não se manifestaram.