Antes da judicialização do processo de desocupação da Vila Nazaré, em Porto Alegre, ação necessária para a obra de ampliação da pista do aeroporto Salgado Filho, a concessionária Fraport apresentou um plano de remoção de famílias ao custo máximo de R$ 29,256 milhões. A proposta, apresentada em reunião com o Ministério Público Federal (MPF) e representantes do Poder Executivo em 7 de fevereiro de 2019, incluía valores para o transporte da mudança (R$ 3 mil por família) e recurso para compra de móveis (R$ 5 mil por família), além de pagamento em dinheiro para os que não se enquadram nos critérios de habitação de imóvel do programa Minhas Casa, Minha Vida (R$ 80 mil por família) ou que recusam se mudar para uma das duas soluções habitacionais à disposição (R$ 23 mil por família).
O limite de gasto estabelecido pela Fraport, considerando a estimativa das famílias envolvidas na desocupação do sítio aeroportuário, ficou em R$ 29,256 milhões. Os valores foram considerados baixos pelo MPF e não houve acordo. Em julho, cinco meses depois desta tentativa de consenso, o MPF ajuizou ação civil pública na Justiça Federal para procurar impor à concessionária os custos da desocupação.
A ata da reunião em que houve a discussão, bem como a proposta apresentada pela Fraport, estão anexadas ao processo judicial que tramita na 3ª Vara Federal de Porto Alegre. Como não há sigilo, a consulta dos documentos é pública.
Na discussão, a Fraport, apesar da apresentação do plano, reafirmou o seu entendimento de que não há custos a serem suportados por ela. Na interpretação da empresa, as cerca de 1,5 mil famílias da Vila Nazaré deveriam se deslocar para as soluções habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida construídas pelo governo federal nos bairros Sarandi e Rubem Berta, liberando o terreno para as obras de ampliação da pista, que precisam estar finalizadas, segundo o contrato, até o 52º mês de concessão (expira em 29 de dezembro de 2021).
"A Fraport sustentou que o entendimento da empresa é de que não há responsabilidade contratual de custear as unidades habitacionais e que o limite da empresa são os R$ 29,256 milhões", diz a ata elaborada pelo MPF, anfitrião daquela reunião. No plano da concessionária, assinado por Andreaa Pal, CEO da Fraport, foi consignado que "essa proposta vem no bojo de uma elevada preocupação em se fazer cumprir o cronograma estabelecido pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) no contrato de concessão e, com isso, alcançar a desejada ampliação da pista do aeroporto Salgado Filho".
O MPF avaliou, na ata, que "o valor de R$ 80 mil é insuficiente para a aquisição de unidades habitacionais em Porto Alegre, lembrando o caso da nova ponte do Guaíba, em que os valores giram em torno de R$ 150 mil a R$ 178 mil".
Representando a prefeitura de Porto Alegre, o Departamento Municipal de Habitação (Demhab) "esclareceu que o valor do bônus-moradia do município é de R$ 80 mil para habitação e que os beneficiários estão conseguindo comprar imóveis em Porto Alegre e na Grande Porto Alegre com esse valor".
Por fim, colocando mais um ingrediente no impasse, a Secretaria de Apoio ao Licenciamento Ambiental e Desapropriação, do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), da União, disse não entender "o fundamento contratual para atribuir à Fraport a responsabilidade financeira da indenização".
A decisão caberá à 3ª Vara Federal de Porto Alegre. No despacho inicial, a Justiça determinou a suspensão da remoção e o cadastramento de todas as famílias envolvidas. Uma audiência de conciliação foi marcada para o dia 8 de agosto.
A proposta da Fraport em detalhes
Transporte da mudança das famílias cadastradas:
- Quantidade: 932
- Valor por família: R$ 3 mil
- Investimento máximo: R$ 2,8 milhões
Recurso para a compra de móveis pelas famílias cadastradas:
- Quantidade: 932
- Valor por família: R$ 5 mil
- Investimento máximo: R$ 4,7 milhões
Recurso para famílias cadastradas não habilitadas para o Minha Casa, Minha Vida:
- Estimativa: 100
- Valor por família: R$ 80 mil
- Investimento máximo: R$ 8 milhões
Recurso para famílias cadastradas e habilitadas ao Minha Casa, Minha Vida, mas que recusaram voluntariamente:
- Estimativa: 600
- Valor por família: R$ 23 mil
- Investimento máximo: R$ 13,8 milhões
Investimento total proposto: R$ 29,256 milhões