Obter vaga nas Escolas Municipais de Educação Infantil (Emeis) de Porto Alegre é tarefa muito complicada. A chance de pais inscreverem o filho e conseguirem matriculá-lo em uma das 43 instituições da Capital é baixa. Atualmente, três colégios não possuem fila de espera. Do total, 93% têm, em média, 75 crianças aguardando chance de ingresso. Nas 214 escolas comunitárias (administradas por organizações sociais com experiência no ramo e que recebem recursos mensais da prefeitura), onde a oferta de vaga é três vezes maior, a situação muda pouco: 196 delas têm fila de inscritos. No total, há 236 colégios com fila.
Dados da Secretaria Municipal de Educação (Smed), deste mês, apontam que na Zona Sul o problema é mais grave. Os bairros da região concentram 2.595 crianças inscritas em vagas que não existem. Porém, o número das listas de espera não necessariamente reflete o total de crianças sem ensino, já que cada aluno pode ser inscrito em até três instituições. O secretário de Educação da Capital, Adriano Naves de Brito, diz que espera reduzir o problema até o final do ano com abertura de novas vagas e com convênios para ampliar o número de escolas comunitárias.
Na Emei Vila Nova Restinga, que atende 207 crianças, outras 175 estão à espera de matrícula. A fila só anda em caso de transferência ou de desistência. Foi nesse local que Gilviane Gawlinski, 26 anos, inscreveu a filha Maria Eduarda, quatro anos, em novembro passado, sem esperança. Cinco meses depois, o desalento se confirma. Ela procurou outras duas escolas, mas não teve sucesso. Scheila Campos, 32 anos, enfrenta o mesmo problema. Fez inscrição do filho João Vicente, dois anos, nessa mesma escola – e em outras duas – e foi alertada pela direção:
— Disseram que dificilmente eu conseguiria.
As mães, então, recorreram ao Conselho Tutelar, que, por sua vez, cobra a Smed caso a caso. Das 98 requisições de inclusão do órgão na rede escolar feitas à Smed em março, 88 estão sem retorno. As 10 que vieram com resposta trazem como opção colégios a mais de dois quilômetros de distância da casa da criança. Nos casos de negativa, pedidos são encaminhados ao Ministério Público:
— Quem conhece a realidade do território, sabe que indicar escola distante é inviável — diz o conselheiro tutelar Rafael Barros.
O levantamento mostra que a faixa etária que tem maior número de crianças à espera é a de um ano e 11 meses para berçário 2:
— A não inclusão delas na escola muitas vezes as tornam mais vulneráveis a abusos — explica Barros.
O conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e integrante do Comitê Técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa, Cezar Miola, lembra que a fila de inscritos é só uma face da necessidade, já que nesse caso as famílias foram à procura de vaga. Há outro universo de quem não vai, por desconhecimento ou por saber que escolas estão saturadas.
O Plano Nacional de Educação, que determina diretrizes, metas e estratégias para o período de 2014 a 2024, exige que o poder público faça a busca das crianças que estão fora da escola por meio de órgãos públicos e de assistência social.
— As crianças fora da educação infantil são as das famílias mais pobres — considera Miola.
"Pais têm de fazer esforço", diz secretário
O secretário de Educação de Porto Alegre, Adriano Naves de Brito, explica que o problema é grave na Zona Sul pela menor quantidade de instituições para a demanda. Na avaliação dele, isso pode estar ligado ao movimento demográfico das famílias, devido a questões da violência.
Brito afirma que todas crianças em idade de pré-escola (dos quatro aos seis anos) foram encaminhadas para vagas. Desde 2016, o Plano Nacional de Educação exige que 100% de alunos com mais de quatro anos estejam matriculadas. Números da Smed mostram, porém, que existe fila de espera de 2.832 crianças nessa faixa, incluindo o grupo com três anos e 11 meses.
— Muitas delas não foram matriculadas pelos pais. Embora tenham recebido a vaga, muitas vezes não é a escola que queriam. Os pais têm de fazer o esforço de levar a criança à escola — afirma o secretário.
Para ele, ao menos mil crianças estão nessa situação. Brito diz que neste semestre devem ser feitas ações para “melhorar a localização das vagas”, sobretudo nos bairros Partenon e Centro, onde, segundo ele, há maior falta de oportunidades para pequenos de quatro a seis anos.
Atualmente, Emeis atendem sete mil crianças e, escolas comunitárias, 22 mil. Para o secretário, o aumento de vagas passa necessariamente pela expansão da segunda opção, já que não há previsão de construir novas Emeis.
Desde 2017, a prefeitura aumentou em 45% o valor mensal repassado por criança às comunitárias, subindo de R$ 360 para R$ 525. Com isso, passou a ser exigida a contratação de professores nesses locais. As Emeis, por outro lado, são mais onerosas – o custo médio por aluno é de R$ 1.339,88 –, mas há diferenças nos serviços.
Em muitas comunitárias, por exemplo, pais pagam mensalidades para complementar o orçamento da instituição. O secretário nega que haja cobrança, e frisa que a contribuição, se houver, é espontânea. A reportagem ligou para 10 escolas desse tipo. Nove confirmaram que combinam valor de mensalidade com pais na hora da inscrição:
— A cobrança não é necessária e nem é legal. Não temos problema com contribuição voluntária — comenta Brito.