O Ministério Público (MP) concluiu a investigação da Operação Antares, que detectou desvios de R$ 1,7 milhão em pagamentos da Companhia Carris Porto-Alegrense feitos com o uso do nome de uma criança morta aos três anos. Além de denunciar o ex-funcionário da companhia Ivsem Gonçalves e a filha dele, Hellen Gonçalves, a Promotoria Especializada Criminal pediu o compartilhamento de provas com o Ministério Público Eleitoral para verificar possível crime eleitoral na campanha do vereador Pablo Mendes Ribeiro (MDB).
Segundo o MP, três pessoas receberam dinheiro transferido da conta em nome da criança morta e que teria origem em recursos da Carris. Depois de receber os valores, fizeram doações à campanha de Mendes Ribeiro. Ivsem trabalhou na campanha do vereador e, quando a Operação Antares foi deflagrada, estava lotado na bancada do MDB na Câmara Municipal de Porto Alegre por indicação do emedebista.
O promotor Flávio Duarte também pediu o compartilhamento de provas para que a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público analise eventual improbidade administrativa na conduta de Ivsem. O ressarcimento dos valores pagos ilegalmente pela Carris podem ocorrer por meio do bloqueio de bens de Ivsem ou de um pedido em ação cível. Ivsem foi denunciado por peculato, falsidade de documento público, uso de documento falso e lavagem de dinheiro, crime pelo qual sua filha também foi enquadrada. O MP não identificou a participação de outras pessoas na fraude.
Os desvios começaram a ser investigados no ano passado e, em maio, a casa de Ivsem foi alvo de buscas. No local, foram encontrados documentos em nome de Alexandre Marc Klejner, que morreu em 1961. Ivsem, conforme a acusação, assumiu a identidade do falecido em 1996, quando fez carteira de identidade em Santa Catarina usando sua foto e digitais, mas com o nome de Klejner.
O MP afirma que, a partir disso, com o nome da criança, Ivsem abriu conta bancária, fingiu ser advogado, comprou carro e doou dinheiro para campanhas eleitorais do MDB. Para concretizar a fraude, segundo a promotoria, Ivsem, aproveitando o cargo de coordenador de finanças da companhia, falsificou documentos e sentenças judiciais para desviar pagamentos de indenizações feitos pela Carris. Conforme a acusação, Ivsem usou correio eletrônico, sentenças e cálculos judiciais falsos e formulários fraudulentos em nome de terceiros para executar a fraude.
Como são comuns condenações judiciais ou acordos de pagamento por conta de acidentes envolvendo veículos da frota da companhia, Ivsem, a partir de documentos fraudados, teria direcionado pagamentos para ele próprio. O principal nome usado foi o de Klejner, cuja conta bancária seria controlada por Ivsem. Quando o dinheiro não era depositado na conta do morto, cheques descontados tinham endosso também para o nome de Klejner. Em duas situações, segundo a investigação, o ex-funcionário da Carris passou valores desviados para a conta da filha, que também foi denunciada.
Ao MP, Ivsem admitiu ter feito toda a fraude sozinho motivado por supostas dificuldades financeiras.
Ivsem tem trajetória ligada ao MDB
- Ivsem foi nomeado para a Carris em 2014 por indicação do gabinete do então prefeito José Fortunati na cota do MDB. A admissão na companhia ocorreu em 24 de novembro de 2014. Ele ingressou como coordenador de almoxarifado e passou a coordenar a unidade de finanças menos de três meses depois do ingresso, em 3 de fevereiro de 2015.
- Deixou a Carris em março de 2017. Ao longo daquele ano, ingressou com ação trabalhista contra a empresa pedindo a nulidade do contrato de trabalho por prazo determinado, o que possibilitaria a ele receber verbas rescisórias pela demissão, e também o pagamento de horas-extras. O pedido inicial foi de R$ 100 mil.
- Em dezembro do ano passado, Ivsem foi nomeado assistente especial na Casa Civil do governo José Ivo Sartori, com salário bruto de R$ 7,5 mil - a indicação foi do vereador Pablo Mendes Ribeiro.
- Em abril, assumiu vaga de assessor parlamentar da bancada do MDB na Câmara de Vereadores também por indicação do vereador. Depois de desencadeada a Operação Antares, Ivsem foi exonerado da Câmara e o partido anunciou processo de expulsão. Ele já foi desligado do partido.
Contrapontos
O que dizem Ivsem e Hellen Gonçalves
O advogado Cesar Peres afirma que espera ter acesso à denúncia para depois se manifestar.
O que diz o vereador Pablo Mendes Ribeiro
Sempre fiz questão de frisar que todas as doações deveriam ser informadas, como determina a lei, a Justiça Eleitoral, demonstrando a transparência com que os recursos foram arrecadados e utilizados. E, justamente, por conta disso, é que acredito que o Ministério Público tenha conseguido identificar o caso, com o qual não compactuo.