— Eu me sinto tão vítima quanto a Carris e quanto a administração pública. Fui ludibriado.
Assim o advogado e coronel da reserva da Brigada Militar Vidal Pedro Dias Abreu, filiado ao PDT, explica como R$ 1,7 milhão de indenizações por acidentes foi desviado da Carris sem que ele, como diretor, detectasse a fraude nos processos de pagamentos.
GaúchaZH conversou com o ex-diretor administrativo e financeiro, que é investigado pelo Ministério Público. Nesta terça-feira (15), ele prestará depoimento na Promotoria Especializada Criminal. Abreu contou que era o penúltimo a assinar a documentação que autorizava pagamentos:
— Eu assinava depois de passar por vários setores da casa e, depois de mim, ia para o presidente.
O ex-diretor explicou que os processos eram acompanhados por um escritório de advocacia e, quando havia condenação, o escritório enviava as informações sobre valores e formas de pagamento à procuradoria da Carris. Na procuradoria, conforme Abreu, os servidores, inclusive advogados, faziam os trâmites, assinavam documentos, produziam e remetiam para avaliação do procurador.
— O procurador assinava, avalizava e mandava para mim. Eu era a penúltima pessoa. E o presidente costumava dizer: eu só assino depois que o Vidal assinar. Muitas destas sentenças eu acompanhava (de valores mais altos), outras tantas eram corriqueiras — explica o ex-diretor.
Para Abreu, checagens para constatação de que havia processos inventados e diversas informações falsas deveriam ser feitas pela procuradoria. Sobre cheques destinados a determinados beneficiários e depois endossados em nome de Alexandre Marc Klejner (uma criança que morreu em 1961), o que permitiu que o então funcionário Ivsem Gonçalves fizesse os saques, o ex-diretor disse se tratarem de uma anormalidade.
— Não era um procedimento comum. Não me lembro de ter endossado cheques. Se houve endosso, como dizem as reportagens, não tinha minha assinatura e eu não tinha conhecimento. Todos os cheques, para serem descontados, tinham que ter duas assinaturas, a minha e a do presidente. Quando eu estava fora, havia outro diretor que podia assinar, mas sempre eram duas assinaturas. Era uma forma de segurança da administração — detalhou.
De fato, os cheques emitidos pela Carris para pagamentos costumam ter duas assinaturas. Abreu foi colocado na Carris pelo então prefeito José Fortunati (na época, filiado ao PDT; hoje, no PSB):
— Me lembro até hoje o prefeito Fortunati me ligando e me convidando. Ele brinca que eu titubeei. Nunca trabalhei no serviço público, numa empresa ou administração direta. Acho que fiz um bom trabalho, acho que tomamos medidas sérias. A Carris é muito problemática. Minha vida foi trabalhar com gente, com recursos humanos. E vi que as pessoas que vão para lá (Carris) não sabem. Não sabem dizer não, qualquer reivindicação tu aceitas, é difícil dar ordem, mas o mandar tem responsabilidade, e isso a Brigada me ensinou, eu sempre soube fazer, e lá encontrei dificuldade com isso.
Foi Abreu que indicou Pedro Osório Rosa Lima para assumir como procurador.
— Eu precisava ter alguém da minha confiança — afirmou.
Na época, eles trabalhavam juntos em um escritório de advocacia e hoje, seguem como sócios. Os dois prestarão depoimento ao MP nesta terça-feira na condição de investigados.