A 58ª edição da Feira do Livro de Porto Alegre acontece até o próximo domingo. A maioria dos porto-alegrenses têm uma relação afetiva de anos com o evento, seja pela programação, pela oportunidade de encontrar seu autor preferido, pela chance de garimpar achados nos balaios por preços módicos ou apenas por passear entre os jacarandás floridos em uma tarde de sol.
Perguntamos aos colunistas de Zero Hora quais as boas lembranças que a Feira do Livro traz para eles. As respostas você lê abaixo:
"Lembro da Feira desde a minha primeira infância, quando meu avô me levava à praça. Naquele tempo, parecia tudo muito tranquilo e ensolarado, não sei se porque era outra época ou se porque a gente idealiza as coisas do passado. De qualquer forma, na minha memória aquelas tardes eram muito suaves, meu avô me falava dos livros, eu olhava em volta e ficava pensando: quantas histórias... Será que alguém algum dia leu todas essas histórias?"
David Coimbra - editor executivo de Esportes e colunista de Zero Hora
"Tantas vezes fui à Feira do Livro, algumas para autografar livros meus, quando senti com profundidade o carinho das pessoas que entravam na fila extensa e demorada para conversar comigo, pagando ainda pelo livro que escrevi. Pode haver maior alegria no coração da gente do que isso? Além disso, pode haver lugar de maior confraternização e unção cultural que a Feira do Livro? A gente fica tão enlevado lá que nos dá vontade de instalar uma cama na praça e morar lá"
Paulo Sant'Ana - colunista de Zero Hora
"Frequento a Feira do Livro desde 19... bem, isso não vem ao caso, né? O que importa é que não consigo olhar para trás e não ver a Praça da Alfândega cheia de gente entre as barracas ocupando minhas lembranças mais cálidas. Da época em que nem tinha altura suficiente para fuçar os volumes no balcão dos estandes até hoje em dia, uma vida - a minha - se passou. Das recordações mais variadas que a Feira do Livro sempre me evoca, uma se sobressai por ter a solenidade das experiências eternas e transcendentes - apesar de a imagem, na verdade, ser das mais prosaicas: um velhinho circulando sem pressa pelas barracas, terno meio surrado, sacola de feira de plástico no braço, olhar vagabundeando pelas lombadas enfileiradas.
- Olha ali o Mario Quintana! - sempre exclamava alguém.
Testemunhar na infância o poeta ali à toa, anônimo como um cidadão, anjo disfarçado de transeunte, me abriu os olhos de menino: naquela praça acontecem coisas muito especiais."
Roger Lerina - colunista da Contracapa do Segundo Caderno
"São tantas as boas lembranças dos meus 33 anos de Feira do Livro que é difícil eleger a melhor. Foi emocionante quando o interesse dos meus filhos saiu da Praça de Alimentação para as bancas de livros infantis. Especial nas vezes em que fiz papel de anfitriã nas sessões de autógrafos de meu marido, Tailor Diniz. Inesquecível quando fiquei mais de uma hora na fila para ganhar o autógrafo de Mario Vargas Llosa e quando li 87 páginas de Luis Fernando Verissimo enquanto esperava chegar a minha vez de receber a assinatura do nosso genial escritor. Mas há também um momento triste, meio cinematográfico, que ficou para sempre na memória. Foi no início dos anos 80. Eu e Tailor trabalhavámos na Rádio Guaíba, saíamos no início da madrugada e eu tomava um ônibus para Petrópolis na Praça XV. Quando atravessamos a Praça da Alfândega, deparamos com um cenário assustador: um temporal tinha destruído dezenas de barracas e o vento espalhara livros por toda a praça. Ali jaziam, encharcados, Josué Guimarães, Mario Quintana, Erico Verissimo e tantos outros autores da minha lista de estimação. Tive vontade de passar a noite ajudando a salvar os náufragos, mas segui meu caminho para não perder o ônibus. Sim, era um tempo em que se podia andar de ônibus sem medo nas madrugadas de Porto Alegre."
Rosane de Oliveira - editora de Política e colunista da página 10 de Zero Hora
"Nestas tantas Feiras do Livro que já fui - e não perco uma, diga-se de passagem - a imagem que mais recordo não é exclusivamente minha. Era o 'compromisso' anual e sagrado de meu pai, Hugo, e minha mãe, Lúcia, que não perdiam, por nada deste mundo, um passeio às barraquinhas em meio aos jacarandás floridos. Dias antes de começar a Feira, eu já os escutava falar da visita, discutir o que iriam comprar para eles, filhas e, depois de algum tempo, netos. Era meu pai conversando sobre as obras que o interessavam, da fascinação por grandes clássicos, enquanto minha mãe planejava o próximo livro de Proust da coleção Em Busca do Tempo Perdido. Esta tradição familiar é quase uma característica de muita gente que mora em Porto Alegre: pais incentivando o prazer da leitura aos filhos, por meio dos passeios na feira. E, depois, eles vão passando às novas gerações, como é o caso lá de casa."
Maria Isabel Hammes - colunista do Informe Econômico de Zero Hora
"Tive 3 experiências marcantes na Feira do Livro. A primeira, quando ainda nem tinha minha filha nem era casada, foi ter ganhado de presente uma coletânea em inglês e espanhol do poeta Walt Whitman, que só tinha na Palmarinca e, para meu bolso de estagiária, era uma fortuna. Um admirador descobriu meu desejo e me deu de presente. Guardo com carinho aquelas Folhas de Relva. A outra foi poder ter passado horas a fio navegando pelas bancas e bebendo cerveja com o inesquecível Ricardo Carle, falecido, então editor do caderno de Cultura. Acho que na Feira dos antigos tempos as prosas e os versos entre amigos falavam mais alto do que os descontos dos balaios. E a terceira, já com uma filha de 3 anos, foi tê-la visto se apaixonar por um livro, na ala infantil, e ali mesmo, no chão do Cais do Porto, folheá-lo avidamente do início ao fim."
Milena Fischer - colunista do Segundo Caderno
"Não lembro da minha primeira Feira do Livro, nem da de meu filho mais velho. Mas meu celular ainda guarda uma foto feita em 13 de novembro de 2010: o mais novo, então com 10 meses, seguro pelas mãos da mãe no banco da Praça da Alfândega entre as imagens de Drummond e Quintana. A Praça estava em reforma, cheia de tapumes e andaimes, o trânsito entre as barracas ainda mais difícil do que de costume, mas tudo vale a pena quando se registra os primeiros passos de um futuro leitor".
Luiz Araújo - colunista de Zero Hora