Em busca de protagonismo e de aproximação com o governo Lula, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tem acumulado derrotas e sido ofuscado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), com quem trava uma "queda de braço". Desde o início do ano legislativo, o Senado não conseguiu entrar no eixo do debate político e da discussão sobre os rumos do país, e tem se dedicado a análises de projetos com menos relevância.
Até mesmo as principais "batalhas" do momento no Legislativo, como a da instalação das comissões parlamentares de inquérito para investigar os ataques de 8 de janeiro e o Movimento dos Sem Terra (MST), estão com os holofotes voltados para os deputados.
A CPMI dos Atos Golpistas, por exemplo, poderia ter ficado no Senado — onde, aliás, o governo teria mais controle. Mas, mesmo com todos os movimentos de Pacheco para protelar a sua criação, a ação de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) levou a um cenário que obrigou os petistas a se articularem para não deixar a oposição dominar por completo o colegiado.
A senadora Soraya Thronicke (União-MS) coletou assinaturas para uma criação da CPI e expediu um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) contra Pacheco por não pautar o requerimento. Pacheco se defendeu dizendo que não instaurou a CPI porque o pedido foi feito em janeiro, e o regimento interno do Senado proíbe que as comissões parlamentares se estendam por mais de uma legislatura. Soraya repudiou avaliações de que teria de coletar novos apoios ao requerimento porque seu pedido não tinha mais validade.
— Eu não sou palhaça — reagiu Thronicke, em março. — Será que eles (os governistas) preferem uma CPMI enviesada, controlada por um deputado investigado, que já tem respostas prontas? — questionou ainda a senadora, numa referência a André Fernandes (PL-CE).
Autor do requerimento de criação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) de 8 de janeiro, Fernandes é investigado no Supremo Tribunal Federal pelo envolvimento nos ataques aos prédios dos três Poderes. A oposição logo desmobilizou o requerimento de Soraya e se articulou para coletar assinaturas para a CPMI, com deputados e senadores.
Criada na semana passada em sessão do Congresso, a comissão foi adiada duas vezes por Pacheco — uma justificada pela viagem à China, ao lado de Lula, e outra acatando pedido de líderes do governo, sob a alegação de que o piso salarial de enfermeiros precisaria passar na Comissão Mista de Orçamento (CMO) antes de ter o veto avaliado na sessão do Congresso.
Pacheco já afirmou algumas vezes que o governo errou ao não defender a proposta inicial de CPI.
— Na minha opinião, o governo deveria ter apoiado desde o primeiro momento. Teria sido algo correto e um acerto político — afirmou o senador.
O Senado terá a volta dos parlamentares que participaram da CPI da Covid, mas a Câmara deverá trazer tumulto à nova comissão. O PT e o PL planejam contar com a participação de deputados polêmicos para controlar a narrativa nas redes. André Janones (Avante-MG), conhecido por suas táticas de "guerrilha virtual", pretende participar, assim como Duarte Jr. (MA), indicado pelo PSB, um dos protagonistas do tumulto generalizado na Comissão de Segurança Pública na Câmara que levou ao encerramento antecipado da audiência do ministro da Justiça, Flávio Dino.
A oposição, do outro lado, pretende levar para o colegiado o próprio Fernandes como titular, e Nikolas Ferreira (MG) como suplente. Todos eles têm forte presença nas redes e já se envolveram em polêmicas nestes primeiros três meses de mandato.
Matérias apreciadas
O Senado apreciou, em plenário e em comissões, 111 matérias, muitas com pouca relevância. Foram aprovados projetos como o que dá à cidade de Antonina (PR) o título de "capital nacional da bala de banana" e a Cruz Machado (PR) o de "capital nacional da erva-mate sombreada".
Pacheco incluiu também na pauta do plenário projetos que dão nome para agências do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Um deles muda o nome da unidade em Santa Isabel (SP) para "Agência Prefeito Nenê Simão". No mesmo Estado, em Guararema, muda o nome da unidade do INSS para "Agência Luiz Antonio Serrano"
Desde o início desta legislatura, em fevereiro, o plenário da Casa aprovou uma matéria a menos que a Câmara (44 a 45). Em conversas reservadas, senadores apontam Pacheco como o responsável pela "lentidão" para votar projetos importantes que poderiam alavancar a participação do Senado na discussão tributária. Há na Casa uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre o tema, que não tem relator.
Para Pacheco, o retorno à atividade presencial levou o Senado a ter uma atividade "menos célere", o que, para ele, não é ruim.
— Mais etapas do processo legislativo significam mais amadurecimento. A qualidade de uma casa legislativa se mede pelo que se produz, mas também pelo que se deixa de produzir — disse.
Taxa de juros
O presidente do Senado também trava uma queda de braço com Arthur Lira e faz sinalizações de apoio a Lula, ainda que não tenha protagonismo neste momento. A taxa de juros é a principal pauta que Pacheco tenta atuar em consonância com o presidente.
Desde março, ele mobilizou o Senado para discutir a taxa de juros, que está em 13,75%. Em 27 de abril, o Senado reuniu os ministros Fernando Haddad (Fazenda) e Simone Tebet (Planejamento) para ficar frente a frente com o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto.
O episódio ajudou governistas a bombardear a diretriz do Comitê de Política Monetária (Copom), como fez Cid Gomes (PDT-CE), que criticou Campos Neto usando um quadro negro e giz.
— Senhor presidente, com todo respeito, me perdoe. Mas nessa hora eu queria lhe fazer uma sugestão. Pegue seu bonezinho e peça para sair, por favor — disse o parlamentar cearense.
Na semana anterior, Pacheco defendeu a queda da taxa de juros na abertura do Lide Brazil Conference, em Londres, também com a presença de Campos Neto.
— Continuo defendendo a autonomia do Banco Central, mas precisamos encontrar um caminho para a redução imediata da taxa de juros. Esse é o desejo da economia e do mercado — destacou na ocasião.
O presidente do Senado ainda trava um jogo de forças com Arthur Lira sobre o rito de tramitação das medidas provisórias, onde tenta retomar o protagonismo do Senado diante de um presidente da Câmara que acumula poderes.
Em março, Pacheco acatou uma questão de ordem de Renan Calheiros (MDB-AL), que pedia o retorno das comissões mistas, e levou adiante o desejo de líderes do Senado, descontentes com a relevância que Lira ganhou com o regime de tramitação especial adotado durante a pandemia de covid-19.
Desde então, Lira fez constantes ameaças ao ordenamento das comissões e personalizou o debate em Renan e em Davi Alcolumbre (União-AP), padrinho político de Pacheco.
— O Senado não pode ser refém de Alagoas ou do Amapá. O Senado é muito maior, é uma casa federativa que representa todos os Estados — atacou Lira.
Pacheco conseguiu retomar o rito de tramitação das medidas provisórias, mas Lira bateu o pé e convenceu o governo a retirar algumas delas e substituí-las por projetos. Até agora, o Congresso instalou três comissões mistas para discutir três MPs do governo Lula: o novo Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida e a reformulação da estrutura do governo.