Dois parentes de um ex-vereador preso sob acusação de integrar uma milícia ganharam cargos na Prefeitura de Belford Roxo, no Rio de Janeiro, comandada por Wagner dos Santos Carneiro, o Waguinho (União Brasil), marido da ministra do Turismo, Daniela Carneiro (União Brasil). Ela é alvo de pressão desde que foi revelado o vínculo que seu grupo político mantém há ao menos quatro anos com a família de outro miliciano, o ex-PM Juracy Prudêncio, o Jura. As informações são do jornal Folha de São Paulo.
A irmã, Rosimery, e o pai, Aracimy, do terceiro-sargento bombeiro Márcio Pagniez, o Marcinho Bombeiro, foram nomeados em dezembro de 2021 e agosto de 2022, respectivamente, após a prisão do parente, em outubro de 2019.
Os dois também tiveram participação ativa na campanha da ministra no ano passado e foram anfitriões de um comício no bairro em que, segundo o Ministério Público, atuava a chamada Tropa do Marcinho.
Denúncias
Marcinho Bombeiro era presidente da Câmara Municipal de Belford Roxo até setembro de 2019, quando foi denunciado sob acusação de homicídio e de liderar uma milícia que, de acordo com a Promotoria, agia "com extrema violência e ostentando armas de fogo de grosso calibre pela localidade".
Ele foi preso preventivamente no mês seguinte, em outubro de 2019, sob acusação de tentar matar testemunhas de homicídio pelo qual foi acusado. Meses antes das denúncias, ele gravou um vídeo em apoio à ministra, em sua primeira disputa por uma cadeira na Câmara dos Deputados.
A Prefeitura de Belford Roxo disse, em nota, que, independentemente de "possíveis atos cometidos pelo parente", nada desabona a conduta de Rosimery e Aracimy, – a irmã e o pai de Marcinho Bombeiro, respectivamente.
Rosimery também se apresenta desde setembro de 2021 como despachante nas redes sociais. O município afirmou que a atuação como documentalista "pode ser exercida fora do horário de trabalho".
A ministra reafirmou, em nota, que "não compactua com qualquer ato ilícito e cabe à Justiça o papel de julgar e punir. Por fim, esclarece que em sua campanha, em 2022, recebeu o apoio de milhares de eleitores em diversos municípios do estado".
A reportagem não conseguiu contato com a defesa do ex-vereador. Num dos processos a que responde, ele negou a autoria dos crimes.
Ministra sob pressão
Daniela Carneiro é alvo de pressão desde que foi revelado o vínculo que seu grupo político mantém há ao menos quatro anos com a família de outro miliciano, o ex-PM Juracy Prudêncio, o Jura. Ele atuou diretamente na campanha dela, em 2018, quando já estava condenado a 26 anos de prisão por homicídio e associação criminosa.
Daniela foi nomeada ministra como uma forma de contemplar a União Brasil e ampliar a presença feminina na montagem do governo.
Também foi uma retribuição pelo empenho dela e do marido na campanha do segundo turno em favor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O casal foi uma das poucas lideranças a apoiar abertamente o petista na Baixada Fluminense.
Daniela foi reeleita deputada federal como a mais votada no Rio de Janeiro. Reportagens veiculadas em outubro mostraram que a campanha dela foi marcada pelo apoio irregular de oficiais da Polícia Militar e pelo ambiente hostil e armado contra adversários políticos de sua base eleitoral.
Um dos atos de campanha deste ano de Daniela, em 6 de setembro do ano passado, ocorreu no bairro Andrade Araújo, em Belford Roxo. Era neste bairro que, de acordo com o Ministério Público, o ex-vereador tinha uma milícia. O encontro teve como anfitriões Rosimery, Aracimy e Matheus Pagniez – irmã, pai e filho de Marcinho Bombeiro.
Após o contato da reportagem, a ministra apagou o registro que havia feito do encontro em suas redes sociais. As fotos, porém, seguem disponíveis na página do deputado estadual Márcio Canella (União Brasil), com quem Daniela fez "dobradinha" nas eleições de 2018 e 2022.
Nesta quinta-feira (5), após contato da reportagem, a ministra também apagou vídeo no qual o miliciano preso declara voto nela nas últimas eleições.
Homicídio cometido por ex-vereador
A Promotoria afirma que Marcinho matou, junto com três comparsas em abril de 2017, dois homens por serem usuários de maconha.
De acordo com a polícia, em outubro de 2019, logo após ter sido denunciado, Marcinho Bombeiro tentou, junto com um policial militar, matar o irmão de uma das vítimas e dois amigos. Um deles foi baleado no rosto e fugiu ao saltar de uma ribanceira na cidade.
Entre o homicídio e a tentativa de assassinato, Marcinho se manteve como presidente da Câmara Municipal e atuou na campanha da ministra.
"Muito obrigada pelo apoio e confiança, meu amigo Marcinho Bombeiro, presidente da Câmara Municipal de Belford Roxo. Juntos vamos mudar a realidade de toda a Baixada Fluminense, em especial da nossa querida cidade", agradeceu ela, em suas redes sociais.
Mesmo na cadeia, Marcinho Bombeiro manteve sua atividade política. Ele se candidatou em 2020 a vereador na cidade e obteve 1.946 votos.