
Após ter acessado e analisado o processo contra o prefeito afastado de Cachoeirinha, Miki Breier (PSB), o advogado César Peres rebateu comentários do procurador-geral de Justiça, Marcelo Dornelles, a respeito da existência de provas em imagens que mostrariam o político recebendo valores de empresas contratadas para a prestação de serviços no município.
Peres afirma não existir qualquer referência a isso nas peças acusatórias do Ministério Público que tramitam na 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça, colegiado que autorizou a operação de buscas no dia 30 de setembro e determinou o afastamento de Miki do cargo por 180 dias. O advogado confirma que há referências a encontros do prefeito com empresários, mas diz que será possível provar terem se tratado de “reuniões republicanas”.
Procurado por GZH para comentar as declarações da defesa, o procurador reafirma que existem filmagens e provas de que o prefeito teria recebido R$ 40 mil de um dos empresários investigados por um intermediário (leia a íntegra da nota ao final da entrevista).
Confira abaixo a entrevista com o advogado César Peres, responsável pela defesa de Miki:
O senhor, como parte de defesa, teve acesso aos autos do processo. Qual sua avaliação sobre o que consta contra o prefeito afastado Miki Breier?
O que se tem até agora, e que certamente será explicado pelo prefeito no processo, são encontros que ele tem com empresários e pessoas da comunidade. Miki é nascido em Cachoeirinha, é de muitas relações na cidade, tem empresários que o apoiaram na campanha, que são amigos dele. Há encontros do Miki com empresários, seja no gabinete ou fora dele. Isso certamente será explicado no processo. Me causou enorme perplexidade quando tomei conhecimento de que não é verdade, e mais do que isso, são levianas as afirmações do procurador-geral de Justiça (Marcelo Dornelles), no sentido de que havia malas de dinheiro, sacolas de dinheiro, imagens do prefeito recebendo dinheiro de empresários. Isso não existe nos autos.
O senhor está afirmando que não há, nos autos, nenhuma fotografia ou vídeo do prefeito recebendo propina de empresários?
Sim, estou dizendo isso. E, menos ainda, existem malas de dinheiro. O que foi apreendido nesta segunda operação foi dinheiro que havia na casa do prefeito, cerca de R$ 8 mil, que era direcionado ao pagamento de pedreiros que estavam fazendo uma obra para a primeira-dama. O prefeito ganha R$ 20 mil por mês (o valor bruto correto é de R$ 19 mil ao mês). Não é nada que pudesse, nem de longe, sugerir mala de dinheiro ou encher uma sacola ou mochila. Essa afirmação, vinda do procurador-geral, de que havia malas, é um despropósito, seja com a parte processada, seja com a opinião pública, que está sendo enganada, seja com a imprensa, que é induzida em erro.
Como há sigilo no caso, o MP pode ter separado e protegido essas provas de imagem, do suposto recebimento de propina, de forma que não tenha chegado ao senhor pelos autos?
O prefeito me diz, e não tenho porque duvidar da palavra dele, que isso não existe, que é uma invenção. Agora, se isso existe nos autos e está escondido da defesa, aí é pior. É um ilícito processual. Existe até uma súmula vinculante do STF dizendo que a defesa tem o direito de ter acesso a todas as informações e diligências que já foram produzidas. O acesso é pleno a todas provas já produzidas. Se fosse diligência em andamento, uma busca e apreensão a ser feita, o MP não precisaria mostrar à defesa. Ou um grampo telefônico, que poderia prejudicar a diligência. Mas, se já foi feito, o MP não tem o direito de proteger essa prova. Seria ilícito processual. Não acredito que o MP vá se prestar a isso. E não tenho motivo para duvidar da palavra do prefeito.
Caso confirmado o cenário trazido pelo senhor, teria sido uma impropriedade do procurador-geral de Justiça?
Impropriedade é uma palavra generosa da tua parte. Uma impropriedade a partir da qual ele induziu em erro a opinião pública e a imprensa. Uma narrativa que pode redundar, sim, em uma representação contra ele no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
O senhor diz que constam nos autos alguns encontros do prefeito com empresários dentro e fora da prefeitura. Esses que foram fora, ocorreram em quais circunstâncias? Foram de cunho pessoal, como um jantar, ou reuniões de trabalho fora da prefeitura?
As pessoas se encontram, o prefeito continua vivendo. Ele tem conhecidos, amigos. Ele nasceu em Cachoeirinha, conhece todo mundo. Isso ele vai explicar, certamente, no âmbito do processo. Não tenho o teor dessas conversas. O que ele me diz é que são conversas pessoais, particulares. Isso vai ser melhor deslindado na instrução do processo. O que acho é que houve um excesso de acusação. Não dá para jogar lama sob a rubrica de fortalecer a tese acusatória e criar um factóide. Isso é gravíssimo.
Do ponto de vista da defesa, o senhor já tem convicção de que esses encontros do prefeito com empresários foram republicanos ou ainda precisa esclarecer?
Não tenho motivo para duvidar da palavra do prefeito. Eu não estava presente nos encontros, então não sei o que foi dito entre ele e os amigos e as pessoas com as quais se encontrou. Mas o Miki tem uma história, acredito na palavra dele. Ele diz que são conversas com pessoas que ele conhece e com as quais ele convive.
O afastamento de um prefeito no exercício do cargo é uma medida rara, geralmente usada em situações extremas. O MP disse que teve de requerer o afastamento porque, mesmo sabendo que era investigado após uma primeira fase da operação (Proximidade), o prefeito teria continuado a praticar delitos. Como avalia?
Uma parte da Operação Ousadia se baseia no que foi apreendido no telefone dele com relação a fatos que ocorreram antes. Eram fatos anteriores e que apuraram a partir da apreensão de celulares (na primeira fase da operação, denominada Proximidade). E, de fato, o prefeito continuou fazendo as licitações que eram necessárias e emergenciais para a cidade. Ele continuou fazendo aquilo que acreditava ser certo e lícito, de forma aberta. Por isso, não se preocupou e continuou fazendo, mesmo sabendo que estava sendo monitorado, na convicção de que estava trabalhando de forma lícita. A cidade não pode parar. A limpeza urbana não pode parar. E ele continuou fazendo o que entendia que era legal. E pretende provar agora em juízo. O Miki é uma pessoa inteligente. Sabendo que estava sendo monitorado, ele não cometeria ilícitos em um ambiente como esse. O que ele fazia, ele fazia na administração da prefeitura, de forma limpa e honesta.
Conforme o MP, as principais suspeitas recaem sobre a contratação da empresa SKM Empreendimentos e Comércio para prestação de serviço de limpeza urbana. Há apontamentos de irregularidades em dispensa de licitação, superfaturamento e um suposto desvio de R$ 3,2 milhões. Qual a relação do prefeito com essa empresa?
Esse é o ponto nodal. Mas há citação de outras empresas, especialmente nessa segunda fase. A primeira fase foi em relação à SKM, a Operação Proximidade. E a nova, a Operação Ousadia, já envolve outras empresas. A afirmação do MP é de que o Miki, apesar de estar sendo monitorado, continuou operando com novas empresas. Tem citação há mais duas ou três que ele teria mantido relação. São relações republicanas porque a cidade não pode parar. Miki não estava impedido de ser prefeito. Eram relações às claras.
Antes da investigação do MP, houve diversos apontamentos pelo setor de auditoria do Tribunal de Contas do Estado sobre possíveis irregularidades nesses contratos com a SKM, como sobrepreço e dispensas de licitações. Pode ser um agravante para as argumentações de defesa?
É difícil que um administrador, hoje em dia, não tenha de dar explicações aqui ou ali ao Tribunal de Contas. E faz bem o TCE ao apurar dessa maneira. O Miki terá de explicar isso e superar essa eventual dúvida. É claro que nós vamos ter que enfrentar essa situação, mas não nos causa maiores preocupações na medida em que temos segurança de que ele agiu de forma republicana.
Como está o ânimo do prefeito Miki nesses primeiros dias de afastamento do cargo?
O prefeito está muito triste com o que aconteceu, não poderia ser diferente. Mas está sereno, na certeza de que vai provar que é inocente.
Como o senhor pretende atuar em relação ao afastamento pelo prazo de 180 dias, por decisão da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça?
Respeitamos a decisão judicial, embora tenhamos divergência. Vamos tomar as medidas, em seguida, para reverter esse quadro, seja aqui (RS) ou em Brasília.
Sobre as declarações do advogado César Peres, o procurador-geral de Justiça, Marcelo Dornelles, manifestou em nota:
"O Ministério Público, efetivamente, dispõe de filmagem do prefeito municipal ingressando no condomínio de um dos empresários investigados na cidade de Gravataí em período próximo ao qual esse havia ordenado diversos saques em suas contas bancárias, dentre eles, um no valor de R$ 40.000,00, pois precisava viajar para o RS (Embora tenha moradia em Gravataí, o referido empresário é de Curitiba). Passados seis dias, na primeira fase da Operação Proximidade, foram realizadas buscas na casa do prefeito municipal e, nessa oportunidade, há registro, em áudio e vídeo, do prefeito municipal admitindo que manteria, em casa, em espécie, os mesmos R$ 40.000,00, os quais se prontificou a entregar. De forma complementar, foram localizadas mensagens trocadas pelo empresário denunciado e uma funcionária ajustando a entrega, na residência do prefeito municipal, dos R$ 40.000,00 que estariam na sua posse. A entrega foi confirmada porque se localizou o registro de autorização dado por Miki Breier para o ingresso dessa funcionária no seu condomínio e essa, na sequência, confirmando para o empregador que havia dado tudo certo na casa do Miki".