Em uma derrota para o Palácio do Planalto, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (14) confirmar a decisão individual do ministro Luís Roberto Barroso que abriu uma crise com o presidente Jair Bolsonaro e mandou o Senado instalar uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para apurar a gestão da pandemia pelo governo federal.
Por 10 a 1, os ministros decidiram que o Senado tem de instalar a CPI, mas cabe à própria Casa definir como devem ser executados os trabalhos do grupo, se presencialmente, por videoconferência ou modelo híbrido.
— O procedimento a ser seguido pela CPI deverá ser definido pelo próprio Senado, diante das regras que vêm adotando para o funcionamento dos trabalhos na pandemia. Não cabe ao Senado decidir se vai instalar ou quando vai funcionar, mas sim como vai proceder — frisou Barroso.
O julgamento foi rápido. Apenas se manifestaram oralmente Barroso, o ministro Gilmar Mendes, em apoio à decisão do colega, e o ministro Marco Aurélio Mello. O decano ficou vencido porque entendeu que não caberia ao plenário, por questões técnicas, referendar ou não a decisão de Barroso.
— Não cabe referendar ou deixar de referendar uma liminar, que noticiada pela imprensa, já surtiu efeitos porque o presidente do Senado retirou da gaveta — e não devia ter colocado na gaveta — disse Marco Aurélio.
A determinação de Barroso, assinada na última quinta-feira, enfureceu Bolsonaro, que atacou o ministro, acusando-o de "militância política" e "politicalha" por ter determinado a abertura da CPI. A comissão tem potencial para desgastar ainda mais a imagem do governo em um momento de agravamento da pandemia e queda de popularidade do chefe do Executivo.
Em uma rápida leitura de voto, Barroso frisou que "decisões políticas devem ser tomadas por quem tem voto".
— Todavia, neste mandado de segurança, o que está em jogo não são decisões políticas, mas o cumprimento da Constituição. O que se discute é o direito de minorias políticas parlamentares fiscalizarem o poder público, diante de uma pandemia que já consumiu 360 mil vidas apenas no Brasil com perspectiva de chegar à dolorosa cifra, ao recorde negativo, de 500 mil mortos — disse Barroso.
— CPI não tem apenas o papel de investigar, no sentido de apurar coisas erradas, elas têm também o papel de fazer diagnósticos dos problemas e apontar soluções. Aliás, nesse momento brasileiro, esse papel construtivo e propositivo é o mais necessário. CPIs fazem parte do cenário democrático brasileiro desde o início da vigência da Constituição, aliás, desde antes. Não se está aqui abrindo exceção, faz parte do jogo democrático desde sempre as comissões parlamentares de inquérito — acrescentou.
Barroso destacou que no governo Collor, foram abertas 29 CPIs, a mais conhecida a que mirou PC Farias. Nos governos FHC e Lula, por sua vez, o número de CPIs foi de 19 em cada gestão.
Na quinta-feira (8) passada, Barroso havia determinado, em decisão liminar, que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), instalasse a comissão.O ministro concedeu liminar em mandado de segurança apresentado em março pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jorge Kajuru (Cidadania-GO).
Na terça-feira (13), Pacheco oficializou a abertura da CPI, que irá apurar dois pontos: a atuação do governo federal na pandemia e a destinação de verbas federais a Estados e municípios. O próximo passo é a indicação dos integrantes do colegiado.
Em um primeiro momento, o julgamento foi pautado no plenário virtual, ferramenta que permite aos ministros analisarem os processos e incluírem os votos na plataforma digital, sem necessidade de reunião. No entanto, após conversas entre os membros do tribunal e considerando a repercussão do tema, o presidente do STF, Luiz Fux, decidiu antecipar o julgamento e transferir a discussão para a sessão colegiada por videoconferência.