Embora o ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), tenha pedido vista (mais tempo para análise) do recurso apresentado pela defesa ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para que o ex-juiz Sergio Moro seja declarado suspeito no processo do triplex do Guarujá, o colega Ricardo Lewandowski decidiu adiantar o voto na sessão da Segunda Turma desta terça-feira (9).
O posicionamento do ministro foi para declarar a suspeição e decretar a nulidade integral de todos os atos processuais proferidos por Moro nas ações penais envolvendo Lula.
— Não há dificuldade em identificar a indisfarçável parcialidade de todos os atores que levaram à condenação do paciente. Comparando-se à miríade de atos processuais heterodoxos e fatos subservientes, não há como deixar de concluir que restou escancarada uma devida confusão entre as atribuições de julgar e acusar por parte do magistrado Sergio Moro. E o pior: confusão esta motivada por razões mais que espúrias, sim, pois todos os desdobramentos processuais e extraprocessuais levam ao inexorável desenlace no sentido que o ex-juiz extrapolou os limites da função jurisdicional ao assumir o papel de verdadeiro coordenador dos órgãos de investigação e acusação em paralelo às funções de julgador. Ficou patenteado abuso de poder. Não é só suspeição, mas abuso de poder — concluiu.
Lewandowski disse ter preparado uma manifestação de 80 páginas, que no entanto não foi lida integralmente na sessão. O magistrado preferiu destacar os pontos considerados mais 'relevantes' por ele.
Responsável por liberar as mensagens hackeadas da Lava-Jato e apreendidas na Operação Spoofing ao ex-presidente, o ministro usou trechos das conversas como "reforço argumentativo" em seu voto.
— Isso se revela não apenas legítimo, mas de indiscutível utilidade para evidenciar ainda mais aquilo que já se mostrava óbvio, isto é, que o paciente foi submetido não a um julgamento justo, segundo os cânones do devido processo legal, mas a um verdadeiro simulacro de ação penal, cuja nulidade salta aos olhos — disse.
Na avaliação de Lewandowski, houve uma "ilítica coordenação de esforços" para a produção conjunta de provas e estratégias processuais "desfavoráveis" a Lula.
— Revelando uma inaceitável simbiose entre os órgãos responsáveis por investigar, acusar e julgar, que tem como origem motivações políticas e interesses pessoais do ex-juiz Sergio Moro. As primeiras demonstradas, dentre outros fatos, pela aceitação, ainda antes do término do segundo turno das eleições presidenciais, de convite para ocupar o cargo de ministro da Justiça no futuro governo de Jair Bolsonaro. Já as segundas, recentemente tornadas públicas, pela assunção à função de sócio-diretor da Alvarez & Marsal — afirmou.
Em seu voto, Lewandowski sublinhou ainda que o juízo de Curitiba extrapolou sua competência para processar e julgar as denúncias apresentadas pela Lava-Jato contra Lula.
— Não existem quaisquer elementos concretos relativamente a valores supostamente derivados dos contratos da Petrobras que teriam sido empregados para o pagamento de vantagens indevidas ao paciente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A suposta origem dos recursos, como se sabe, justificou a atração do feito para a 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba — observou.
Assim como Gilmar Mendes, o primeiro a votar sessão, Lewandowski repreendeu a ordem dada pelo então juiz Sérgio Moro para a condução coercitiva de Lula. O ex-presidente foi levado para ser interrogado pela Polícia Federal nos autos da Operação Alethea, 24ª fase da Lava Jato. Para o ministro, foi uma "violência inominável".
— Nem animais para o matadouro se leva da forma como se levou um ex-presidente. E só não se foi embarcado em um pequeno avião em direção à Curitiba pq outras forças intervieram. A história revelará quais foram as outras forças. Mas só sabemos o que se passou — disse.
Com o pedido de vista de Nunes Marques, não há previsão para conclusão do julgamento pela Segunda Turma. Neste momento, o placar está empatado, mas a ministra Cármen Lúcia avisou que vai se manifestar novamente sobre a ação, mesmo já tendo votado no início do julgamento, em dezembro de 2018.