A decisão sobre a parcialidade do ex-juiz Sergio Moro nas condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal foi adiada por um pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques. O placar está empatado: Cármen Lúcia e Edson Fachin votaram, em dezembro de 2018, contra a suspeição de Moro, e Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram, na sessão desta terça-feira (9), a favor.
Em seu voto, Gilmar Mendes considerou que todos os atos decisórios sobre Lula devem ser anulados, incluindo os aplicados na fase pré-processual. Entretanto afirmou que isso não se estende aos demais réus. Durante cerca de duas horas, o ministro descreveu seus motivos. No seu voto, Gilmar também disse que Moro deveria ser condenado a pagar as custas do processo. Ainda faltam os votos dos ministros Nunes Marques e Ricardo Lewandowski.
— Não podemos aceitar que o combate à corrupção se dê sem limites. Não podemos aceitar que ocorra a desvirtuação do próprio Estado de Direito. Não podemos aceitar que uma pena se imponha pelo Estado de modo ilegítimo — afirmou Gilmar Mendes.
Depois dele, foi a vez de Nunes Marques, que pediu vista ao processo, adiando a conclusão do julgamento. Ele afirmou que o tempo era exíguo em relação aos demais ministros para analisar tudo que foi apresentado pela defesa.
Mesmo com o pedido de vista, o ministro Ricardo Lewandowski decidiu antecipar seu voto. Ele reconheceu a suspeição de Moro, o que provocaria, por consequência, a nulidade integral de todos os atos processuais desde o início, "sem possibilidade de convalidação dos atos instrutórios".
— É a teoria da árvore envenenada. Se a árvore está envenenada, os frutos estão envenenados também — afirma Lewandowski. O ministro também concordou que Moro deveria pagar as custas do processo.
A ministra Cármen Lúcia, que votou contra a tese da suspeição, afirma que irá se pronunciar depois do voto de Nunes Marques, quando ele retornar o pedido de vista.
Na abertura da sessão, Fachin defendeu o adiamento do julgamento. O ministro disse que pediu mais prazo em razão de provas apresentadas na manhã desta terça-feira pela defesa de Lula, caracterizadas como "robustas" por Fachin. Também apontou sua decisão da véspera, que anulou as condenações do ex-presidente determinadas pela 13ª Vara Federal de Curitiba.
O representante da Procuradoria-Geral da República também solicitou a suspensão do julgamento para que possa tomar conhecimento de novos elementos. A defesa pediu o prosseguimento.
Votação sobre a realização do julgamento
Gilmar Mendes manifestou-se pela continuidade do julgamento.
O ministro Nunes Marques também votou pelo seguimento e apontou que a decisão da suspeição é importante para o juiz da Justiça Federal do Distrito Federal que irá assumir os processos de Lula, após a decisão de Fachin na segunda.
Cármen Lúcia considerou legítima a continuidade, destacando a posição de Nunes Marques.
Ricardo Lewandowski também ressaltou o ponto de vista de Nunes Marques e defendeu a continuidade do julgamento. Para Lewandowski, a sugestão de Fachin não encontra amparo legal.
Voto de Gilmar Mendes
Ao iniciar a leitura de seu voto, Gilmar Mendes afirmou que "a história recente do Poder Judiciário ficará marcada pelo experimento de um projeto populista de poder político".
— Cuja tônica se assentava na instrumentação do processo penal, na deturpação dos valores da Justiça e na elevação mítica de um juiz subserviente a um ideal feroz de violência às garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa, da presunção da inocência e principalmente da dignidade da pessoa humana — afirmou o ministro.
Conhecido crítico aos métodos da Lava-Jato, o ministro afirmou também que o combate à corrupção é "digno de elogios", mas que deve ser feito dentro dos moldes legais:
— Não se combate crime cometendo crime.
O presidente da 2ª Turma ainda destacou que há "alguns anos" compartilha críticas sobre o que chama de "excessos e riscos impostos ao Estado de Direito por um modelo de atuação judicial oficiosa que evoca para si um projeto de moralização política":
— Em atuação de inequívoco desserviço e desrespeito ao sistema jurisdicional e ao Estado de Direito, o juiz irroga-se de autoridade ímpar, absolutista, acima da própria Justiça, conduzindo processo ao seu livre arbítrio, bradando sua independência funcional. É inaceitável, sob qualquer perspectiva, esse tipo de comportamento felizmente raro.
Gilmar Mendes cita diversos diálogos entre Moro e membros do Ministério Público Federal na Lava-Jato, obtidos por um hacker investigado na Operação Spoofing. O ministro do STF recupera uma carta de juristas de outros países criticando o julgamento ao qual o ex-presidente foi submetido.
— Não se pode fazer política por meio da persecução penal — diz Gilmar, ressaltando que vê imparcialidade de Moro nos processos de Lula.
Gilmar pediu a condenação de Moro com o pagamento das custas processuais.