A maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) votou a favor do reconhecimento de assinaturas via certificação digital como legalmente válidas para o registro de partidos.
A legislação eleitoral, até o momento, não fala a respeito de assinaturas eletrônicas. A medida é cogitada pelos criadores da nova agremiação do presidente Jair Bolsonaro, a Aliança pelo Brasil, para viabilizar a legenda até as eleições municipais de 2020.
Votaram a favor da aceitação das assinaturas digitais, legalmente válidas desde que haja prévia regulamentação e uma ferramenta desenvolvida pelo TSE, os ministros Luís Roberto Barroso, Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, Sérgio Banhos e Luís Felipe Salomão. Votaram contra a presidente do tribunal, Rosa Weber, o relator, Og Fernandes, e o ministro Edson Fachin.
A consulta foi feita pelo deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS). Ele questionou ao tribunal: "Seria aceita a assinatura eletrônica legalmente válida dos eleitores que apoiem dessa forma a criação de partidos políticos nas listas e/ou fichas expedidas pela Justiça Eleitoral?". O ministro Og Fernandes afirmou que não, votando contra. Então, o ministro Luís Roberto Barroso, no seu voto divergente, afirmou que seria possível, desde que a Corte Eleitoral regulamente a ferramenta e que seja desenvolvida pelo tribunal.
O Aliança pelo Brasil precisa de 490 mil assinaturas válidas para ser efetivado como partido. Para agilizar o processo, bolsonaristas irão fazer campanha nas redes sociais e lançar um aplicativo para registro de apoio por via digital.
O julgamento
A maioria dos ministros respondeu positivamente a uma consulta feita em dezembro de 2018 pelo deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS). Apesar de a consulta ser bem anterior ao anúncio da criação da Aliança, feito no mês passado, Bolsonaro tem dito que as assinaturas digitais vão facilitar o processo de efetivação de seu novo partido.
Os ministros Luis Felipe Salomão, Tarcisio Vieira, Sergio Banhos e Luís Roberto Barroso votaram para que as assinaturas digitais certificadas fossem aceitas. Contudo, Barroso, que assumirá a presidência do TSE em 2020, condicionou a aceitação à aprovação de regulamentação pelo tribunal e ao desenvolvimento da tecnologia necessária para fazer a verificação e a contagem das assinaturas eletrônicas.
— Para que não nos comprometamos com o que talvez não possamos entregar, eu acrescentaria à resposta: 'É possível a utilização de assinatura legalmente válida desde que haja prévia regulamentação pelo TSE e desenvolvimento de ferramenta tecnológica para aferir a autenticidade das assinaturas' — afirmou Barroso.
Foram vencidos os ministros Og Fernandes, relator da consulta, Edson Fachin e Rosa Weber.
Para Fernandes, as assinaturas eletrônicas são, em tese, viáveis, mas hoje não existe lei que as preveja nem estrutura no TSE para recebê-las.
— A assinatura eletrônica é onerosa e inacessível para boa parte da população neste momento. É benefício para alguns a custo para todos, sem nenhum ganho para o sistema eleitoral — disse.
O primeiro a divergir foi Salomão, que afirmou que o TSE historicamente adota novas tecnologias.
— Em linha com essa vanguarda é que eu me decidi por um caminho pensando que, sempre que o TSE esteve em uma encruzilhada, optou por trilhar o caminho da tecnologia. Como isso vai ser utilizado depois, se altera ou não procedimentos internos, isso vai ser decidido depois — disse Salomão.
Fernandes pediu novamente a palavra para ponderar que, se o TSE dissesse "sim" à consulta, teria que imediatamente arrumar meios para implementar o novo sistema.
— O tribunal está jogando contra si próprio num momento em que não é possível responder em um prazo tão curto — disse.
Pelas regras vigentes, mesmo a assinatura eletrônica certificada precisaria ser conferida pelos servidores dos cartórios eleitorais, em um procedimento que continuaria sendo manual.
— A troca de documentos em papel por documentos eletrônicos não suprime nem simplifica etapas — disse parecer do vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, no mês passado. — Isso significa dizer que em um caso os servidores da Justiça confrontarão papéis para ver as semelhanças entre as assinaturas manuscritas e, então, 'atestar' a veracidade das assinaturas. No outro caso, os servidores da Justiça precisarão verificar se a assinatura eletrônica associada ao documento eletrônico é da mesma pessoa cujos dados constam do corpo do documento eletrônico, que, portanto, precisa ser aberto e lido e confrontado com os dados da assinatura eletrônica.
Apenas 3% do eleitorado brasileiro tem certificação digital
Hoje, para criar um novo partido, é preciso recolher, em fichas de papel, ao menos 491.967 assinaturas distribuídas em no mínimo nove Estados. Essas fichas vão para os cartórios eleitorais, que conferem se as assinaturas batem com as de seus registros. As que baterem seguem para os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) presentes nos Estados. Por fim, são enviadas ao TSE, onde a equipe do Sistema de Apoiamento a Partidos em Formação faz a contagem dos nomes que constam das fichas de papel.
O trâmite das assinaturas digitais continuaria sendo o mesmo. Além disso, as assinaturas digitais agora liberadas pelo TSE se restringem àquelas que são certificadas. A certificação é um procedimento pago, fornecido por empresas, que se baseia no uso de chaves com criptografia para garantir a segurança do registro.
Segundo a Associação Nacional de Certificação Digital (ANCD), existem no país 3,78 milhões de pessoas físicas que têm certificado digital, o que equivale a menos de 3% do eleitorado, fato que limita o alcance da coleta eletrônica de assinaturas.
Há duas semanas, Bolsonaro disse que a celeridade na criação de seu novo partido dependeria dessa decisão do TSE.
— Por ocasião das eleições de 2020, acredito que podemos ter o partido funcionando desde que a assinatura seja pela forma eletrônica, senão só poderemos estar em condições de disputar as eleições de 2022 — afirmou o presidente.
As declarações foram na contramão do que havia dito o advogado eleitoral Admar Gonzaga à Folha de S.Paulo. À frente da criação da Aliança, Gonzaga, que é ex-ministro do TSE, afrmou que o grupo do presidente não estava contando com as assinaturas digitais.
— Essa narrativa foi criada pela imprensa. Em primeiro lugar, poucas pessoas têm assinaturas certificadas. E elas teriam de ser conferidas no cartório. Seria o dobro do trabalho.