As incertezas em torno da presença da Aliança pelo Brasil nas eleições de 2020 podem criar um vácuo para o grupo político do presidente Jair Bolsonaro. Lançado oficialmente ontem, o novo partido precisa ter o registro homologado pela Justiça Eleitoral até 4 de abril para lançar candidatos a prefeito e vereador. O próprio presidente admite o risco de ficar alheio à eleição:
— Se for possível (coleta eletrônica de assinaturas para criação da legenda), a gente forma um partido para março. Se não for possível, não vou entrar em disputas municipais no ano que vem, estou fora.
Bolsonaro se referia ao maior desafio imposto pela legislação: apresentar 491.967 assinaturas, colhidas em nove Estados, com ao menos 54.663 rubricas em cada um. Analistas consideram muito difícil cumprir a obrigação legal num prazo tão exíguo — são 140 dias de hoje até a data fatal, seis meses antes do dia da eleição.
Sem certeza da obtenção do registro partidário no Tribunal Superior Eleitoral e com a possibilidade de Bolsonaro ficar de fora da campanha, a maioria dos aliados com pretensões eleitorais para 2020 ainda não sabe o que fazer.
Em Porto Alegre, há pelo menos três pré-candidatos a prefeito vinculados ao bolsonarismo: o secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Ruy Irigaray, o deputado estadual Tenentecoronel Zucco, ambos do PSL, e a vereadora Comandante Nádia (MDB). Do trio, somente Irigaray não esteve em Brasília ontem.
Nádia é a única que poderia mudar de partido na próxima janela para migração, em março de 2020, sem risco de perder o mandato. Como foram eleitos deputados no ano passado, Zucco e Irigaray só poderão trocar de legenda no último ano da própria legislatura, na janela de 2022. Uma eventual saída antes disso abre margem para o PSL exigir o mandato de volta.
— Há uma situação difícil, porque não existe mais a janela que permitia a migração para um partido que estivesse sendo criado, como ocorreu no PSD. Essa exceção acabou — explica o advogado Antônio Augusto Mayer dos Santos.
Dos três, apenas Zucco manifestou publicamente intenção de se filiar ao novo partido de Bolsonaro. Nádia, contudo, já expôs descontentamento com a falta de espaço no MDB para sua candidatura e não descarta largar a legenda. Afinado com o presidente nacional do PSL, Luciano Bivar, de quem recebeu aval para concorrer à prefeitura da Capital, Irigaray garante que permanece na sigla que a família Bolsonaro está deixando.
Preferidos
Diante da dificuldade que Bolsonaro tem pela frente no desafio de viabilizar a Aliança pelo Brasil para a eleição de 2020, o trio comunga com outros pré-candidatos espalhados pelo país de uma mesma ansiedade a respeito do comportamento do presidente na campanha. A principal dúvida é se Bolsonaro irá apoiar aliados que tenham permanecido no PSL, como o próprio Irigaray.
A despeito da afirmação de que ficará de fora da eleição, é pouco provável que o presidente não demonstre simpatia a seus preferidos em algumas capitais. Antes de oficializar sua desfiliação do PSL, Bolsonaro chegou a dizer que teria de 30 a 40 candidatos em 2020.
A situação de Porto Alegre, onde pelo menos três políticos disputam seu favoritismo, se repete em outras cidades. No Rio, o deputado federal Hélio Lopes e o estadual Rodrigo Amorim, ambos do PSL, são pré-candidatos e amigos da família do presidente. O mesmo ocorre em São Paulo, com o deputado estadual Gil Diniz (PSL), o “carteiro reaça”, e o apresentador de TV José Luiz Datena.