Sete cidades do Rio Grande do Sul seriam as principais beneficiadas caso a proposta do governo que prevê a extinção de municípios com até 5 mil habitantes e arrecadação própria inferior a 10% da receita total seja aprovada. Em termos proporcionais em relação ao que recebem atualmente, Alvorada, Canoas, Gravataí, Novo Hamburgo, Rio Grande, São Leopoldo e Viamão são as cidades brasileiras que mais herdariam verba do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) de prefeituras extintas e de cidades incorporadoras, segundo estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM) divulgado nesta terça-feira (3).
Cada um desses sete municípios receberia R$ 21,2 milhões a mais no repasse do FPM —aumento individual de cerca de 30%, considerando os valores de 2019. Isso ocorre porque a fusão de cidades prevista na proposta de emenda à Constituição (PEC) do pacto federativo provocaria a retirada de verba do FPM de municípios incorporados e dos incorporadores, transferindo esse recurso para prefeituras que não estão envolvidas no enxugamento.
Mesmo ganhando população, os incorporadores deixariam de ganhar os valores correspondentes, porque podem não conseguir alcançar o patamar necessário para repasse maior. Então, o montante recebido acabaria tendo de atender a uma comunidade maior, empobrecendo o município. O FPM perdido pelos 1.217 a serem extintos no Brasil e pelos 693 incorporadores seria transferido para os cofres de 3.658 municípios, de acordo com a CNM.
A novidade é avaliada com cautela nas sete prefeituras que ganhariam FPM maior. Prefeitos de Viamão e Alvorada, respectivamente, André Pacheco (sem partido) e José Arno Appolo do Amaral (MDB) dizem que a verba extra seria importante no enfrentamento da crise, mas ressaltam que a extinção é uma medida drástica que poderia prejudicar comunidades (veja outras opiniões de prefeitos abaixo).
O levantamento foi apresentado pelo presidente da CNM, Glademir Aroldi, no Congresso, em meio a protesto de prefeitos em Brasília contra a proposta da União. Os manifestantes cravaram placas com nome de municípios em frente ao Legislativo.
Menos R$ 7 bilhões aos municípios
Contrária ao enxugamento, a CNM estima perda de R$ 7 bilhões ao ano no FPM repassado aos municípios envolvidos nas incorporações. O Rio Grande do Sul é o segundo Estado que mais perderia verbas do fundo: R$ 1 bilhão, ficando atrás apenas de Minas Gerais (R$ 1,4 bilhão). Ao justificar a previsão de perda de arrecadação, a entidade lembra que a partilha do FPM ocorre com base em coeficientes por faixa populacional, que seria alterada com a união de prefeituras.
A proposta prevê que cidades com até 5 mil habitantes e arrecadação própria inferior a 10% da receita total serão incorporadas ao município vizinho com maior índice de sustentabilidade fiscal. O incorporador poderia absorver no máximo três cidades.
Segundo a CNM, essa regra é inconsistente, pois essas condições não seriam viáveis simultaneamente em cerca de 20% dos casos de fusões, gerando distorções em lugares como Juiz de Fora (MG) e Lagoa Vermelha (RS), que seriam candidatos a incorporar até 10 prefeituras vizinhas cada um.
Mais de 200 municípios seriam extintos no RS
Levantamento da CNM aponta ainda que dos 1.217 municípios brasileiros que seriam extintos com base no pacote do governo federal, 18,73% estão no Rio Grande do Sul. O Estado lidera o ranking, com 228 cidades, seguido por Minas Gerais (223) e São Paulo (135).
Os dados da CNM são parecidos com os da Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs), que estima 226 municípios gaúchos fora do mapa, caso a proposta saia do papel. O texto ainda não foi colocado em votação no Congresso.
Veja o mapa, com base nos dados da Famurs, os municípios que seriam extintos no RS:
O que dizem as prefeituras que seriam mais beneficiadas:
Alvorada
O prefeito de Alvorada, José Arno Appolo do Amaral (MDB), afirmou que recursos sempre são bem-vindos, mas ponderou que a medida tem de ser analisada com mais profundidade, pois impacta diretamente na história de diversos municípios.
Canoas
O secretário municipal de Planejamento e Gestão de Canoas, João Portella, afirma que a proposta de extinção dos municípios é válida e otimiza a alocação de recursos públicos.
— É uma medida de racionalização que, na minha opinião pessoal, é perfeita. Uma medida de economia e de otimização dos recursos públicos.
Gravataí
Chefe do Executivo em Gravataí, Marco Alba (MDB), entende que a extinção de pequenos municípios não resolve a crise financeira e fiscal do país. Em relação ao impacto positivo que seria gerado a Gravataí, Alba diz que não seria justo dentro desse cenário.
— Não é justo extinguir esses municípios. Se nós vamos receber esses recursos a partir de uma injustiça, não é correto.
Novo Hamburgo
A prefeita de Novo Hamburgo, Fátima Daudt (PSDB), pondera que recursos são bem-vindos e que "todos os municípios têm problemas com a falta de verba". Mas que há "outro lado", que precisa ser citado:
— Os municípios que se emanciparam conseguiram isso de forma democrática. Assim, nesses casos em que as cidades não conseguem suprir suas necessidades, acredito que a população deve ser ouvida, deixando claro que o município não está conseguindo se manter. É claro que, para a cidade, seria ótimo ter mais recursos, mas isso precisa ocorrer de forma democrática.
Rio Grande
Alexandre Lindenmeyer (PT), prefeito de Rio Grande, defende o respeito à autonomia dos municípios que seriam extintos com a proposta do governo. Com base nesse entendimento, rechaça o benefício que seria gerado a Rio Grande em troca do fim de cidades pequenas:
— Penso que a alternativa para melhorar as finanças dos meus municípios e de outros tantos municípios de grande porte não é através da extinção das cidades de pequeno porte.
São Leopoldo
Prefeito de São Leopoldo e presidente da Associação Brasileira de Municípios (ABM), Ary Vanazzi (PT) é contra a proposta da União. Ele afirma que a extinção das cidades é inadequada e aumentará as despesas dos municípios incorporadores.
— Isso é um bode expiatório, na minha opinião, para desviar a atenção e tratar das coisas que interessam ao mercado e ao governo, mas não interessam às comunidades mais pobre do nosso país.
Viamão
Para o prefeito de Viamão, André Pacheco (sem partido), a medida pode se mostrar "economicamente importante em um momento de crise" aos municípios que receberiam a verba. Contudo, ele diz que não vê com "bons olhos" o fato de receber esse benefício em função da extinção de um município.
— Não posso me manifestar positivamente quando tenho municípios sendo extintos, porque há um envolvimento social nesses locais, da comunidade. Acho que a palavra é pertencimento. Como ficam essas pessoas? Acho que é prematuro concordar ou opinar sobre a medida.