A constitucionalidade da tabela do frete, as regras de distribuição dos royalties do petróleo, pontos da reforma trabalhista, como o contrato de trabalho intermitente, a possibilidade de homens gays doarem sangue e a validade da delação da JBS são alguns dos temas que o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) prevê julgar no primeiro semestre de 2020.
Processos da chamada "pauta de costumes", que costumam colidir com os interesses de grupos religiosos, como os evangélicos, ficaram fora da programação. O principal exemplo é o recurso que discute a descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal — assunto que estava previsto para 2019, mas foi adiado indefinidamente.
A pauta de julgamentos foi divulgada nesta terça-feira (17) pelo presidente do tribunal, ministro Dias Toffoli, durante um evento com jornalistas. Segundo Toffoli, o objetivo é dar previsibilidade aos trabalhos da Corte — embora possa haver modificações.
Processos que têm impacto em investigações e processos penais estarão em discussão. Um dos exemplos é a finalização do julgamento sobre a ordem de apresentação de alegações finais em processos com réus delatores e delatados, previsto para 25 de março.
A maioria do STF já decidiu que réus delatados têm o direito de falar por último, para se defender das acusações dos delatores. Porém, ficaram em aberto as circunstâncias em que as ações penais que não seguiram esse rito deverão ser anuladas. A decisão poderá ter reflexo no processo do sítio de Atibaia, pelo qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi condenado em primeiro e segundo graus.
Execução imediata da pena após Tribunal do Júri será julgada em fevereiro
Na pauta de 12 de fevereiro está um processo sobre a execução imediata da pena de condenados pelo Tribunal do Júri. No Brasil, o júri é responsável por julgar crimes dolosos contra a vida, como homicídios.
O debate sobre o júri foi anunciado por Toffoli quando o plenário reverteu a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância. A ideia é dar uma resposta a setores da sociedade que dizem temer pela demora de prender criminosos violentos.
Em 20 de maio, o plenário deve julgar duas ações sobre o WhatsApp: uma que trata da suspensão dos serviços do aplicativo por ordem judicial — o que já ocorreu no país por causa de investigações penais — e outra que trata da possibilidade de a Justiça determinar a quebra de sigilo das mensagens.
Na última sessão do semestre, em 17 de junho, serão discutidas as regras das delações premiadas, instituto que ficou conhecido com a Operação Lava-Jato. Um dos processos aborda a possibilidade de se usarem delações em ações de improbidade administrativa, que estão fora da área penal.
Delação da JBS marcada para junho
Na mesma data, o plenário deve discutir se a delação dos empresários Joesley e Wesley Batista, da JBS, continuará válida ou será rescindida, como quer a Procuradoria-Geral da República. O relator é o ministro Edson Fachin.
Os ministros deverão decidir se os benefícios combinados com os delatores serão mantidos e, em caso negativo, se as provas entregues pelos Batista continuarão válidas. A delação agitou o mundo político em 2017, atingindo o então presidente Michel Temer (MDB) e o atual deputado Aécio Neves (PSDB-MG).
O próximo semestre estará repleto de temas tributários no Supremo. Para 5 de fevereiro está marcada a continuidade do julgamento sobre pontos da Lei de Responsabilidade Fiscal, como o que permite aos governos reduzir a jornada dos servidores e, consequentemente, o salário. Já há maioria contra a possibilidade de redução de vencimentos do funcionalismo.
Em 29 de abril, o plenário tratará das regras de distribuição dos royalties pagos pela exploração do petróleo. Já a constitucionalidade da tabela do frete, criada para atender a um pleito dos caminhoneiros grevistas de 2018, está na pauta de 19 de fevereiro. Entidades empresariais sustentam que o tabelamento é inconstitucional por violar o princípio do livre mercado.
Em maio, reforma trabalhista
Pontos da reforma trabalhista realizada em 2017 pelo governo Temer ficaram para a sessão do dia 14 de maio. O principal deles é sobre o contrato de trabalho intermitente, que passou a ser possível com a reforma. Nesse tipo de contrato não há jornada fixa regular e o profissional é chamado de acordo com a necessidade do empregador.
Questões de saúde estão previstas para serem julgadas em 11 de março. Uma delas é a possibilidade de o governo fornecer gratuitamente remédios que não tenham registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A outra aborda uma regra vigente que proíbe que homens que fazem sexo com outros homens doem sangue.
Além de divulgar o calendário de 2020, Toffoli apresentou um balanço das atividades do Supremo em 2019. Segundo o ministro, a corte conseguiu reduzir em cerca de 20% o acervo de processos pendentes de julgamento.
— O acervo atual é o menor dos últimos 20 anos — disse.
— (O STF) Teve a coragem de enfrentar uma extensa lista de temas polêmicos e de grande impacto político, social, econômico e cultural. Desse modo, pacificou conflitos, estabilizou as relações institucionais e estabeleceu diretrizes de ação para as instituições e a sociedade, promovendo segurança jurídica e garantindo direitos fundamentais — afirmou Toffoli.
Entre os exemplos de processos notórios que foram julgados, o ministro citou a criminalização da homofobia, a ilegalidade de mulheres grávidas trabalharem em locais insalubres, o restabelecimento da atribuição da Fundação Nacional do Índio (Funai) para demarcar terras indígenas — o que o governo Bolsonaro queria passar para o Ministério da Agricultura — e a constitucionalidade da prisão só após o trânsito em julgado (o fim dos recursos).
Toffoli disse que a agenda de 2020 será menos polêmica que a de 2019 porque, em sua avaliação, os assuntos de maior repercussão já foram superados.