O empresário Joesley Batista afirmou, em delação que embasa a investigação da Lava-Jato contra parlamentares do MDB e os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega solicitou a ele dinheiro para a compra de apoio político emedebista ao PT nas eleições de 2014. GaúchaZH teve acesso ao inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) e detalha a suposta compra de apoio político para a segunda campanha presidencial da petista.
A reunião aconteceu no gabinete do ministério, localizado no 15º andar do prédio do Banco do Brasil na Avenida Paulista, em 4 de junho de 2014, segundo Joesley. Mantega teria pedido a Joesley o suposto repasse de R$ 35 milhões a seis senadores do MDB. O objetivo seria evitar o rompimento com o PT e a migração para a campanha de Aécio Neves, então pré-candidato à presidência pelo PSDB.
Na delação, Joesley afirmou que Mantega entregou a ele um papel com os nomes dos senadores a serem contemplados e os supostos valores que eles receberiam. Os repasses teriam sido operacionalizados pelo executivo Ricardo Saud, que teria se encontrado com ele em um almoço no restaurante La Tambouille, em São Paulo, no dia seguinte.
Os senadores, segundo Saud, seriam Eduardo Braga (AM), Vital do Rêgo (PB), Jader Barbalho (PA) e Renan Calheiros (AL), para quem seriam entregues R$ 8 milhões cada, além de Valdir Raupp (RO), que receberia R$ 2 milhões, e Kátia Abreu (TO), sem valor informado pelo colaborador. De acordo com a delação, o documento, que também informava o Estado de cada parlamentar, era conhecido como "Planilhão das doações de 2014".
Saud disse aos investigadores da Polícia Federal (PF) que os supostos pagamentos inauguraram uma trilha de repasses feitos pela J&F, por solicitação do PT, para a campanha de Dilma. Orientado por Joesley, o executivo teria se reunido com Renan na residência oficial do Senado dois meses depois para discutir o assunto.
Na conversa, conforme o inquérito, o emedebista "demonstrou já ter conhecimento de que seria procurado para tratar da distribuição de recursos a pedido do PT para senadores do MDB" e teria pedido que Eunício de Oliveira (CE) fosse incluído no esquema "a fim de não criar uma crise no partido".
inquérito teria mencionado um segundo encontro na residência oficial para que se redefinisse como o dinheiro seria repartido. Dessa vez, teriam participado Saud, Renan, Vital do Rêgo, Eunício e Jader.
Após mudanças nos cálculos, de acordo com o documento da PF, o repasse ao MDB teria subido para R$ 41 milhões, sendo:
- R$ 9 milhões para Jader Barbalho (dos quais R$ 3 milhões teriam ido para a campanha do filho, Helder Barbalho, ao governo do Pará);
- R$ 12 milhões para Renan Calheiros (dos quais R$ 3 milhões teriam ido para campanha de Renan Filho ao governo de Alagoas);
- R$ 6 milhões para Eduardo Braga, Vital do Rêgo e Eunício de Oliveira, cada;
- e R$ 2 milhões para Valdir Raupp.
Renan Calheiros não concorreu às eleições de 2014. Por isso, os investigadores acreditam que os valores recebidos pelo senador foram usados "em alguma medida para contribuir com outros políticos, visando principalmente o apoio na futura eleição à presidência do Senado". Em espécie, teriam sido entregues R$ 500 mil ao senador Dário Berger (MDB-SC) e a Paulo Bornhausen (PSB-SC).
Delação de Palocci
Os supostos repasses da J&F aos emedebistas também constam nas delações do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado e do ex-ministro Antonio Palocci. Machado afirmou aos investigadores que "o PT procurou um grupo de senadores que exercia influência e controle em seus Estados" e acertou "a realização de contribuições pela J&F para garantir a unidade do partido".
Palocci afirmou à PF que "demonstrou conhecimento do risco da perda de apoio dos senadores do MDB caso as contribuições não fossem realizadas". O ex-ministro ainda relatou ter procurado Dilma para confirmar o pedido de Mantega, já que estranhou a solicitação de doações a outro partido. Segundo os colaboradores, a ex-presidente "tinha inteiro conhecimento dos valores indevidos".
Em sua delação, Saud também relatou uma audiência com Michel Temer na casa do então vice-presidente um dia após o almoço com Joesley. Disse ainda que Temer discordou do combinado e pediu que o acordo fosse suspenso. "Ele se mostrou surpreso e indignado, tendo dito que não eram contribuições ao partido, mas sim a um grupo de senadores do MDB." Em seguida, Temer teria perguntado por que seu nome estava fora da lista.
O episódio teria provocado uma crise entre Temer e o PT, segundo Saud. Em seguida, Temer acabou reassumindo a presidência do MDB, em tese, para controlar a divisão dos recursos. Os pagamentos teriam acontecido por meio da simulação de contratos de serviços de empresas de táxi aéreo, comunicação, filmagem, transporte, pesquisas de opinião e escritórios de advocacia, além de consultorias empresariais e doações oficiais a diretórios do MDB.
Contrapontos
Dário Berger (MDB-SC)
O senador Dário Berger esclarece que não foi intimado, porém está à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento, se for necessário.
Dilma Rousseff (PT)
"É estarrecedora a notícia de que a Polícia Federal pediu a prisão da ex-presidenta Dilma Rousseff num processo no qual ela não é investigada e nunca foi chamada a prestar qualquer esclarecimento. A ex-presidenta sempre colaborou com investigações e jamais se negou a prestar testemunho perante a Justiça Federal, nos casos em que foi instada a se manifestar", disse a ex-presidente, em nota.
Eduardo Braga (MDB-AM)
"Eu recebi um agendamento de oitiva. E, como sempre, presto todos os esclarecimentos e apoio toda e qualquer operação. Agora, o que não é justo é fake news dizer que imóveis e gabinete tenham sofrido busca e apreensão. Eu não sofri busca e apreensão", disse Braga. O senador também afirmou que irá marcar uma data para prestar esclarecimentos.
Eunício de Oliveira (MDB-CE)
"Nem Eunício Oliveira, nem nenhum endereço ou pessoas ligados a ele, foram objeto de quaisquer ações judiciais decorrentes dessa decisão do ministro Luiz Edson Fachin. Como sempre o fez, o ex-senador está à disposição para prestar os esclarecimentos que o Poder Judiciário achar necessários", declarou, em nota, a assessoria de imprensa.
Guido Mantega
Em nota, Mantega disse que entrou em contato com as autoridades e que "prestará todos os esclarecimentos no interesse das investigações".
Jader Barbalho (MDB-PA)
"O senador Jader Barbalho recebeu a intimação sobre o Inquérito 4707, entrou em contato com a Polícia Federal para agendar uma nova data, em Brasília, quando prestará todos os esclarecimentos necessários", informou, em nota, a assessoria de imprensa.
Helder Barbalho (MDB-PA)
"A campanha a governador foi realizada somente com recursos oficiais, devidamente registrados e aprovados pelo Tribunal Regional Eleitoral", disse, por meio de nota, a assessoria.
Kátia Abreu (PDT-TO)
A assessoria de imprensa da senadora afirmou que a parlamentar "não figura nesse processo" e que "não faz parte do rol dos investigados".
Michel Temer (MDB)
O advogado de Temer, Eduardo Carnelós, prefere não comentar o episódio em que ele é mencionado.
Paulo Bornhausen (PSB-SC)
Disse que não irá se manifestar enquanto não tiver acesso ao inquérito.
Renan Calheiros (AL)
"O senador afirmou que está à disposição e que é o maior interessado no esclarecimento dos fatos", disse, em nota, a assessoria do emedebista.
Renan Filho (MDB-AL)
A assessoria de imprensa do governador afirmou, em nota, que "todas as doações para a campanha eleitoral de Renan Filho em 2014 foram feitas conforme a lei e tiveram prestação de contas aprovada pela Justiça Eleitoral".
Valdir Raupp (MDB-RO)
Em nota, a defesa disse que Raupp prestou depoimento, no qual informou não ter sido candidato em 2014.
Vital do Rêgo (Tribunal de Contas da União)
"O ministro é o maior interessado em esclarecer os fatos e, portanto, atenderá a solicitação do depoimento, colaborando com a Justiça, como sempre tem feito", disse a defesa do ministro, em nota.