O site El País Brasil divulgou, nesta terça-feira (6), supostos diálogos entre os procuradores da força-tarefa da Lava-Jato nos quais eles teriam afirmado que estavam investigando o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, no âmbito da operação envolvendo Paulo Preto. De acordo com as mensagens, os procuradores teriam planejado acionar investigadores na Suíça para embasar uma ação contra Mendes, além de apurar decisões e acórdãos do ministro para embasar sua ofensiva. De acordo com a Constituição, procuradores da República só podem investigar ministros do STF com autorização da Procuradoria-Geral da República (PGR), que não havia concedido a permissão na época das mensagens.
O El País é o quarto veículo de comunicação que atua em parceria com o site The Intercept Brasil na investigação das mensagens vazadas, ao lado de Folha de S. Paulo, Veja e BandNews. As mensagens, segundo o site, teriam ocorrido entre os anos de 2018 e 2019.
De acordo com os supostos diálogos, tudo começou quando Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, repassou aos procuradores "um boato" de que parte do dinheiro mantido por Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, em contas no Exterior, pertencia a Gilmar Mendes. Paulo Preto havia sido preso nos dias 22 de março e no dia 6 de abril de 2018, no âmbito da força-tarefa da Lava-Jato, a partir de uma denúncia, aceita posteriormente, que apontava desvios de R$ 7,7 milhões da estatal Dersa (responsável pelas rodovias de São Paulo) durante o governo de José Serra. Gilmar Mendes mandou soltar Paulo Preto em 11 de maio.
Em 19 de fevereiro de 2019, Paulo Preto foi preso pela terceira vez. Na operação, que foi a 60ª fase da Lava-Jato, foram executados 12 mandados de busca e apreensão em endereços ligados a Aloysio Nunes, ex-senador e ex-ministro do governo Temer. O Ministério Público Federal (MPF) do Paraná afirmou que investigava transações de R$ 130 milhões, valor equivalente ao saldo das contas controladas por Paulo Preto na Suíça em 2017.
Foi na noite do dia 19 que aconteceu o suposto diálogo divulgado pelo El País. "E tem o boato de que parte do dinheiro fora era do GM (Gilmar Mendes). E ele não pode soltar o PP (Paulo Preto). Pode estar se prevenindo. Daí Paulo Preto fala dele e ele diz: já havia essa info de que CWB (Curitiba) faria isso. Coincidência demais heim", afirmam as mensagens publicadas pelo site.
Então, no chat Filhos do Januário 4, com mais procuradores, Deltan teria perguntado a Roberson Pozzobon, colega do MPF, se foram feitos pedidos de cooperação específicos para obter documentos do cartão de crédito de Paulo Preto, e solicitou que a PF desse prioridade para analisar o malote. Pozzobon, então, teria afirmado que os bancos teriam pedido duas semanas para analisar os documentos e teria ironizado: "Vai que tem um para o Gilmar...hehehe".
"Aí você estará investigado ministro do Supremo, Robinho, não pode", teria afirmado o procurador Atahyde Costa, em uma mensagem atribuída a ele e divulgada pelo El País.
Antes, em setembro de 2018, Deltan Dallagnol teria pedido a estagiários para elencar decisões de Gilmar Mendes contrárias aos pedidos dos procuradores da Lava-Jato. Antes disso, Dallagnol teria manifestado apoio a pedidos de impeachment do ministro Gilmar Mendes, em 2017 e 2018, além de afirmar que a procuradora-geral da República Raquel Dodge não o confronta "pelo sonho de uma cadeira no Supremo".
O site do jornal El País afirma que entrou em contato com a assessoria de imprensa da força-tarefa da Operação Lava-Jato para buscar o contraponto das afirmações. De acordo com o site, os procuradores afirmaram que "não surgiu nas investigações nenhum indício de que cartões da conta de Paulo Vieira de Souza tenham sido emitidos em favor de qualquer autoridade sujeita a foro por prerrogativa de função".
"Qualquer ilação nesse sentido, por parte de quem for, seria mera especulação", disse a nota. "Em todos os casos em que há a identificação de pagamentos de vantagens indevidas e lavagem de ativos no exterior, o Ministério Público busca fazer o rastreamento do destino de todos os ativos ilícitos, para identificar os destinatários desconhecidos", ressalta. Na nota, eles também afirmaram que as informações são encaminhadas à PGR e ao STF "sempre que surgem indícios do envolvimento em crimes de pessoas com foro privilegiado".
Ainda por meio de nota enviada ao El País, os procuradores afirmaram que "dentre os deveres do membro do Ministério Público, está o de 'adotar as providências cabíveis em face de irregularidades de que tiver conhecimento, em especial quando relacionadas a casos em que atuam".
"A eventual pesquisa das decisões de um julgador para analisar qual a eventual medida a adotar seria perfeitamente regular. Dentre as medidas que podem ser analisadas e estudadas pelo Ministério Público em face de decisões que cogite inadequadas de um julgador está a análise de jurisprudência para apresentar recursos, a representação à respectiva corregedoria ou ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) ou ainda a representação pela suspeição ou pela apuração de infração político-administrativa (seguindo o rito de impeachment). Nesse contexto, contudo, como é público, os procuradores jamais realizaram representação pelo impeachment do ministro Gilmar Mendes, embora tenham apresentado pedido de reconhecimento de suspeição", destacou a nota.