As ideias liberais de João Amoêdo, primeiro candidato à Presidência do Partido Novo, ecoaram entre os que defendem um Estado menos inchado. O empresário ficou na quinta colocação, com 2,6 milhões de votos, 2,5% dos válidos. Na série de entrevistas com concorrentes ao Planalto, Amoêdo avalia os seis primeiros meses do governo de Jair Bolsonaro, em quem votou no segundo turno, apesar de negar que tenha apoiado o vencedor.
Qual é a sua avaliação sobre o governo Bolsonaro?
Começou bem a montagem da equipe na área econômica. Gente muito alinhada, inclusive, com o que o Partido Novo defende, que é o equilíbrio das contas, mais liberdade econômica, ambiente menos burocrático. Por outro lado, vislumbro falhas em equipes, entre elas, a da Educação. Ambiente tumultuado, com questão muito mais ideológica do que de gestão. No governo, minha principal crítica tem sido o presidente trazer temas polêmicos que, apesar de serem importantes, não são prioritários. E não privilegiou um diálogo maior com o Legislativo, que seria fundamental para as reformas andarem mais rápido. No geral, está regular. O governo precisa ser mais institucional. Passou a época de eleição.
Como melhorar o diálogo com o Legislativo?
O diálogo é fundamental e não pressupõe só o toma lá dá cá. Pelo contrário, tem de construir um diálogo franco, transparente, mostrando o que está sendo feito. Na hora que você abre isso e tem posições firmes, o toma lá dá cá por interesses pessoais fica de lado. É óbvio que pode ter quadros indicados pela área política, desde que sejam quadros técnicos.
O presidente se elegeu com o discurso do liberalismo econômico. Mas já tivemos episódios de intervenção no BNDES, na Petrobras.
Critiquei muito durante a campanha. Até que ponto Bolsonaro estava convicto dessa prática liberal? Minha crítica sempre foi que, durante o período em que atuou como deputado federal, não existem muitos fatos que possam comprovar conduta liberal. Pelo contrário, muitas vezes era mais intervencionista. Ele melhorou em algumas coisas, mas não há dele convicção desse tipo de medida. A vantagem principal desse processo é ele dar autonomia ao ministro Paulo Guedes.
O senhor se arrepende de ter apoiado Bolsonaro no 2º turno?
Na verdade, nunca cheguei a apoiá-lo. Na época, meu entendimento foi de que a volta do PT seria muito ruim, por todo o cenário econômico que foi deixado, pelos inúmeros casos de corrupção. Aí, a única alternativa no segundo turno em confronto com o PT era o Bolsonaro. Agora, depois de eleito, como brasileiro, quero que dê certo.
O Novo parece mais base aliada do governo do que o próprio PSL. Como o senhor avalia isso?
O protagonismo do Novo , o nosso posicionamento, é muito em razão das ideias, dos princípios e valores, e menos em cima das pessoas. É natural que sobre as reformas da Previdência e tributária, mais liberdade econômica com menos burocracia, redução de privilégios e benefícios, o Novo seja muito firme na defesa, porque entendemos que são fundamentais.
Qual reforma deveria ser a prioritária: a da Previdência ou a tributária?
Com o déficit das contas, tem de ser a da Previdência. Pela magnitude do impacto, dá outra visibilidade, dá segurança maior para investimentos no Brasil. Tanto de fora, quanto dos próprios brasileiros.
Ela deveria incluir Estados e municípios?
Certamente.
O que pode ser feito para gerar empregos, mesmo antes das reformas?
Está tudo muito dependente das reformas. O governo está pecando em não dar a celeridade que deveria ao processo todo. Temos desequilíbrio nas contas, e a reforma da Previdência vai sendo protelada. As pessoas começam a fazer as contas, mais um ano com déficit elevado, com insegurança em relação ao cenário futuro. Muito dessa frustração é porque o governo dispersou esforços em vários assuntos. Não vejo sentido em discutir pontos na carteira de motorista ou cadeirinha no banco de trás no momento.
O Novo defende que os cidadãos possam ter armas. Os brasileiros estão preparados para isso?
Defendemos pelo aspecto da liberdade. Entendendo que a segurança é dever do Estado. Na avaliação do Novo, as pessoas sempre estão preparadas e, se não estiverem, terão as consequências e aprenderão com essa liberdade. Somos favoráveis à questão das armas, mas, obviamente, precisa ter alguns critérios claros.
Como o senhor avalia as ações de segurança pública até o momento?
A gente não vê muita coisa ainda. Existe um projeto do ministro Sergio Moro em votação, mas, do ponto de vista prático, não parece que ele tenha conseguido fazer alguma coisa. Precisa melhorar a gestão na segurança. Começaria com a integração maior das polícias, maior uso de inteligência, a questão das fronteiras com monitoramento, rastreamento dos recursos financeiros para o combate ao crime organizado, parcerias público-privadas para a manutenção, construção e administração de presídios.
O senhor vê algum risco à Operação Lava-Jato?
Não. A operação foi um sucesso por tudo que tem trazido: recuperação de recursos, pessoas encarceradas, que no passado era pouco possível de imaginar, políticos de alto escalão, empresários. Houve avanço, conscientização, preocupação com a corrupção. Isso está incorporado na agenda do brasileiro.
Como o senhor vê a área da educação?
O Brasil tem problema na gestão da educação. E o governo, ao entrar em um embate ideológico, tira o foco do que é prioritário que é fomentar os ensinos básico, fundamental e primeira infância, quando as crianças estão desenvolvendo suas habilidades. Outro ponto é a melhoria no currículo dos professores e no gerenciamento das escolas. Boa parte dos diretores de escola era indicações políticas e isso precisa ser alterado.
A influência do escritor Olavo de Carvalho e dos filhos do presidente sobre o governo atrapalha?
Sem dúvida atrapalha. O presidente tem na equipe ministros e assessores que estão na instituição Presidência da República. Deveria caber a eles as opiniões. Trazer de fora opiniões familiares ou até de gente que está fora do Brasil para palpitar é muito ruim. Contribui para polarização que mais prejudica do que ajuda o Brasil.
Como o senhor viu o movimento para criar um pacto entre os poderes?
É importante que os três Poderes sejam independentes. Não gosto muito da ideia de encontro formal para buscar esse pacto.
A União tem de ajudar Estados em crise financeira?
Gosto do plano de recuperação fiscal, mas o importante é o seguinte: tem de auxiliar, mas mensurar e cobrar contrapartidas. Se não, traz esse problema para a União e Estados mais responsáveis nas gestões pagam pelos que não foram.
O senhor será candidato à Presidência em 2022?
Não necessariamente. No Novo, temos a preocupação de não ter salvador da pátria. Quando saí candidato era porque o partido precisava. A gente está se preparando para 2022, mas não é projeto pessoal.
Por que entrevistamos os ex-candidatos à Presidência?
1 - Na eleição de 2018, eles se colocaram como alternativa para presidir o país, apresentando projetos para o desenvolvimento e a solução de problemas do Brasil. Embora a maioria tenha escolhido Bolsonaro, os demais candidatos também receberam votos de parte da população. Eles têm legitimidade para analisar o atual mandato presidencial. 2 - Entrevistá-los sobre os seis meses de governo Bolsonaro ajuda a enriquecer o debate, apresentando novos pontos de vista, oferecendo novas perspectivas. 3 - No jornalismo, qualquer balanço de governo (federal, estaduais ou municipais) precisa contemplar as visões de quem está no poder e de quem está fora dele, dando aos nossos leitores elementos para formar sua própria opinião.
As entrevistas
Seis meses após o início do governo Bolsonaro, GaúchaZH começou no dia 8 uma série de entrevistas com candidatos à Presidência em 2018.
8/7 – Alvaro Dias (Podemos)
9/7 – Ciro Gomes (PDT)
10/7 – Fernando Haddad (PT)
11/7 – Geraldo Alckmin (PSDB)
12/7 – Guilherme Boulos (PSOL)
15/7 – Henrique Meirelles (MDB)
16/7 – João Amoêdo (Novo)
17/7 – Marina Silva (Rede)
GaúchaZH tentou e não conseguiu contato com Cabo Daciolo.