Ao fechar coligação com nove partidos e garantir o maior tempo no horário eleitoral, Geraldo Alckmin projetou, em 2018, um caminho viável para chegar à Presidência. Na quarta entrevista da série com candidatos ao Planalto no ano passado, o tucano admite que errou na estratégia, mas também atribui o insucesso à peculiaridade do último pleito. Ex-governador de São Paulo, Alckmin terminou na quarta posição na disputa, com 5 milhões de votos, ou 4,76% do total.
Como o senhor analisa os primeiros seis meses do mandato de Bolsonaro?
O governo tem improvisação e muito conflito. Cabe ao presidente buscar convergência. As principais reformas que o país precisa, da Previdência, tributária e política, dependem de maioria qualificada. As nações que mais avançaram são as que têm as instituições mais sólidas. Você enxovalhar as instituições, estimular contra Judiciário e Legislativo, não é bom para o país. O mundo vai crescer nesse ano quase 3,5% e, os países em desenvolvimento, mais de 5%. O Brasil, que tem uma base muito baixa, que perdeu 7% do PIB no tempo do PT, era para crescer, no mínimo, 3,5%.
O senhor acha que não cresce em razão desse clima de instabilidade criado pela política?
Não tenho dúvida. A economia é também confiança. Qual é o nosso problema? É falta de investimento. O setor público não investe porque não tem dinheiro, e o setor privado não investe porque não tem confiança. A reforma da Previdência vai evitar colapsar as contas. Agora, a reforma que pode trazer eficiência econômica é a tributária. Com o objetivo de simplificar, desonerar a exportação, investimentos, simplificar o sistema. Você vê que, na questão do improviso, o governo não tem proposta. (Se eleitos) tínhamos tudo pronto para, em 1º de fevereiro, (entregar ao Congresso) as reformas previdenciária, tributária e política. A reforma política não está na agenda (do governo). A única proposta da tributária, até agora, é recriar a CPMF. Há exagero na crença de que a reforma da Previdência sozinha possa reativar a economia.
O resultado não foi nada bom para o senhor nas eleições. O que deu errado?
Cada eleição tem uma singularidade. Não quero tirar o mérito de quem ganhou, até gosto do jeito do Bolsonaro, meio simples. Agora, o que aconteceu: uns dias antes da facada, eu tinha subido dois pontos e o Bolsonaro, caído dois, a diferença era 19 a 12. Era só virar quatro. A campanha estava começando. Até ali, o PT se vitimizava: o impeachment da Dilma (Roussef), a prisão do Lula, o PT sempre vítima. A hora que teve a facada, inverteu. A vítima passou a ser Bolsonaro, até acabar a eleição. Não houve mais debate, nada. Na semana seguinte, (Bolsonaro) cresceu quatro pontos. E depois foi o voto útil, contra o PT. Aí está a importância de, no futuro, caminharmos ao sistema parlamentarista. Hoje, você abre a urna e fecha por quatro anos. Um modelo engessado.
Os casos de corrupção que envolveram o PSDB e Aécio Neves, na questão da JBS, atrapalharam a campanha?
Atrapalharam, óbvio. O PSDB fez o que era possível. Aécio era o presidente do partido, aliás, contra o meu voto. Houve, depois, o problema da JBS e ele se afastou. Nunca passou pela minha cabeça ser presidente do partido, só assumi pelas circunstâncias. Sempre tive a convicção de que o PT dificilmente não iria (para o 2º turno), porque o Nordeste é muito populoso, são 55 milhões. Então, tive de disputar a outra vaga. Bolsonaro começou mais cedo (a campanha) e as circunstância o ajudaram.
Sempre se discutiu que o Congresso não faz reforma política porque seria votar contra o sistema. Outros defendem nova Constituinte. É essa a sua ideia?
De forma alguma, sou radicalmente contra. Constituinte é resultado de fato político de grande envergadura. Uma coisa já foi feita, que é proibir coligações proporcionais. Já vai ajudar na eleição municipal. Temos de ter voto distrital ou distrital misto. Continuar com esse modelo de voto proporcional, imagina no Rio Grande do Sul, Estado grande. É uma campanha de governador para cada deputado, que custa uma fábula. Leva vantagem quem está na telinha, jogador de futebol, artista, e, de outro lado, corporações.
Qual é o futuro do PSDB?
Fui fundador do PSDB. Não mudamos de partido, criamos um partido. Fui a sétima assinatura. A política era mais romântica, mais idealista, não esse pragmatismo de hoje. No estatuto do partido está: “longe das benesses do poder e perto do pulsar das ruas nasce a Social-Democracia Brasileira”. O que acontece hoje: todos os partidos estão enfraquecidos, porque, quando você tem 35 partidos, e partido é parte, um pedaço da sociedade, você ter 35 visões de Brasil é uma fragmentação artificial e que enfraquece a todos. Confunde o eleitorado. Estamos vivendo hoje um momento de intolerância atrasada.
O senhor acredita que o PSDB está perto do pulsar das ruas?
Todos os partidos estão enfraquecidos, inclusive o PT. Se não fizer a reforma política, vai ser discussão de personalismos, que é a história do Brasil. As diferenças ideológicas estão diminuindo, o que é prova de maturidade política. Responsabilidade fiscal não deve ser mais objeto de luta política.
O PSDB nasceu social-democrata. Ainda é? Há pretensão de mudar de nome?
Lógico que é. Acho ridículo querer mudar de nome, como se fizesse o partido melhor ou pior. O que é a social-democracia? É economia de mercado. O que faria imediatamente, se fosse presidente: uma agenda de competitividade. Sem isso, o Brasil vai crescer pouco. Porque é muito caro, para quem vive aqui e para quem exporta. Então você não consegue exportar, a não ser commodity. Precisa ter reforma tributária, desburocratização, logística, inovação. Do lado social, o desafio do mundo vai ser a desigualdade. Sempre acreditamos nisso: economia de mercado, privatização, traz setor privado, concessão, PPP. De outro lado, uma preocupação social.
O PSDB está preparando João Doria à Presidência em 2022?
O governador de São Paulo é sempre o candidato natural. Mário Covas, Serra, Alckmin. É fato. Mas é prematuro falar.
E figuras que comprometem o partido, como Aécio Neves, devem ser expulsas?
Pedimos três coisas ao presidente do partido: código de ética, que nunca teve, mudança estatutária e compliance (sistema de fiscalização de cumprimento de regras). Acho que é o primeiro partido do Brasil que vai ter compliance, com coragem danada. É transparência absoluta e total. Aécio não tem condenação, nem em primeira instância. E tem o direito de se defender. O estabelecido como regra? Condenação por improbidade administrativa em segunda instância, expulsão automática. Quanto a outras situações, a avaliação será caso a caso.
Quais outras lideranças do partido poderiam concorrer à Presidência em 2022?
Há o governador Eduardo Leite, jovem liderança. Sou admirador, foi grande prefeito de Pelotas, preparado, carismático. Está indo muito bem. Grande exemplo de política moderna, não linguaruda. Temos ótimos nomes. O governador Reinaldo Azambuja (MS), senadores e novas lideranças podem surgir.
O senhor ainda sonha em ser presidente?
Do Santos Futebol Clube (risos).
Da República, não mais?
A gente nunca deve ser peremptório nesse tipo de coisa.
Mas o senhor tem planos de voltar a concorrer?
Tem dois ansiosos na vida: políticos e jornalistas (risos).
Por que entrevistamos os ex-candidatos à Presidência?
1 - Na eleição de 2018, eles se colocaram como alternativa para presidir o país, apresentando projetos para o desenvolvimento e a solução de problemas do Brasil. Embora a maioria tenha escolhido Bolsonaro, os demais candidatos também receberam votos de parte da população. Eles têm legitimidade para analisar o atual mandato presidencial. 2 - Entrevistá-los sobre os seis meses de governo Bolsonaro ajuda a enriquecer o debate, apresentando novos pontos de vista, oferecendo novas perspectivas. 3 - No jornalismo, qualquer balanço de governo (federal, estaduais ou municipais) precisa contemplar as visões de quem está no poder e de quem está fora dele, dando aos nossos leitores elementos para formar sua própria opinião.
As entrevistas
Seis meses após o início do governo Bolsonaro, GaúchaZH começou na segunda-feira (8) série de entrevistas com candidatos à Presidência em 2018.
Segunda-feira (8) – Alvaro Dias (Podemos)
Terça-feira (9) – Ciro Gomes (PDT)
Quarta (10) – Fernando Haddad (PT)
Quinta (11) – Geraldo Alckmin (PSDB)
Sexta (12) – Guilherme Boulos (PSOL)
15/7 – Henrique Meirelles (MDB)
16/7 – João Amoêdo (Novo)
17/7 – Marina Silva (rede)
GaúchaZH tentou e não conseguiu contato com Cabo Daciolo.