Novos diálogos atribuídos ao ministro da Justiça Sergio Moro e ao procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Operação Lava-Jato, sugerem que o ex-juiz teve influência no trabalho da força-tarefa quando era responsável por julgar as ações decorrentes das investigações em 1ª instância. Entre as revelações publicadas nesta sexta-feira (5), está a orientação a procuradores sobre como tornar uma peça de acusação mais robusta com a inclusão de provas.
A divulgação do material foi feita pelo pela revista Veja, em apuração realizada em parceria com o site The Intercept Brasil.
Confira os principais trechos abaixo:
Corrigindo denúncia
Conforme a reportagem da Veja, Dallagnol avisa à procuradora Laura Tessler que Moro o havia alertado sobre a falta de uma informação na denúncia de Zwi Skornicki, representante da Keppel Fels, estaleiro que tinha contratos com a Petrobras. Skornicki tornou-se delator na Lava-Jato e confessou que pagou propinas a vários funcionários da estatal, entre eles Eduardo Musa, mencionado por Dallagnol na conversa.
"Laura no caso do Zwi, Moro disse que tem um depósito em favor do Musa e se for por lapso que não foi incluído ele disse que vai receber amanhã e da tempo. Só é bom avisar ele", disse Dallagnol, segundo diálogo reproduzido pela Veja. "Ih, vou ver", respondeu a procuradora.
O Ministério Público Federal (MPF), no dia seguinte, incluiu um comprovante de depósito de US$ 80 mil feito por Skornicki a Musa.
Delação de Cunha
Os diálogos divulgados pela revista Veja também indicam que o então juiz manifestou contrariedade à possibilidade de acordo de delação premiada com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ). No dia 5 de julho de 2017, após procuradores da força-tarefa concordarem em marcar uma reunião com o advogado Délio Lins e Silva Júnior — responsável pela defesa de Cunha, Moro questiona Dallagnol sobre rumores de uma delação do ex-deputado.
"Rumores de delação do Cunha... Espero que não procedam", afirmou o então juiz, às 23h11min, segundo Veja. Dallagnol responde com um emoji em sinal positivo, às 23h12min, e dois minutos depois tenta tranquilizar Moro: "Só rumores. Não procedem. Cá entre nós, a primeira reunião com o advogado para receber anexos (nem sabemos o que virá) acontecerá na próxima terça. estaremos presentes e acompanharemos tudo. Sempre que quiser, vou te colocando a par". Às 23h28min, Moro agradece pelo retorno e manifesta explicitamente sua contrariedade: "Agradeço se me manter informado. Sou contra, como sabe.".
"Aha uhu o Fachin é nosso"
De acordo com a revista, em 13 de julho de 2015, Deltan Dallagnol deixou uma reunião com o ministro Luiz Edson Fachin, do STF, e logo comentou o resultado da conversa com os demais procuradores da força-tarefa, por meio do aplicativo Telegram.
"Caros, conversei 45 m com o Fachin. Aha uhu o Fachin é nosso."
Parceria na defesa
Conversas atribuídas a Moro e Dallagnol, referentes a fevereiro de 2016, demonstram parceria contra a iniciativa da Odebrecht de tentar impedir que o Ministério Público suíço enviasse dados, incluindo extratos bancários, à força-tarefa. O juiz teria avisado sobre a petição da empreiteira e informado que iria abrir o prazo de três dias para o MP se manifestar. Dallagnol agradece o aviso.
Preocupado com o caso, Moro pede notícias a Dallagnol no dia 3: "Quando sera a manifestação do mpf?", pergunta. "Estou redigindo, mas quero fazer bem feita, para já subsidiar os HCs (habeas corpus) que virão. Imagino que amanhã, no fim da tarde", responde o procurador. No dia seguinte, Dallagnol informa a Moro que a peça estava quase pronta, mas dependia ainda da revisão de colegas. "Protocolamos amanha, salvo se for importante que seja hoje. Posso mandar, se preferir, versão atual por aqui, para facilitar preparo de decisão", escreve.
Dicas para "quando precisar prender alguém..."
Em 17 de dezembro de 2015, segundo trechos de conversa divulgados pela revista, Moro teria informado que precisava de manifestação do MPF no pedido de revogação da prisão preventiva de José Carlos Bumlai, pecuarista e amigo do ex-presidente Lula.
"Ate amanhã meio dia", escreve. Dallagnol garante que a ação será feita e acrescenta: "Seguem algumas decisões boas para mencionar quando precisar prender alguém…".
Momentos de tensão e de comemoração
Em uma conversa, que segundo a Veja ocorreu em 17 de novembro de 2015, Moro dá um puxão de orelha em Dallagnol. O juiz reclama de que está difícil entender os motivos pelos quais o MPF recorreu da sentença aplicada aos delatores Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, Pedro José Barusco Filho, Mário Frederico Mendonça Góes e Júlio Gerin de Almeida Camargo. Dallagnol tenta se justificar, sem sucesso.
"O mp está recorrendo da fundamentação, sem qualquer efeeito pratico", critica o juiz. "Na minha opinião estao provocando confusão." Dallagnol, resignado, pede um encontro com Moro para a manhã do dia seguinte: "25m seriam suficiente (sic)".
Já em dezembro de 2016, conforme a reportagem, Moro e Dallagnol comemoram o sucesso de algumas etapas da Lava-Jato. O procurador escreve ao então juiz para contar que a denúncia de Lula seria protocolada em breve, enquanto a de Sérgio Cabral já seria registrada no dia seguinte (o que de fato ocorreu). Moro responde com um emoticon de felicidade, ao lado da frase: "um bom dia afinal".
Contraponto
Sergio Moro se manifestou em nota. Assim como já havia dito no Senado e na Câmara dos Deputados, o ministro voltou a afirmar que não reconhece a autenticidade das mensagens, segundo ele, "obtidas por meios criminosos e que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente". Moro ainda criticou a revista Veja por não "encaminhar cópia das mensagens antes da publicação e tenha condicionado a apresentação das supostas mensagens à concessão de uma entrevista, o que é impróprio".