A divulgação das conversas entre o procurador Deltan Dallagnol e o então juiz Sergio Moro mostra duas das principais autoridades da Lava-Jato discutindo os rumos da investigação, o destino dos suspeitos, o ritmo da operação e os processos que escaparam à jurisdição dos dois e tramitam em segunda instância.
Conforme revelado pelo site The Intercept Brasil, houve pelo menos 13 ocasiões, entre 2015 e 2017, em que eles trocaram ideias e sugestões de atuação nas ações penais em curso na 13ª Vara Federal de Curitiba, no Tribunal Regional Federal da 4ª Região e no Supremo Tribunal Federal.
Veja abaixo quatro diálogos mantidos entre os dois e o que aconteceu logo depois.
MPF reclama da soltura de Alexandrino Alencar
Em 16 de outubro de 2015, o Supremo Tribunal Federal soltou Alexandrino Alencar, executivo da Odebrecht que estava preso havia quatro meses. No mesmo dia, Deltan Dallagnol conversa por aplicativo com Sergio Moro:
— Caro, STF soltou Alexandrino. Estamos com outra denúncia a ponto de sair, e pediremos prisão com base em fundamentos adicionais na cota. (…) Seria possível apreciar hoje?
— Não creio que conseguiria ver hoje. Mas pensem bem se é uma boa ideia — responde Moro. — Teriam que ser fatos graves— complementa.
O que aconteceu depois
Alexandrino não foi preso novamente.
Moro pede para antecipar operação
Em 21 de fevereiro de 2016, Moro sugere a Dallagnol que inverta a deflagração das duas próximas fases da Lava-Jato:
— Olá, diante dos últimos desdobramentos talvez fosse o caso de inverter a ordem da duas planejadas.
Na resposta, o procurador disse que haveria problemas logísticos para alterar a sequência.
O que aconteceu depois
No dia seguinte, 300 homens da Polícia Federal foram às ruas na 23ª fase da Lava-Jato. Entre os presos estavam o marqueteiro João Santana e a sua mulher, Mônica Moura. Em 4 de março, 12 dias após a mensagem de Moro, surge a Operação Aletheia, na qual o ex-presidente Lula é alvo de condução coercitiva e busca e apreensão.
Moro reclama da demora em novas fases da Lava-Jato
Em 31 de agosto de 2016, 29 dias após a deflagração da Operação Resta Um, Moro pergunta a Dallagnol se não havia passado muito tempo sem nova fase da Lava-Jato nas ruas:
—Não é muito tempo sem operação?
— É sim — respondeu o procurador.
O que aconteceu depois
Em 22 de setembro, três semanas após a cobrança de Moro, vai às ruas a Operação Arquivo X, a 34ª fase da Lava-Jato. O principal alvo é o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. O ex-ministro acabaria solto ainda no mesmo dia.
Moro orienta atuação do MPF
Em 26 de junho de 2017, Moro prevê a absolvição do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto no dia seguinte, no TRF4. Na conversa, ele sugere pressa no trabalho do Ministério Público para que o petista continue preso:
— Diante da absolvição do Vaccari seria talvez conveniente agilizar julgamento do caso do (lobista Zwi) Skornicki no qual ele também está preso e condenado. Parece que está para parecer na segunda instância.
— Providenciamos também nota de que a Procuradoria Regional da República vai recorrer — responde Dallagnol. — Tem outras também no TRF. Alguma razão especial para apontar esta? — pergunta o procurador.
— Porque Vaccari também foi condenado nesta?! — orienta Moro.
O que aconteceu depois
No dia seguinte, Vaccari acabou absolvido no Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Os desembargadores entenderam que não havia provas contra ele. A nova condenação do tesoureiro, junto com Zwi Skornicki, ocorreu cinco meses depois, em 7 de novembro de 2017. Vaccari permanece preso até hoje.